Acórdão nº 2024/05-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Dezembro de 2005

Magistrado ResponsávelAM
Data da Resolução07 de Dezembro de 2005
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Por apenso à execução que lhes move "A", vieram "B" e esposa, "C", deduzir oposição por embargos, pedindo se reconheça e se declare que os executados-embargantes não respondem pela mora no cumprimento da obrigação ainda não cumprida.

O exequente-embargado alegou na execução apensa, em resumo, que adquiriu, por contrato de cessão de exploração, a posição contratual de "D", Limitada, no contrato de arrendamento comercial que esta celebrou com os executados relativo à fracção «B» de um prédio. Que nos termos desse contrato os executados se obrigaram a facultar desde 07/05/01 o uso da fracção «C» desse prédio enquanto durassem as obras na fracção «B». E que a reabertura do comércio nesta fracção deveria ser facultada pelos primeiros executados ao exequente até ao dia quinze de Agosto de 2001. A partir dessa data o exequente iniciaria as obras para abertura do comércio nessa fracção «B». Foi acordado que o incumprimento por parte de qualquer dos contraentes dos prazos atrás estipulados determinaria a obrigação de o contraente faltoso indemnizar o outro com a quantia de cinquenta mil escudos por cada dia de mora no cumprimento. Os executados não vêm cumprindo com o alegado.

Os executados-embargantes alegaram nos presentes embargos, em síntese, que se é verdade que os embargantes estão impossibilitados de facultar ao exequente o uso da fracção “B” identificada na petição executória, tal impossibilidade de poderem cumprir a obrigação a que estão adstritos é devida à existência de infiltrações de água provocadas pelas obras realizadas no prédio por Laura M.... Assim, a causa do incumprimento daquela obrigação não é imputável aos executados. Por outro lado, e em relação à fracção «C», se é verdade que esta só foi disponibilizada em 18.05.2001, tal ficou a dever-se a atrasos na execução das obras nessa fracção «C» por parte de Laura M... e ainda ao facto de entre 30 de Abril de 2001 e 21 de Maio de 2001 a pedido de Laura M... terem decorrido obras de saneamento no subsolo da rua e do passeio, precisamente em frente das portas de acesso às fracções «B» e «C». Assim, também nesta parte a causa do incumprimento da obrigação não é imputável aos executados.

Notificado, o embargado contestou, concluindo pela improcedência dos embargos.

Saneado, condensado e instruído o processo, procedeu-se a audiência de discussão e julgamento e, a final, foi proferida sentença que decidiu julgar os presentes embargos procedentes e, em consequência, determinou a extinção da execução apensa n.º 58/2002.

Inconformado com esta decisão, dela veio apelar o embargado, formulando na sua alegação as conclusões que resumidamente se transcrevem: A cláusula estabelecida entre o embargante e embargado (tal como a cláusula constante do termo de transacção no inventário nº 267/99) é uma Cláusula Penal de Garantia com função penal, sendo, por isso, uma cláusula mista, já que pretendeu assegurar um resultado (cumprimento dos prazos acordados para a entrega das fracções), bem como uma função sancionatória para o caso de incumprimento, fixando, desde logo, o montante indemnizatório por cada dia de atraso.

A cláusula de garantia, ou mista, funciona independentemente da culpa do devedor.

“In casu” está demonstrado – o que até é confessado – o incumprimento dos prazos na entrega das fracções: a fracção C deveria ser facultada até ao dia 7 de Maio e só foi facultado ao embargado em 18 de Maio de 2001 e a fracção ”B” deveria ser facultada ao embargado-arrendatário em 15 de Agosto de 2001 e só o foi em Dezembro de 2002 ou 31 de Maio de 2003 ( o que se virá a apurar no incidente para fixação de exigibilidade que corre por apenso a este processo).

Se o devedor, no caso da cláusula ser uma cláusula mista (de garantia com função penal) responde independentemente de culpa, então os embargos deduzidos deveriam ter sido julgados totalmente improcedentes).

Sem prescindir, mesmo na hipótese de se entender que a cláusula 14º do contrato de arrendamento e que vinculou embargante e embargado é uma verdadeira cláusula penal e que só esta poderia funcionar havendo culpa do devedor, entendemos que, face à matéria dada como provada, o embargante não elidiu a culpa que sobre si impendia (e se presumia).

O que resulta da matéria de facto é exactamente o contrário do que foi decidido pelo Mmº Juiz “ a quo”, isto é, que o embargante foi culpado pelo incumprimento verificado, pelo menos a título negligente.

Ainda assim, sempre o embargante seria responsável, mesmo não havendo culpa sua, nos termos do consagrado no artº 800º nº1 do Cód. Civil.

O Mmº Juiz a quo não cuidou de analisar devidamente o tipo de cláusula estabelecida entre as partes, como que lhes vedando a liberdade contratual estabelecida no artº 405º do CC, que, por isso, foi violado.

O Mmº Juiz a quo não interpretou/apreciou correctamente, os factos dados como provados, violando, além do mais os artºs 799º e 342º do CC, pois se o fizesse teria concluído existir culpa por parte do embargante.

As presentes alegações têm sustentação na Jurisprudência e na Doutrina mais conceituada, como é o caso do Senhor Professor Doutor António Pinto Monteiro, que gentilmente acedeu a emitir o seu parecer que ora se junta.

Finaliza, pedindo, a revogação da decisão recorrida, substituindo-a por outra que julgue os embargos totalmente improcedentes.

Juntou parecer do Senhor Professor Doutor António Pinto Monteiro.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Fundamentação de facto São os seguintes os factos dados como provados na 1ª instância:Da matéria assente: 1- Por escrito particular datado de 19 de Fevereiro de 2001, com cópia a fls. 6 a 8 dos autos principais, cujo teor aqui se dá por reproduzido, os embargantes e um sócio gerente de "D", emitiram e exararam por escrito as declarações aí constantes nomeadamente: a. “(…) Artigo 11.° - A segunda contraente ("D") deverá desocupar, totalmente de bens e pessoas a fracção objecto deste contrato que vem ocupando, até ao dia sete de Maio de 2001, por forma a viabilizar as obras descritas naquele citado inventário. Desde já declara a Primeira contraente que tem conhecimento de todos os termos da conferência de interessados concluída naquele inventário judicial.

b. Artigo 12.° - A partir dessa data os Primeiros contraentes (os embargantes) obrigam-se a facultar o uso da fracção C do mesmo prédio para que a Segunda contraente instale aí o seu comércio enquanto durarem as obras que inviabilizam a ocupação da fracção B.

c. Artigo 13.° - O uso da fracção B, para início das obras necessárias para reabertura do comércio nesta fracção, deverá ser facultado pelos Primeiros contraentes à Segunda, até ao dia 15 de Agosto de 2001. A partir dessa data a Segunda contraente, iniciará as obras para abertura do comércio nessa fracção B.

d. Artigo 14.° - O incumprimento por parte de qualquer dos contraentes dos prazos atrás estipulados determinará a obrigação de o contraente faltoso indemnizar o outro com a quantia de cinquenta mil escudos por cada dia de mora no cumprimento. (…)”; 2- Por escrito particular datado de 23 de Fevereiro de 2001, com cópia junta a fls. 5 dos autos principais, cujo teor aqui se dá por reproduzido, um sócio gerente de "D", declarou nomeadamente que esta sociedade cedia ao embargado a sua posição contratual no negócio referenciado em «1», tendo o embargado declarado aceitar tal cessão.

3- O uso da mencionada fracção “C” foi facultado ao embargado em 18 de Maio de 2001.

4- O uso da mencionada fracção “B” ainda não fora facultado ao embargado em 10 de Dezembro de 2002.

5- Em finais de Novembro de 2001, quando a fracção “B” deixou de ter escoras dentro e o embargante pretendia realizar a sua entrega ao embargado, constatou-se que esta apresentava infiltrações de água na sua parede norte, o que tornava impossível a sua ocupação para exercício do comércio.

6- Entre 30 de Abril de 2001 e 21 de Maio de 2001 manteve-se em frente às fracções “B” e “C” um grande buraco na rua e no passeio, e a rua manteve-se fechada ao trânsito, o que inviabilizou a transferência de mercadorias entre as fracções “B” e “C”.

Da base instrutória: 7- O embargado participou nas negociações dos acordos relativos às fracções autónomas em causa, celebrados nos autos de inventário que correram termos neste tribunal sob o n.º 267/99, e teve conhecimento do seu teor.

8- O embargado teve conhecimento do facto descrito em «5».

9- Desde Novembro e Dezembro de 2001, o embargante fez inúmeras diligências junto da sua irmã Laura M... para que esta realizasse as obras necessárias à correcção do referido em «5», factos de que o embargado teve conhecimento.

10- Não tendo...

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