Acórdão nº 6856/2005-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Outubro de 2006

Data24 Outubro 2006
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, na Secção Cível da Relação de Lisboa: MARIA … e VIRGÍNIA … propuseram, no 1° Juízo Cível do Seixal, contra JOAQUIM …, acção com processo especial de prestação de contas, alegando, em síntese, terem encarregado o requerido, no exercício da sua actividade de solicitador, de proceder à venda de um conjunto de bens imóveis, passando a competente procuração para o efeito, tendo este procedido à referida venda e escusando-se o mesmo a prestar contas do encargo desempenhado.

Citado o Réu, este contestou, alegando, em resumo, haver já prestado as contas pedidas.

Na sequência da contestação apresentada pelo Réu, vieram as requerentes ampliar o pedido - o que foi rejeitado (por despacho já transitado em julgado).

Requerido pelo Réu o depoimento de parte da Autora Maria …, veio este a ser indeferido, por deficiente especificação dos quesitos a que a depoente devia ser ouvida, tendo o Réu interposto agravo desta decisão.

Tendo-se procedido à audição das testemunhas arroladas pelas partes, foi decidida a matéria de facto, sendo, em seguida, proferida decisão a condenar o Réu a prestar as contas peticionadas pelas Autoras.

Desta decisão, apelou o Réu, tendo ambos os recursos (tanto o de agravo, como o de apelação) sido julgados improcedentes na Relação de Lisboa.

Mais uma vez inconformado, veio o Réu interpor recurso de revista, mas apenas do segmento do Acórdão da Relação que confirmou a decisão da 1ª instância que o condenara a prestar as contas peticionadas pelas Autoras (que não já também daqueloutra parte do mesmo aresto que confirmara o despacho da 1ª instância a indeferir o requerido depoimento de parte da Autora Maria …), tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 18/5/2006, concedido a revista, anulando a decisão recorrida e ordenando a remessa dos autos à 2ª instância, a fim de, pelos mesmos Juízes, se possível, ser conhecido do objecto da apelação.

Cumpre, pois, apreciar e decidir, em obediência ao decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça.

O OBJECTO DA APELAÇÃO Como se sabe, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 690º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (1) (2).

Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 684º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 684º) (3) (4).

Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.

No caso sub judice, emerge das conclusões da alegação de recurso apresentada pelo Réu ora Apelante que o objecto do presente recurso está circunscrito às questões de saber: A) Se ao elenco dos factos considerados provados pelo tribunal de 1ª instância devem ser acrescentados os seguintes factos: 1) As requerentes souberam, através do requerido, que já tinha sido realizada a escritura pública de compra e venda dos imóveis propriedade das requerentes; 2) As requerentes tiveram conhecimento do termo do mandato (venda da Quinta …"), pelo menos desde 27 de Maio de 1992; 3) O requerido apenas recebeu dos compradores da "Quinta …", como preço desta, a quantia de esc. 50.000.000$00 (cinquenta mil contos); 4) O requerido entregava faseadamente às requerentes o montante da venda da "Quinta …"; 5) A 1ª requerente pedia ao requerido as quantias de que necessitava; 6) Foi o dinheiro que o requerido, sucessivamente, foi entregando às requerentes que permitiu que a 1ª requerente comprasse, em 27 de Maio de 1992, fracção autónoma em regime de propriedade horizontal pelo preço de Esc. 16.170.000$00 (doc. junto sob o n° 6 à contestação) e que a 2ª requerente tivesse comprado um andar, o que ocorreu em 15/04/1991 e pelo preço de Esc. 5.975.000$00; 7) Do produto da venda da "Quinta …", o requerido, ora recorrente, entregou às requerentes, esc. 5.975.000$00 de uma vez, e esc.16.170.000$00 de outra vez, além de outras verbas de que se não apurou o montante; 8) O requerido prestou parcialmente contas, entregando às requerentes esc. 5.975.000$00, de uma vez e doutra 16.170.000$00, além de algumas tranches de 20 a 40 contos, não quantificadas; 9) As requerentes entregaram ao requerido, entre outras quantias, a quantia de 370.000$00, por conta de honorários.

9) O Teor do documento de fls 167 dos autos ("após averiguações efectuadas, constatamos ser impossível o pedido de V.Exª, procedendo o Banco à destruição da documentação ao fim de 10 anos como decorre do disposto n art. 40º do Código Comercial").

2) Se, como as Autoras ora Apeladas impediram o Réu ora Apelante de produzir a prova por ele anunciada na sua contestação - ao deixarem decorrer 11 anos entre o momento em que tiveram conhecimento do termo do mandato (ocorrido com a venda da "Quinta …") e a exigência judicial da prestação de contas -, o ónus da prova inverteu-se, nos termos do art. 344º, nº 2, do Código Civil, pelo que já não é o Réu/Apelante que tem de fazer a prova de que prestou contas da diferença entre os 50.000 contos por ele recebidos e os mais de 22 mil contos por ele entregues às Autoras/Apeladas, cabendo-lhes antes a elas [Autoras/Apeladas] fazer a prova de que não houve prestação de contas; 3) Se, de qualquer modo, a actuação das Autoras/Apeladas, ao protelarem por 11 anos a exigência judicial da prestação de contas, configura um exercício abusivo do seu direito à prestação de contas, pelo que sempre o Réu/Apelante deveria ser absolvido da obrigação de prestar contas às Autoras/Apeladas.

MATÉRIA DE FACTO Factos Considerados Provados na 1ª Instância: A sentença recorrida elenca como provados os seguintes factos: 1) As requerentes eram legítimas proprietárias de um prédio rústico denominado "Quinta …", com a área de vinte e quatro mil e duzentos e quarenta metros quadrados inscrito na respectiva matriz sob o artigo dez da secção E, descrito na Conservatória do Registo Predial do Seixal sob o número dois mil seiscentos e quinze, anteriormente quatrocentos e oitenta e cinco do livro B-dois, da freguesia de Arrentela; 2) As requerentes eram legítimas proprietárias de quatro prédios urbanos de rés do chão, inscritos na respectiva matriz sob os artigos cento e cinquenta e cinco a cento e cinquenta e sete e setecentos e oitenta e cinco, descrito na Conservatória do Registo Predial do Seixal sob o número dois mil seiscentos e quinze, anteriormente quatrocentos e oitenta e cinco do livro B-dois, da freguesia de Arrentela; 3) Por procuração realizada no décimo sexto Cartório Notarial de Lisboa, realizada no dia vinte e cinco de Março de 1991, as requerentes conferiram poderes bastantes ao requerido para vender os prédios supra identificados, receber o preço, dar quitação, outorgar a competente escritura ou respectivo contrato de compra e venda; 4) Por escritura pública celebrada no Cartório Notarial do 5eixal em 31 de Janeiro de 1992 o requerido, na qualidade de procurador das requerentes, alienou os referidos prédios pelo preço de Esc.: 62.000.000$00 que declarou já ter recebido; 5) Por diversas vezes, o requerido já foi interpelado para prestar as referidas contas, quer pelo telefone quer pessoalmente; 6) As requerentes entregaram ao requerido, entre outras quantias, a quantia de Esc.: 370.000$00 por depósito efectuado numa conta deste.

Factos Considerados Não Provados na 1ª Instância.

Dentre os factos articulados pelo Réu ora Apelante na sua contestação, o tribunal a quo considerou não provados os seguintes: a) que o Requerido tenha prestado contas do seu mandato à 1ª Requerente; b) que as requerentes tenham pago a conta de honorários que o Requerido apresentou à 1ª Requerente.

O MÉRITO DA APELAÇÃO 1) O PRETENSO ERRO NA APRECIAÇÃO DAS PROVAS...

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