Acórdão nº 11492/2005-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Janeiro de 2006

Data26 Janeiro 2006
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - RELATÓRIO J e R moveram acção declarativa de condenação com processo sumário, contra o Fundo de Garantia Automóvel em litisconsórcio com P e A.

Os AA alegam, em síntese, que, J, seu filho, foi vítima de um acidente de viação, em que foi interveniente o motociclo de matrícula NA. O veículo era conduzido por P e pertencia a A, não estando a coberto de qualquer seguro de responsabilidade civil automóvel. Quanto à dinâmica do acidente referem que, ao descrever uma curva para a esquerda, o condutor do motociclo NA despistou-se, saindo da via para o seu lado direito, vindo a imobilizar-se no fundo de um talude existente desse lado. J seguia como passageiro desse veículo na altura do acidente, tendo falecido em consequência do mesmo. A morte do seu filho causou tristeza aos AA que vestiram luto durante anos, tendo os AA deixado de receber quantia não inferior a 40.000$00 que J lhes entregava mensalmente e em média. Concluem pedindo a condenação solidária dos RR no pagamento das seguintes quantias, acrescidas de juros de mora à taxa legal, desde a citação: a) 6.000.000$00, pelo direito à vida de J; b) 2.000.000$00, a título de danos morais para cada um dos AA, decorrentes do falecimento do filho; c) 2.500.000$00, a título de dano patrimonial decorrente da perda de contributo da vítima para as despesas da vida familiar; d) 117.900$00, pelas despesas havidas com o funeral do filho; e) 60.000$00, pelas despesas havidas com a aquisição de roupa de luto para si e para o filho mais novo.

O R. Fundo de Garantia Automóvel contestou, a fls. 17 a 20, impugnando de facto e de direito. Assim, impugnou a existência de danos patrimoniais futuros dos AA, já que o contributo da vítima era para fazer face ao seu peso económico na economia doméstica. Aduz ainda que, sendo a vítima transportada gratuitamente, em vista do disposto no art. 504° n° 3 do C.C., a responsabilidade não contempla os danos de terceiros, como sejam os danos patrimoniais futuros ou os danos próprios das pessoas indicadas no n°2 do art. 496° do C.Civil. Assim, os AA não têm direito a ser ressarcidos por danos patrimoniais futuros e por danos não patrimoniais que não sejam da própria vítima. Conclui pugnando pela improcedência da acção.

Os RR P e A., regularmente citados, nada disseram.

Citado nos termos do D.L. n° 59/89 de 22/02, o ISSS formulou pedido de reembolso pela quantia paga ao 1° A., a título de auxílio para despesas de funeral.

O F.G.A. contestou este pedido por excepção e por impugnação, nos termos constantes de fls. 61 a 64, apresentando articulado superveniente a fls. 68 e 69.

A fls. 72 e 73, foi proferido despacho saneador, julgando-se improcedente a excepção de prescrição invocada pelo F.G.A. e conhecendo-se do mérito do pedido do ISSS, julgando-o improcedente. Conheceu-se parcialmente do mérito do pedido dos AA, apenas no concernente ao pedido de indemnização pelos gastos realizados com o funeral do filho, julgando-se, neste particular, improcedente a sua pretensão.

A fls. 85 e 86, os AA procederam à ampliação do seu pedido de indemnização pela perda direito à vida do seu filho em €20.000 para além do valor inicialmente peticionado, admitida por despacho de fls. 88 e 89.

Realizou-se o julgamento, tendo o Tribunal proferido decisão sobre a matéria de facto pela forma constante de fls. 227 a 231 e foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e em consequência condenou: a) o R. Fundo de Garantia Automóvel e o 2° R. P a pagar aos AA., solidariamente, a quantia global de €9.277,64, a titulo de indemnização pelos danos patrimoniais havidos (€299,28 + €8.978,36), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento, descontada, quanto ao 1° R., da quantia de €299,28, correspondente à franquia prevista no n° 3 do art. 21° do DL n° 522/85, de 31/12; b) todos os RR a pagar aos AA, solidariamente, a quantia de €40.000,00, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a data de sentença até integral pagamento, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais decorrentes da perda do direito à vida de J; c) o R. Fundo de Garantia Automóvel e o 2° R. P a pagar aos AA., solidariamente, o montante de €19.951,92, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a data de sentença até integral pagamento, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelos em consequência da morte do seu filho; A sentença absolveu os RR. do demais peticionado.

Inconformados com a sentença, dela recorreram os AA. e o Réu, tendo apresentado as seguintes Conclusões:

  1. Conclusões dos AA: 1.

    O falecido filho dos recorrentes, J nasceu em 20 de Setembro de 1975, tendo, à data do falecimento de que lhe resultou a morte, 22 anos de idade; 2.

    O filho dos recorrentes faleceu no estado de solteiro e sem descendentes; 3.

    Era um jovem alegre, saudável, comunicativo e trabalhador; 4.

    O falecido J vivia com os seus pais; 5.

    E conjuntamente com os seus irmãos, todos constituíam uma família unida e feliz, onde reinavam profundos laços de amor e respeito; 6.

    Os recorrentes dedicavam ao seu filho J particular carinho e amor paternal, no que eram correspondidos; 7.

    Tendo vertido muitas lágrimas, ao saber da morte de seu filho, o que ainda hoje acontece; 8.

    Em termos equitativos, e de harmonia com a jurisprudência, a indemnização a arbitrar por virtude da perda de vida do J, não deve ser inferior a € 50.000,00; 9.

    Assim como os danos não patrimoniais pela dor sentida pelos recorrentes não devem ser fixados em valor inferior a € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros) para cada um dos recorrentes; 10.

    Não tendo arbitrado os valores que se deixam expostos, actualizados à data em que proferiu a douta sentença recorrida, o Mm°. juiz "a quo" violou o disposto nos artigos 494° e 496°, do CC.

  2. Conclusões do Réu: 1.

    Ao correr um risco acrescido, aceitando ser transportado por quem estava alcoolizado, a vítima teve naturalmente contribuição na sua própria morte.

    1. 3,12 g/ 1 de álcool no sangue não é uma taxa que passe despercebida, atenta a descoordenação motora e sensorial que provoca.

    2. A vítima, pois, não poderia desconhecer o estado em que o condutor do motociclo se apresentava.

    3. Não pode, assim, ser atribuída a mesma indemnização que seria atribuída a uma vítima que fosse terceiro em relação ao veículo.

    4. Impõe-nos o princípio da justiça e o da igualdade que seja tratado de modo diverso aquilo que é diferente.

    5. Assim, as indemnizações arbitradas a título de danos não patrimoniais, devem ser reduzidas em 50%.

    6. Sendo adequado pelo dano morte 20.000 euros e, em conjunto aos pais pelos seus danos morais próprios, 9.975,96 euros.

    7. Mesmo em 1998 ninguém sobreviveria com 10.000$00, ainda que vivendo em casa de família.

    8. Embora a vítima contribuísse com 40.000$00, mais não era do que a contrapartida dos seus gastos em alimentação, água, electricidade, produtos de higiene, telefone, tratamento da roupa.

    9. É pois, enriquecimento sem causa, a atribuição dos aludidos danos patrimoniais resultantes dessa contribuição.

    10. Acresce que a sentença não definiu, sequer, o destino da proprietária: não a condenou, nem a absolveu, assim violando o art. 660.º, n.° 2, do CPC, nulidade do art. 668.º, n.° 1, d).

    11. A proprietária deve ser também solidariamente condenada com os restantes Réus.

    12. A perda de isenção de custas do FGA, com a entrada em vigor do DL 324/2003, de 27-12, apenas opera para os processos instaurados a partir de 1 de Janeiro de 2004, como consta do art. 14.° do decreto preambular.

    13. Os presentes autos foram instaurados em 1999, pelo que, a condenação do FGA em custas, viola o art.

    14. º, n.° 11, do DL 522/85, de 3142, bem como o art. 14.º do DL 324/2003, de 27-12.

      Corridos os Vistos legais, Cumpre apreciar e decidir.

      São as conclusões das alegações que delimitam o objecto do recurso e o âmbito do conhecimento deste Tribunal (arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do CPC), pelo que, conhecendo das Apelações...

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