Acórdão nº 813/02-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Janeiro de 2003

Data15 Janeiro 2003

24 Apelação - Proc. n.º 813/02 da 1.ª Secção Cível Processo sumário n.º 216/1996 da Comarca de Viana do Castelo Relator: Des. Arnaldo António da Silva Adjuntos: Des. Silva Rato e Des. Bernardo Domingues Proc. 813/02-1ACÓRDÃOAcordam os juizes, em conferência, na Secção Cível, do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

Relatório: 1. Por, apesar de instados por diversas vezes, "A", recusarem- se a construir o muro situado a sul e poente do logradouro e as fossas sépticas e a encher com terra o espaço entre os muros. Muros estes e fossas estas que destruíram, e terras do logradouro que desabaram, quando em Maio de 1995, sob as ordens e direcção de "A", construtor civil, iniciou a construção de um prédio de rés-do-chão e 1.º andar no lote de terreno daqueles (lote 2) localizado a poente e a sul do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito no lugar de ...Viana do Castelo, em que "B", são proprietários das fracções autónomas, respectivamente, do 1.º andar direito, rés-do-chão esquerdo, e rés-do-chão direito, e 1.º andar esquerdo. Porque o custo total das obras de reparação danos relativos à construção dos muros e ao enchimento do espaço com terra entre os muros e as terras do logradouro que não desabaram orçavam em 19-10-1996 na importância de 850.000$00, e porque o custo das obras de reposição das fossas sépticas no estado em que se encontravam orçavam em 200.000$00, vieram "B", intentar contra "A", aqueles residentes na Rua ..., em Viana do Castelo, e este residente no lugar de ..., concelho de Viana do Castelo, acção declarativa com processo sumário, que correu os seus termos no 1.º Juízo Cível da Comarca de Viana do Castelo, na qual pediram: a) Que se declarasse que as fracções autónomas do prédio do prédio supra referidas pertencem em propriedade aos autores; b) Que se declarasse que o logradouro situado a poente do aludido prédio é parte comum das referidas fracções autónomas, e assim, também pertencem aos autores em compropriedade; c) Que os réus fossem condenados a reconhecer o direito dos autores; d) Que os réus fossem condenados a repor o logradouro e as fossas sépticas daquelas fracções autónomas no estado em que se encontravam, executando as obras de construção do dito muro e a encher de terra o espaço entre os muros e as terras do logradouro que não desabaram, e a reconstruir aquelas fossas sépticas e a remover a camada de betão que sobre elas colocaram, ou a pagarem aos autores a quantia de 1.050.000$00, acrescida de juros à taxa legal de 10 % a contar da citação até integral pagamento; e) Que os réus fossem condenados a pagar aos autores uma indemnização a liquidar em execução de sentença; f) Que os réus fossem condenados nas custas e na procuradoria condigna.

Apenas contestaram os réus "A". Na sua contestação impugnaram genericamente os factos alegados pelos autores.

Posteriormente a acção correu os seus termos, tendo sido proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido.

** 2. Inconformados com esta sentença, apelaram os autores. Nas suas alegações concluíram: 1.º Foi dado como assente que o 2.º recorrido actuou por conta e ordem dos 1.º recorridos, e que foi um subempreiteiro do 2.º recorrido que, ao proceder às escavações para a obra, destruiu todo o muro situado a sul do logradouro, bem como 5 metros do muro poente; 2.º Além disso, também ficou provado que foi o 2.º recorrido quem, na mesma qualidade, destruiu as fossas sépticas e que após reconstrução pelos serviços municipalizados de saneamento básico da Câmara Municipal, os recorridos, as taparam com betão e continuarem a construir sobre as mesmas; 3.º O dono da obra e o empreiteiro, este por ser o detentor da construção, são ambos responsáveis perante terceiros nos termos do artigo 493° n.° 2 do CC por se tratar de uma actividade perigosa; 4.º Com efeito, cabe a ambos um dever geral de vigilância e de fiscalização – cfr. também o artigo 1209º do CC sobre a fiscalização da obra; 5.º Deveriam, pois, ter tomado todas as precauç6es necessárias para evitar danos a terceiros, o que não fizeram; 6.º Consagrando tal omissão uma responsabilidade e dever de indemnizar os danos produzidos nos termos dos artigos 483° e 486° do CC.; 7.º Tal responsabilidade fundamenta-se, finalmente, no critério geral do “bonus pater familias” para se aferir o grau de culpa – cfr. art. 487 n.° 2 do CC.; 8.º Pois que, age com culpa, quem não actuar segundo a diligência de um homem médio e diligente colocado nas mesmas circunstâncias; 9.º Tal dever foi violado por ambos os recorridos, pois que, não tomarem as devidas e necessárias precauções para evitar os danos causados aos recorrentes; 10.º Deste modo, ambos os recorridos são responsáveis perante os recorrentes por terem violado os mais elementares deveres acessórios de conduta que orientam qualquer pessoa na sua actuação; 11.º A igual conclusão chegaríamos apelando às relações entre o 2.º recorrido e o subempreiteiro; 12.º Pois que nestas se aplica o regime da responsabilidade do comitente pelos actos dos seus comissários – cfr. artigo 500 do CC.; 13.º Com efeito, os danos causados pelo subempreiteiro foram-nos no exercício das funções que o 2º recorrido (empreiteiro) lhe cometeu, sob a sua direcção e fiscalização, no âmbito e por causa dessas funções; 14.º Pelo que, tendo a obra apresentado defeitos por causa da actividade do subempreiteiro será o 2.º recorrido o responsável por estes nos termos do artigo 500º do CC.; 15.º Além disso, tal responsabilidade do 2.º recorrido não exclui a responsabilidade dos 1.º recorridos perante os recorrentes; 16.º Com efeito, os 1.º recorridos tinham o dever de se comportarem como manda “um bom pai de família”, isto é, o dever de vigiar a obra – cfr. artigo 1209º do CC.; 17.º Ao conhecerem os defeitos da obra, os 1º recorridos deviam impedir que esta causasse danos maiores tanto a eles próprios como aos recorrentes; 18.º O que não fizerem, pois que não pediram ao 2.º recorrido a eliminação dos defeitos; 19.º Pelo contrário, permitiram que o 2.º recorrido continuasse a construir sobre as fossas sépticas anteriormente reconstruídas pelos serviços municipalizados de saneamento básico da Câmara Municipal; 20.º Pelo que, agiram no mínimo com mera-culpa e são por isso também responsáveis perante os recorrentes, e solidariamente com o 2.º recorrido já que este é responsável pelos actos do seu comissário (subempreiteiro).

Deve, pois, a douta sentença ser revogada e consequentemente condenar-se que os recorridos a indemnizarem os recorrentes dos prejuízos por estes sofridos, que ascendem ao montante de € 2 843,15 (570.000$00).

*Contra-alegaram os réus apelados. Nas suas contra-alegações concluem: 1.º Encontrando-se as fossas no terreno dos ora 1.ºs recorridos e não tendo os recorrentes alegado a existência de qualquer direito de servidão sobre o referido terreno, não pode proceder qualquer pedido referente às mencionadas fossas; 2.º Constando na douta sentença o atrás referido e não tendo os recorrentes invocado qualquer argumento a demonstrar ou minimamente contrariar o assim entendido, o pedido sobre eventuais prejuízos decorrentes das mencionadas fossas encontra-se prejudicado, uma vez que não foi atacado o fundamento invocado na douta sentença para julgar a acção improcedente nesta parte; 3.º Realmente, os recorrente apenas atacam o fundamento constante da douta sentença de que os contratos de empreitada e subempreitada não consubstanciam uma relação de comissão; 4.º Sem prejuízo de se pedir o montante para a reconstrução de fossas, quando foi dado como provado que as mesmas foram construídas pelos Serviços Municipalizados, como resulta da resposta dada ao quesito 13°.; 5.º Num contrato de empreitada e celebrado este, o empreiteiro apenas obedece às prescrições do contrato e às exigências das regras de arte, agindo quanto a todo o restante com total independência e autonomia, pelo que é ele o autor da obra e, como tal, único responsável pelos danos provocados a terceiros; 6.º No caso dos autos, tendo havido uma subempreitada, no domínio da qual foi derrubado o muro, o responsável por tais danos é o subempreiteiro, uma vez que, aquando do evento, era ele o detentor e efectivo autor da obra; 7.º De todo o modo, nunca a responsabilidade recorridos, até por não ter sido provado o condicionalismo do art.º 264º do Cód. Civil, aplicável « ex vi » art.º 1213º, n.º 2 do mesmo diploma; 8.º Muito embora, em tese abstracta, a construção civil possa ser considerada como uma actividade perigosa, o facto de alguém ter mandado construir uma casa não pode ser considerado como tal, uma vez que, quem exerce a actividade é o empreiteiro e, no caso dos autos, o subempreiteiro; 9.º In casu, não foi alegado nem demonstrado que a execução da obra, pelas suas concretas características constituiu actividade perigosa, nem tão pouco ficou provada a periculosidade dos meios utilizados pelo subempreiteiro nas escavações originárias do derrube do muro; 10.º O dono da obra não tem obrigação de vigiar a obra nos termos de evitar ou prevenir danos nos prédios vizinhos, recaindo tal obrigação sobre o empreiteiro ou subempreiteiro; 11.º De facto, nos termos do disposto no artigo 1209º do Cód. Civil, ao dono da obra apenas é conferido o poder ou possibilidade de fiscalização, nos limites aí referidos, o que pode ou não ser utilizado; 12.º Não havendo obrigatoriedade de vigilância, a inexistência da mesma não constitui qualquer ilícito, e não havendo este, igualmente não há culpa.

13.º Pelo que não se aplica no caso dos autos o disposto nos artigos 487º, n.º 2 e 493º, n.º 2, como os recorrentes pretendem; 14.º Também por todo o exposto, improcedem todas as conclusões dos recorrentes.

* 3. As questões essenciais a decidir: Na perspectiva da delimitação pelo recorrente O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente pela...

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