Acórdão nº 1204/02-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Janeiro de 2003

Data15 Janeiro 2003

13 Apelação nº 1204/2002 - 2ª secção Acção Sumária n.º355/2000- 1º juízo da Comarca de Felgueiras.

Relatora - Maria Rosa Tching ( nº 69) Adjuntos - Des. Espinheira Baltar (42).

- Des. Arnaldo Silva.

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães "A", residentes no ..., Felgueiras, intentaram a presente acção declarativa com processo comum sob a forma sumária contra "B", solteira, maior, residente na Rua ..., Porto, pedindo que: a) se reconheça o direito de servidão de passagem, para pessoas a pé e veículos de tracção animal e mecânica, imposta no prédio serviente da ré, identificado no art.° 7° da petição inicial, a favor do prédio dos autores identificado no art.° 1°, exercível pelo caminho que fica de permeio entre os prédios dominante e serviente, referenciado nos arts. 4°, 5°, 8° e 9°, servidão constituída pela sentença que homologou a transacção efectuada na acção referenciada no art. 5° e também por usucapião; b) se reconheça que o invocado direito de servidão de passagem é estorvado e impedido, no seu exercício, com a construção da escada referida no artº 16°, que ocupou do leito do caminho afecto ao exercício da servidão, uma área de cerca de 70 cm; c) se condene a ré a destruir e retirar do leito do caminho de servidão aquela escada referida nos arts. 16° e 17°, que viola os direitos dos autores, proprietários do prédio dominante, identificado no art. 1°, estorvando e impedindo o exercício da reconhecida e constituída servidão de passagem imposta no prédio da ré identificado e descrito no art.7°.

Alegam, para tanto, em síntese e, com interesse, que: - os pais e sogros dos autores compraram, por escritura pública, dois prédios urbanos, que vieram a transmitir-se aos autores por partilha de herança, tendo os autores estado na respectiva posse desde há mais de vinte anos; - a fruição de tais prédios tem vindo a ser assegurada, contínua e ininterruptamente, desde há mais de vinte anos, exclusivamente, pelo caminho que os margina em toda a extensão do seu lado norte, na convicção do exercício de um direito de servidão de passagem de pessoas a pé e de veículos de tracção animal e mecânica; - direito de servidão de passagem esse que foi reconhecido aos pais e sogros dos" autores pelos antecessores da ré em transacção celebrada em acção judicial e homologada por sentença de 4 de Outubro de 1962; - o leito do referido caminho tinha largura suficiente para assegurar o trânsito de pessoas e veículos de tracção animal e mecânica, tendo sempre sido usado pelos autores também para acesso à loja que tinha sido destinada a oficina de tamanqueiro e passou a ser loja de lagar e arrecadação, através de uma entrada construída de acordo com o clausulado na dita transacção; - a ré comprou o prédio serviente por escritura pública, em 1991 e, no aproveitamento de licença camarária para "restauro e ampliação", demoliu completamente o prédio e edificou um outro de substituição; - tendo sido aberta no prédio edificado, uma porta que deita directamente para o leito do referido caminho de servidão, passando o acesso a tal porta a ser feito por uma escada com três degraus, construída sobre esse leito, do qual a dita escada ocupou cerca de 70 cm, ficando reduzido a uma faixa utilizável para trânsito de cerca de 1,70 cm e, assim, insuficiente para assegurar o trânsito de veículos de tracção animal e mecânica; - o acesso ao prédio serviente, antes da sua demolição, era assegurado por uma outra escada de madeira, situada em diferente local.

Citada a ré, contestou, nos seguintes termos, em resumo: - a fruição dos prédios dos autores faz-se e sempre se fez utilizando o caminho que confina com o prédio da ré a poente e não através do caminho de permeio entre ambos os prédios, cuja utilização, extremamente rara, é pedonal, nunca nele tendo transitado qualquer veículo; - na acção referida na petição inicial, apenas ficou estabelecida uma servidão de passagem, não sendo referida a passagem de veículos de tracção animal ou mecânica, porque tal nunca sucedeu; - o trânsito de veículos sempre se fez pelo caminho situado a poente do prédio da ré; - o caminho que confronta com os prédios de autores e ré, respectivamente, a norte e sul, é, e sempre foi, um caminho muito estreito e íngreme, possuindo uma zona calcetada e outra empedrada, com um desnível entre si de, pelo menos, 20 cm de altura, que sempre impediu o trânsito de qualquer veículo; - a porta referida pêlos autores sempre existiu, assim como os degraus de acesso à mesma, apesar de construídos de novo, sendo mesmo anteriormente, não três, mas mais de dez, pelo que o leito do caminho não ficou reduzido; - sobre o dito caminho sempre existiu uma ramada de videiras, apoiada em esteios de granito, que ainda lá se encontram, existindo ainda, do lado da casa da ré, anteriormente, junto às escadas, um suporte de madeira no caminho, a mais de setenta centímetros da dita casa, também por isto não sendo possível a passagem de veículos, tendo o caminho, desde tempos imemoriais, uma largura de cerca de metro e meio.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido dispensada a fixação da base instrutória, nos termos do art.° 787° n° l do CPC.

Procedeu-se ao julgamento, com observância do formalismo legal.

Discutida a causa, respondeu-se à matéria de facto controvertida pela forma que consta a fls. 152 a 156.

A final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência: A) reconheceu o direito de servidão de passagem, para pessoas a pé, imposta no prédio serviente da ré, identificado no art.° 7° da petição inicial, a favor do prédio dos autores identificado no art.° 1°, exercível pelo caminho que fica de permeio entre os prédios dominante e serviente, referenciado nos art.° s 4°, 5°, 8° e 9° da petição inicial, servidão constituída pela sentença que homologou a transacção efectuada na acção referenciada no art. 5° e também por usucapião; B) absolveu a ré do demais peticionado.

  1. condenou os autores no pagamento das custas.

Não se conformando com esta decisão, na parte em que julgou improcedentes os demais pedidos por eles formulados, dela, atempadamente apelaram os autores, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: “a) - A transacção homologada por sentença transitada na qual os Autores, Albérico Pires Sobral e cônjuge reconheceram aos RR. Joaquim Ribeiro Matamá e cônjuge o direito de servidão de passagem imposta no prédio serviente, adquirido pela recorrida, identificado no artigo 7° da inicial a favor do prédio dos recorrentes, identificado no artigo 1° da petição inicial, não regulou a sua extensão e exercício do direito de servidão de passagem.

  1. - A declaração negociai da invocada transacção, não pode ser integrada na forma reconhecida na sentença face à manifestada vontade das partes, designadamente pelos RR. nos artigos 8° e 9° da contestação, nos termos do disposto no artigo 1.248° com referência ao artigo 239° do Código Civil.

  2. - O reconhecido direito de servidão de passagem, não especialmente regulado quanto à extensão e exercício, tem de considerar-se constituída por forma a satisfazer as necessidades normais e previsíveis do prédio dominante, as actuais e as futuras. Cfr. artigos 1.564° e 1.565° do C. Civil.

  3. - Essas necessidades normais e previsíveis, actuais e futuros, considerada a natureza do prédio dominante não são satisfeitas com o trânsito apenas de pessoas a pé.

  4. - Revela-o, de forma irrecusável, a existência de sinais visíveis e permanentes existentes no leito do caminho, reveladores do trânsito de veículos e o provado trânsito de carro de bois, há 60 a 70 anos, e de tractor, pelo menos uma ou duas vezes por ano, destinado a carregar o vinho produzido no prédio, após as vindimas.

  5. - O prédio dominante, justificando a construção de lagar e arrecadação de vasilhame para o vinho nele fabricado e o cultivo de géneros destinados à economia doméstica e alfaias agrícolas e a prevista edificação na parte urbana, prevista na transacção, não pode bastar-se, na sua fruição, apenas como reconhecido trânsito de pessoas a pé.

  6. - O trânsito praticado pelos recorrentes, obviamente com o ânimo de exercer o direito de servidão de passagem, contínua e ininterruptamente, desde há mais de 20 anos, pelo caminho com sinais visíveis e permanentes com...

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