Acórdão nº 2267/2006-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelTIBÉRIO SILVA
Data da Resolução12 de Julho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: IA.

, casado, comerciante, residente no Lg. …., em Vila Nova de Gaia, veio intentar contra B.

, S.A.

, com sede na Estrada …., Lisboa, acção com processo ordinário, alegando, em resumo, que: A firma ou denominação social "E…., S.A." deu lugar à "B., S.A." (supra identificada).

Em 08/04/1996, o A. assinou proposta de compra, a S. C., de um veículo automóvel novo da marca BMW, modelo 3.18 TDS/4, pelo preço de 7.150.392$00.

Com vista ao financiamento de parte do valor daquela aquisição, foi apresentada proposta pelo A. à R., então "E.,S.A.", a qual celebrou com aquele um contrato de aluguer de veículo sem condutor, por via do qual o A. assumiu o pagamento de uma entrada no valor de 1.960.651$00 e trinta e seis prestações mensais e sucessivas, no valor de 184.467$00 com IVA incluído, cada.

Em 12/04/1996, a "E.,S.A" enviou documentação a S. C. autorizando a entrega ao A. da viatura.

O A. pagou a entrada inicial (1.960.651$00, caução), a 1ª prestação ou 1° aluguer inicial (209.386$00, previsto na cláusula 2ª das condições gerais, e ainda pagou a quantia de 23.401$00 que ficou imputada na rubrica de despesas com a transferência da titularidade do veículo para o A..

O A. ficou a dever em 16 de Abril de 1996 e após aquele pagamento, através dos cheques, 35 prestações ou alugueres mensais e sucessivos, no valor de 209.386$00, cada, com pagamento no dia 15 de cada um dos 35 meses subsequentes.

Por isso, o A. deu instruções ao B.P.A. para, mensalmente, efectuar uma transferência bancária a favor da Requerida no valor de 209.766$00, transferência essa que se manteve durante 35 meses, no total de 35 prestações mensais e sucessivas.

Findo o pagamento atempado das 36 prestações ou alugueres (a 1ª prestação inicial paga através de cheque + 35 transferências bancárias), ficou o A. com direito à viatura e à transferência de titularidade da mesma (já que pagou adiantadamente os tais 23.401$00 para a R fazer essa transferência).

A R. viria ainda a solicitar a quantia de 211.209$00, sem identificar a que prestação ou aluguer se refere, o que o A. não pagou porque não tinha de pagar tal prestação ou aluguer já que todos foram efectivamente pagos por si (o primeiro ou inicial através de cheque e os restantes 35, por transferência bancária nos termos da cláusula 2ª das Condições Gerais).

Em 22/11/1999, através de chamada telefónica, alguém da "E.,S.A." ameaçou o A. de que lhe viriam buscar o veículo se não pagasse outra prestação, tendo o A. dito que o veículo estava totalmente pago, através de 36 prestações ou alugueres.

Em 24/11/1999, quando o veículo se encontrava estacionado junto ao local onde trabalha, à Al. Eça de Queirós, no Porto, cerca das 12H30, foi o mesmo levado pela Requerida com documentação, bens e objectos que se encontravam no seu interior.

Assim, a R retirou o veículo ao A., contra a vontade deste e contra o pagamento contratual já efectivado, escondendo o veículo em local desconhecido, depois de o ter levado da Al. Eça de Queirós - Porto, e agora, ameaçando que o vende.

Invoca o A. incómodos vários decorrentes da privação do veículo, como o ter de alugar um veículo, em substituição do BMW, no sentido de satisfazer as suas necessidades de deslocação e da família.

O A. refere ainda, além do mais, despesas com advogado e com a instauração de uma providência cautelar.

Afirma o A. que, no dia 21/01/2000, o Sr. R. L., de "E.,S.A.", agora "B.,S..A.", através do telefone móvel, comunicou à testemunha José Henriques, indicado nos autos, que o A. podia ir buscar o seu BMW.

Com a colaboração da Esquadra da P.S.P. da Maia, foi localizado e entregue ao A. o aludido veículo, o qual se encontrava escondido debaixo de umas árvores, à guarda e em terreno do Sr. C. A., na Maia, o qual disse à autoridade que tinha sido a "E.,S.A." que lhe pedira para o esconder ali.

No veículo foram detectados vários danos.

Por via daquela paralisação, são imputáveis à R. todas as despesas decorrentes da mesma e que, a nível de mecânica, venham a ser detectadas no veículo e na oficina onde vai ser levado, logo que a agenda da oficina o permita.

A R. ao devolver ao A. no dia 21/01/2000 o BMW sem recebimento de qualquer valor e por sua iniciativa, reconheceu as ilegalidades por si cometidas e por elas deve ser responsabilizada. Outrossim, pelos danos e prejuízos decorrentes desta situação e que se liquidarão em execução de sentença, nomeadamente despesas com o processo, mandatária, testemunhas, paralisação para polimento e reparação e outros que se venham a apurar.

Termina pedindo que: a) seja declarado o pontual e integral cumprimento pelo A. do contrato junto aos autos, celebrado com a R.; b) seja condenada a R. a reconhecer a propriedade e a posse do A. sobre o aludido veículo; c) seja a R. condenada a transferir a titularidade para o A., na Conservatória do Registo Automóvel, do aludido veículo, bem como a restituir ao A. a chave mestra do aludido BMW e os documentos em seu poder e não necessários àquela transferência; e) seja a R. condenada a pagar ao A. a indemnização, até este momento liquidada no valor de 1.088.055$00, correspondendo a mesma a danos materiais, bem como no valor de 2.000.000$00 correspondente a danos morais, acrescidas de correspondentes juros desde a citação até efectivo e integral pagamento; f) seja a R. condenada a pagar ao A. todos os prejuízos decorrentes dos ulteriores e legais termos inerentes à tramitação da presente acção, bem como os invocados prejuízos que se vierem a verificar, supra referidos, e que serão liquidados em execução de sentença.

Contestou a Ré, alegando, em resumo, que: O A. não é titular do direito que se arroga.

O A. e a R. celebraram em 15/4/96 um contrato de aluguer de veículo automóvel sem condutor.

À data da celebração do contrato, o A. ficou obrigado a liquidar o 1º aluguer - devido na data da celebração do contrato e que corresponde ao período de 15/4/96 a 14/5/96 - seguido de 36 alugueres correspondentes aos 36 períodos seguintes.

É, pois, completamente falso tudo o que o A. alega em contrário, ou seja que apenas estava obrigado ao pagamento de 36 alugueres.

Ao A. foi exigido também por força do contrato em apreço o pagamento de uma caução no valor de Esc. 1.960.651$00.

Foi a título de caução pelo bom cumprimento do contrato que o A. liquidou à R. a quantia de Esc. 1.960.651$00 e não, como diz, a título de entrada, 1ª prestação ou sinal.

O A. liquidou à R. o preço dos 36 alugueres correspondentes aos períodos que se sucederam entre 15/4/96 e 15/4/99.

Mas não liquidou à R. o preço do último aluguer vencido em 15/4/99 e que corresponde ao período de 15/4/99 a 15/5/99.

Desde tal data a R. solicitou ao A., por inúmeras vezes, o pagamento do último aluguer. No entanto, o A. sempre se recusou a efectuar tal pagamento.

Assim, em Novembro de 1999, a R., através dos seus serviços de controlo de crédito e nos termos do nº 2 da cláusula 7ª do contrato, promoveu a remoção da viatura do local onde a mesma se encontrava.

Nada há de ilegítimo na actuação da R., pois tendo ocorrido a última renovação do contrato ficou o A. obrigado, nos termos da cláusula 7ª do contrato, a restituir o veiculo à R. e não o fez.

O A. quer fazer crer ao Tribunal que o cumprimento do contrato celebrado com a R. acarretaria para esta a obrigação de transmitir a propriedade do veículo alugado, mas isso não corresponde minimamente à verdade uma vez que nunca foi celebrado entre as partes qualquer contrato de compra e venda ou de promessa de compra e venda do veículo em questão.

Apesar disso o A., a partir de 15/4/99, nos vários contactos que foi tendo com os serviços da R., começou a reclamar obstinadamente o direito de adquirir a viatura por ter liquidado "a entrada" e "as prestações", actuação que criou na R. a convicção evidente que o A., findo que fosse o contrato de aluguer, pretendia adquirir a viatura alugada. Por tal motivo e face às insistências do A. que irredutivelmente se recusava a aceitar e entender a natureza do contrato de aluguer, a R., já no início do corrente ano [2000], aceitou restituir a viatura ao A. no pressuposto de que este viesse de facto a adquiri-la, mediante preço a acordar.

A R. deduziu reconvenção, na qual alegou que: A conduta do A. acarretou a perca de interesse da R. na celebração de tal negócio.

Assim, e tendo ocorrido já a última renovação do contrato de aluguer celebrado com o A., pretende a R. que este lhe restitua de imediato a viatura alugada, uma vez que nenhum título existe para que aquela se encontre na sua posse.

Pretende ainda a R. que o A. liquide o preço do aluguer vencido em 15/4/99, que se encontra em dívida e que ascende a Esc. 184.467$00.

Acrescenta que: Deverá ainda o A., nos termos da cláusula 6ª do contrato, ser obrigado a liquidar à R. o montante equivalente ao dos preços de aluguer que se venceriam desde esta data até à efectiva restituição da viatura.

Nos termos da cláusula 8ª do contrato, a R. fará sua a caução até ao limite das quantias devidas pelo A..

Entende a R. que o A. litiga de má fé, pois não podia desconhecer a inexistência do direito que se arroga e que serviu de fundamento à interposição da providência cautelar que veio a ser decretada sem audição da R.. O A. deturpa ostensiva e deliberadamente os factos com o mero intuito de conseguir alcançar um objectivo que, bem sabe, não é legítimo.

Termina, pedindo que seja a acção julgada improcedente e seja julgado procedente o pedido reconvencional deduzido contra o A. e, em consequência, seja este condenado a restituir à R. a viatura de marca BMW, matrícula ..-..-..; seja condenado ao pagamento do 37º aluguer vencido em 15/4/99 e ao pagamento de montante equivalente ao preço dos alugueres que se vençam desde esta data até à efectiva restituição da viatura.

Mais requer que seja o A. condenado como litigante de má-fé e em consequência condenado no pagamento de indemnização nunca inferior a Esc. 1.000.000$00 (um milhão de escudos).

O A. veio replicar, mantendo o...

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