Acórdão nº 2758/06-3 de Tribunal da Relação de Évora, 01 de Fevereiro de 2007

Data01 Fevereiro 2007

PROCESSO Nº 2758/06 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I.

"A" intentou a presente providência cautelar não especificada contra "B" e mulher "C", pelos motivos constantes da sua p.i., pedindo que seja determinada a restituição imediata da fracção "GU" livre de pessoas e bens.

Os Requeridos deduziram oposição, concluindo pela improcedência do presente procedimento.

Realizado julgamento, foi proferida sentença, que concluiu com a seguinte decisão: Assim, nos termos do artigo 381º e 387° do C. P. Civil, julgo improcedente a providência requerida.

Inconformada veio a Requerente a interpor recurso de tal decisão, cujas alegações, de fls. 2 a 10 destes autos, concluiu nos seguintes termos: "1. A Agravante é legitima proprietária da fracção GU integrada no prédio urbano designado por … ou …, lote B-2, sito na freguesia e concelho de …, descrito na Conservatória Registo Predial de … sob 686/210386 e artigo matricial n° 45325 (Cfr. Ponto 18 da fundamentação de facto).

  1. A Agravante enquanto proprietária plena da fracção. GU está investida em todos os poderes/faculdades que o direito de propriedade lhe confere, nomeadamente, usá-la, aliena locá-la, etc.

  2. Fracção essa que se encontra ilegitimamente ocupada pelos Agravados (cfr. Ponto 25 da fundamentação de facto).

  3. Apesar de interpelados para o fazerem, os Agravados nunca desocuparam, até à presente data, a referida fracção. (cfr. Ponto 27 da fundamentação de facto).

    Não foi provado que a Agravante tenha incentivado e aceitado que os Agravados permanecessem na 5. fracção para acompanharem as obras do edifício, pelo tempo de vigência do contrato promessa de leasing, isto é, até que fosse celebrado o respectivo contrato definitivo, conforme alegado pelos Agravados.

  4. Da matéria dada como provada e matéria dada como não provada uma única e pois inequívoco, que a Agravante é proprietária da fracção em causa, pretende exercer sobre as fracção o seu direito de propriedade e que, por seu turno, os Agravados ocupam a fracção ilegitimamente, isto é, sem que nada o justifique, sem titulo.

  5. O procedimento cautelar comum para situação sub judice é o único possível. O único procedimento cautelar especificado mais próximo é a providência de restituição provisória a posse prevista nos artigos 3930 do C.P.C., sendo um dos requisitos cruciais o esbulho violento do imóvel.

  6. No ordenamento jurídico Português o único meio processual que um proprietário tem de lhe ser restituído um imóvel, que não tenha sido objecto de esbulho violento, é lançar mão de uma acção de restituição do mesmo, e de modo a que essa restituição possa ser operada com urgência, de modo a prevenir danos, é instaurar uma providencia cautelar não especificada cuja disciplina se encontra explanada no artigo 3810 e sgs do C.P.C.

  7. Os requisitos previstos nestes artigos tem de ser interpretados e aplicados com referência à situação em concreto.

  8. Isto porque, ao contrário do que sucede com as outras providências preventivas, que visam obter um acto determinado (a prestação de alimentos, a restituição da posse, a suspensão de deliberação, o arresto, a suspensão de obra (providências do artigo 4050 (actual 3810 C.P.C.) não têm sempre o mesmo o objectivo especial: podem propor-se os fins mais diversos, podem ter por conteúdo os pedidos mais variados.

  9. Esta diversidade fins e pedidos variados forçosamente deverão implicar por parte do julgador uma aferição dos requisitos do artigo 3810 do C.P.C de acordo com a situação concreta que se lhe depara.

  10. 0 que a Agravante pretende na acção principal é a restituição do imóvel, entendendo a jurisprudência nestes casos que na acção de reivindicação compete ao Autor o ónus de provar que é proprietário da coisa e que esta se encontra na posse ou na detenção do demandado, compete ao Réu for o caso, o ónus de provar que é titular de um direito que legiima a recusa da restituição (art.º 342 C. Civil).

  11. Uma vez que a presente providência cautelar visa uma decisão antecipatória acção principal, era fundamental para os Recorridos tivessem feito prova que são titulares de um direito que os legitimasse a sua recusa na restituição. Não o lograram fazer.

  12. Mesmo que se entenda que tal não suficiente, então torna-se crucial perceber as características e a natureza do direito de propriedade, sob pena de nos depararmos com decisões que chocam o ordenamento jurídico português.

  13. No direito português o direito de propriedade é um. direito enformador, nuclear e constitucionalmente protegido artigo 62° da C.R.P.

  14. Ao não decretar a presente providência, por entender não se verificarem os requisitos previstos nos artigos 381 ° do C.P.C., o Tribunal não fez mais que entender e admitir que um proprietário, cujo seu direito é violado nas circunstâncias alegadas no caso concreto, não pode obter provisoriamente uma restituição imediata do seu imóvel, porque no ordenamento jurídico português não existe uma providência cautelar que possa pôr, com urgência e preventivamente, um fim à conduta ilícita dos Recorridos.

  15. Admitir esta situação é o mesmo que admitir, que a restituição urgente de um imóvel só possa ser possível na circunstância do esbulho violento, conforme previsto nos artigos 393° C.P.C.

  16. É que na verdade a ocupação ilegítima de um imóvel é tão ilegítima por parte daquele que a ocupa sem usar de violência, como daquele que o faz de forma violenta. Em ambas as situações estamos perante condutas abusivas que obstam ao exercício de um direito absoluto, como é o direito de propriedade.

  17. Nos termos do artigo 387° do C.P.C. os procedimentos cautelares não especificados deverão ser decretados sempre haja uma probabilidade séria existência direito (fumus boni iuris) e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão.

  18. O artigo 381° n.° 1 do C.P.C. determina que sempre que se mostre o fundado receio de que outrem, cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer uma providencia conservatória ou antecipatória, concretamente adequada a assegurar a efectividade direito ameaçado, sendo que o interesse da requerente pode fundar-se num direito existente ou em direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, à proposta ou a propor.

    Sobre a probabilidade séria existência do direito, o Douto Tribunal recorrido decidiu peremptoriamente que não restam dúvidas de que o requerente "A" proprietária do imóvel no qual se inclui a fracção "GU", pelo que está verificado o primeiro requisito.

  19. A questão do periculum in mora, isto é o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do direito, também está verificado.

  20. Nos termos do artigo 1305° do C.C. "0 proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direito de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com...

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