Acórdão nº 834/02-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Janeiro de 2003

Magistrado ResponsávelARNALDO ANT
Data da Resolução08 de Janeiro de 2003
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

24 Apelação - Proc. n.º 834/02 da 2.ª Secção Cível Processo sumário n.º 825/2000 da Comarca de Guimarães Relator: Des. Arnaldo António da Silva Adjuntos: Des. Silva Rato Des. Bernardo Domingues Proc. n.º 834/02ACÓRDÃOAcordam os juizes, em conferência, do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

Relatório: 1. "AA" invocando serem arrendatários do prédio urbano sito no lugar da ..., freguesia de ..., da comarca de Guimarães, inscrito na matriz sob o artigo 279, e que também faz parte deste arrendado um terreno de quintal, nas traseiras da casa, lado norte, devidamente alinhado em linha recta, até aos limites do prédio, em forma relativamente rectangular, que cultivam, e que há cerca de 10 meses, "BB" iniciaram obras no local do prédio, ocupando terreno do logradouro e de acesso à sua casa, e o espaço do quintal, estorvando-lhes assim a sua passagem para a garagem e para o terreno do quintal, e que os ditos "BB" têm um alvará e licença de obras n.º 170 da Câmara Municipal de Guimarães para construírem uma obra composta de rés-do-chão, primeiro andar e sótão, com a área de 232 m2 e o volume de construção de 2088 m2 (sic) no terreno onde se situa a casa que lhes está arrendada e por cima deste e de outras geminadas, retirando-lhe com isso a luz do sol, e que no dia 18-03-2002 os ditos "BB" retiraram o telhado da casa que lhes está arrendada, e que começaram a destruir casa que lhes está arrendada, e a depositar materiais e outras coisas nos acessos ao arrendado, por forma a impedir-lhes o acesso, deduziram contra "BB" acção declarativa com processo sumário, que correu os seus termos com o n.º 825/2000 no 2º Juízo Cível da Comarca de Guimarães, pedindo: a) Que seja declarada e reconhecida a existência e validade do contrato de arrendamento que invocam na sua petição inicial e a condenação dos réus a reconhecer a existência desse contrato; b) Que os réus sejam condenados a restituir-lhes o prédio devoluto de pessoas e bens; c) Que os réus sejam condenados a abster-se da prática de quaisquer actos que atentem contra o direito dos autores à habitação sobre o arrendado, ao sossego, ao repouso e ao bem estar.

Na sua contestação os réus reconheceram a existência do contrato de arrendamento invocado pelos autores, mas sustentam que os autores ocupam, sem qualquer título e apenas por mera tolerância dos réus o dito terreno de quintal nas traseiras do rés-do-chão arrendado aos autores. Quanto ao mais sustentaram que a obra licenciada pela Câmara não prejudica de modo algum o direito à habitação dos autores, embora aceite que lhes cause algum incómodo, que declararam aceitar reparar, e concluíram pedindo a sua absolvição.

Esta acção prosseguiu os seus termos, tendo sido proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção, tendo em consequência: a) Declarado a existência do contrato de arrendamento celebrado em 03/08/89, entre o A. e Joaquim ..., tendo apenas por objecto o rés do chão e uma dependência do prédio sito no Lugar ..., inscrito na matriz da freguesia de ..., Guimarães, sob o n.º 270, pela renda anual de 120.000$00, a pagar em duodécimos na residência do senhorio no 1º dia útil do mês anterior a que respeita, pelo prazo de 1 ano, a começar em 01/11/89, considerando-se prorrogado por períodos iguais e nas mesmas condições enquanto não fosse denunciado por qualquer das partes; b) Condenado os réus "BB" a reconhecer a existência e validade do contrato referido em a); c) Condenado os mesmos réus a absterem-se de praticar quaisquer actos que atentem contra o direito dos autores "AA" ao gozo da habitação referida em a) e ao sossego, ao repouso e ao bem estar dos autores; e d) Absolvido os réus quanto ao demais peticionado.

Mais condenou os autores em custas, uma vez que os réus não contestaram a matéria que implica a procedência parcial da acção, não tendo, portanto, dado causa à acção, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhes foi concedido.

** 2. Inconformados com esta sentença, apelaram os autores. Nas suas alegações concluíram: 1.º A prova produzida nos Autos permite concluir, face ao que em sede de fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto e da fundamentação direito, que o contrato de arrendamento celebrado entre os apelantes e Joaquim ... tem o âmbito alargado ao conteúdo invocado nos artigos 1º a 5º da petição inicial, não estando dele excluídos a dependência referida no artigo 3º nem o quintal mencionado no artigo 5º do mesmo articulado; 2.º Alegando os apelantes que do contrato faz parte uma dependência, que utilizam como garagem, é irrelevante a questão da existência de duas dependências, para se poder afirmar ser impossível fazer corresponder a dependência referida no contrato à garagem utilizada pelos autores, pois tal conduziria ao absurdo de fazer “desaparecer” totalmente toda e qualquer dependência; 3.º Donde se deve considerar a conduta dos apelados esbulhadora da posse dos apelantes sobre a dita dependência ou garagem, pelo que o respectivo pedido deveria ter sido julgado procedente; 4.º Também no âmbito do contrato deveria ser incluído o terreno de quintal que os apelados ocuparam ilegal e abusivamente para realizarem as obras referidas nos autos; 5.º Na verdade, provado que se mostra que os apelantes cultivavam o dito quintal, não se torna necessário para que o mesmo deva ser considerado abrangido pelo contrato de arrendamento a existência de título e a prova do pagamento de uma retribuição pelo seu gozo; 6.º Com(o) já foi decidido pela Relação do Porto, Ac. de 26/9/89, BMJ, 389, 653, “o logradouro é uma das componentes do prédio urbano, de sorte que o acompanha em princípio quando este é objecto, no todo ou em parte dum contrato de arrendamento e que “... a exclusão do objecto do contrato escrito tem ser entendida pelo arrendatário e tem de ter um mínimo de correspondência no contrato; 7,º Daí não haver a tal respeito qualquer limitação na matéria de prova designadamente as impostas pelos artigos 393° e 394°, do C.C., sendo perfeitamente admissível a prova testemunhal, pelo que se impõem a alteração das respostas dadas aos artigos 1º e 2º da base instmt6ria; 8.º Aliás, como também vem sendo aceite pela jurisprudência – Ac. da Relação de Coimbra de 12/07/94, CJ, XIX, 4, 25 “um documento particular assinado pelas partes e por elas aceite, faz apenas prova plena da materialidade ias declarações nele contidas; mas já não faz prova plena quanto à exactidão das mesmas “ pois a inexactidão”... pode ser demonstrada mesmo mercê do recurso à prova testemunhal” .

9.º Devendo considera-se como abrangidos pelo âmbito do contrato de arrendamento a dependência utilizada pelos apelantes como garagem e o terreno de quintal, impunha-se a procedência total da acção, com a consequente condenação dos apelados na totalidade dos pedidos contra eles formulados pelos apelantes; 10.º Daí ter a douta sentença apelada violado os artigos 1037°, 393° e 394°, do C.C..

*Contra-alegaram os réus apelados, batendo-se pela improcedência da apelação.

* 3. As questões essenciais a decidir: Na perspectiva da delimitação pelo recorrente O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 684º, n.º 2 2ª parte do Cód. Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 684º-A, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo recorrente. Vd. Sobre esta matéria Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa –1997, págs. 460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos, Liv. Almedina, Coimbra – 2000, págs. 103 e segs.

, os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56.

, salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).

Atento o exposto e o que flui das conclusões das alegações Conclusões que terão de ser, logicamente, um resumo dos fundamentos porque se pede o seu provimento do recurso, tendo como finalidade que elas se tornem fácil e rapidamente apreensíveis pelo tribunal. As conclusões não devem ser afirmações desgarradas de qualquer premissa, e sem qualquer referência à fundamentação por que se pede o provimento do recurso. Não podem ser consideradas conclusões as indicadas como tal, mas que sejam afirmações desgarradas sem qualquer referência à fundamentação do recurso, nem se deve tomar conhecimento de outras questões que eventualmente tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas, mas não levadas às conclusões. Por isso, só devem ser conhecidas, e só e apenas só, as questões suscitadas nas alegações e levadas às conclusões. Neste sentido, vd. Acs. do STJ de 21-10-1993 e de 12-01-1995: CJ (STJ), respectivamente, Ano I, tomo 3, pág. 84 e Ano III, tomo 1, pág. 19.

__ e só se devem conhecer as questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, ainda que outras, eventualmente, tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas Cfr. supra nota 3.

__, dos autores apelantes supra descritas em I. 2., as questões essenciais são essencialmente três: 1) se se pode ou não alterar da matéria de facto que deu como não provados os factos 1º e 2º da base instrutória, por forma a abranger no contrato de arrendamento o terreno de quintal situado nas traseiras da casa arrendada; 2) se o contrato de arrendamento abrange ou não também a dependência (anexo) utilizada pelos apelantes como garagem e 3) e se sim, se a acção deveria ter sido julgada procedente quanto à totalidade dos pedidos formulados pelos autores.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:*** II.

Fundamentos: A) De facto: Na 1.ª instância forma dados como...

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