Acórdão nº 00231/05.7BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução08 de Março de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do TCAN: I- RELATÓRIO R… e mulher I…, residentes em Beco …, Lugar de F…, Freguesia de São Tomé do Castelo, Concelho de Vila Real, inconformados com a decisão do TAF de Mirandela, datada de 18.JUL.06, que julgou improcedente o pedido de adopção de PROVIDÊNCIAS CAUTELARES, oportunamente por si deduzido, contra a Câmara Municipal de Vila Real e Outros, consistentes na Suspensão de Eficácia do despacho do Director do Departamento de Obras Municipais, proferido no uso de poderes delegados pelo Presidente da Câmara Municipal de Vila Real, datado de 16.MAI.06, que ordenou a demolição das obras executadas pelos Requerentes de construção de um portão de entrada, recorreu para o TCAN, formulando as seguintes conclusões: 1- Os recorrentes não se conformam com a decisão do Tribunal recorrido que indeferiu o procedimento cautelar requerido, pelo que vai o presente recurso interposto da matéria de facto e matéria de direito, entendendo que houve violação e errada aplicação da lei, mormente os artigos 1344.º, 342.º e 369.º e seguintes do C.C., 508.ºA e 265.ºA, 668.º, 669.º do CPC, 87.º, 112.º, 118.º e 120.º do CPTA, e princípios gerais do direito probatório.

2- No que toca à matéria de facto, a decisão recorrida julgou incorrectamente a matéria de facto, e os meios probatórios impunham outra decisão, além de que devia o Tribunal ter enveredado pela produção de prova em audiência de discussão e julgamento tendo em vista o apuramento de todos os elementos para a boa decisão da causa - Cfr.690.ºA e 712.º do CPC.

3- O Tribunal recorrido rumou mal ao ajuizar que não necessitava apurar mais matéria de facto, pois não tinha matéria de facto suficiente para decidir, apenas valorou a posição e provas dos contra-interessados, quando devia ter decretado a produção de prova, sendo que, ao abrigo dos princípios gerais de direito e art.º 668.º, 712.º do CPC, n.º 4 e 5, deve a decisão do Tribunal ser anulada, tendo em conta que do processo não constam todos os elementos probatórios para a boa decisão, sendo indispensável a ampliação da matéria de facto através da produção de prova em audiência, pois a decisão sobre a propriedade, essencial para o desfecho do processo, não está apurada e fundamentada.

4 - Além disso, e sem prescindir, os recorrentes discordam da matéria dada como provada, sendo que relativamente ao ponto 2 da fundamentação de facto da decisão, o mesmo dá como provada determinada matéria de forma deficiente, porquanto omite um aspecto essencial para o desfecho da causa, ao não dar como provado que o pequeno portão instalado pelo irmão do requerente situa-se ao fundo do dito “Beco”, delimitando esse terreno no seu extremo sul, onde não existe qualquer saída pública, mas particular.

5 - Esta matéria a dar como provada é um forte indício da propriedade privada do espaço, pelo que não poderia existir despacho de demolição, que assentou no pressuposto contrário, Cfr. artigos 14.º, 15.º e 16.º do requerimento inicial e das fotografias aí juntas, pelo que a matéria constante daqueles artigos e documentos 5 a 10 do requerimento inicial foram incorrectamente julgados e impunham a decisão de considerar aquele espaço sem qualquer saída pública, antes delimitado por um portão pertencente e utilizado pelos requerentes e família, sem que ninguém tivesse entrada ou saída daquele “Beco” por esse espaço ou outro, devendo a decisão ser alterada nesse sentido, Cfr. art.º712.º, n.º1, alíneas a) e b) do CPC, e princípios do direito probatório.

6 - Relativamente ao ponto 3 da fundamentação de facto da decisão recorrida, o mesmo dá como provada a natureza pública daquela área de terreno e a ilegalidade da apropriação por parte dos requerentes, sustentando com base na reclamação dos contra-interessados e de um abaixo-assinado, contudo os recorrentes entendem que essa matéria foi incorrectamente julgada e os meios de prova que constam do processo impõem decisão diferente, devendo a mesma ser alterada, sendo que houve violação dos princípios do direito probatório.

7 – Quanto ao facto de se considerar a área como pública com base no “abaixo-assinado”, este não pode ser tido como meio probatório, visto que o mesmo foi impugnado no art.º128.º da resposta dos requerentes, porquanto este meio de prova foi tido em conta sem ter sido fiscalizado judicialmente quanto à sua veracidade, sendo que o Tribunal recorrido conferiu àquele a força de um documento autêntico, contrariando os princípios do direito probatório, enquanto a matéria carreada pelos recorrentes indiciava suficientemente a natureza privada daquela área, nomeadamente através da usucapião, Cfr. artigos 14.º a 26.º e respectivos documentos do requerimento inicial, e estes factos, que impunham decisão diversa, não foram valorados pelo Tribunal.

8 - Ainda no ponto 3, quanto ao facto de se considerar a área como pública com base na reclamação dos contra-interessados, o Tribunal julgou mal a matéria de facto dando total credibilidade às declarações daqueles, apesar das contradições que constam do processo, quando os meios probatórios impunham outra decisão, não podendo os recorrentes concordar com a valoração que o Tribunal deu à matéria alegada pelos contra-interessados, porquanto são os próprios a admitir que o dito caminho teria natureza pública ou seria de consortes, Cfr. doc. n.º11 do requerimento inicial, e são os próprios que aceitaram e têm uma cópia da chave do portão, sem nunca se manifestarem, e é de salientar que esta matéria é dada como provada no ponto 6 da fundamentação de facto, o que só é possível se a propriedade for considerada privada. Cfr.art.º 32.º do requerimento inicial.

9 – Assim, a matéria constante daqueles artigos e respectivos documentos foram incorrectamente julgados e impunham a decisão de considerar aquele espaço privado, com uma servidão a favor dos contra-interessados, devendo a decisão ser alterada nesse sentido ao abrigo do art.º712.º, n.º1, alíneas a) e b) do CPC e nos melhores de direito, sendo que houve violação dos princípios e regras gerais do direito probatório.

10 - Quanto ao ponto 4 da fundamentação de facto da decisão recorrida, o mesmo dá como provada a natureza presumivelmente pública daquela área de terreno por parte do município, sustentando com base no doc.n.º2 junto com o requerimento inicial, sendo certo que a Câmara Municipal limitou-se a tomar uma decisão de demolição apenas com base em indícios, presunções e incertezas de que a propriedade era pública, e o Tribunal recorrido apenas valorou o doc.n.º2 e a presunção, sem julgar convenientemente os factos e documentos juntos.

11 - Assim, a matéria constante daqueles artigos e respectivos documentos foram incorrectamente julgados e impunham a decisão de considerar aquele espaço privado, ou, pelo menos, seria produzida a prova para se aprofundar a questão da natureza da propriedade, devendo a decisão ser alterada nesse sentido ao abrigo do art.º712.º, n.º1, alíneas a) e b) do CPC e nos melhores de direito, sendo que houve violação dos princípios probatórios.

12 - Quanto à matéria de direito, os recorrentes observaram todos os pressupostos legais para a procedência do procedimento, mormente nos artigos 112.º e 120.º do CPTA, tendo oferecido ampla prova documental e testemunhal.

13 – O Tribunal entendeu que não se verifica o requisito do periculum in mora, sendo que estes alegaram e ofereceram provas suficientes e detalhadas da produção de prejuízos de difícil reparação para os seus interesses e direitos, Cfr. artigos 39.º a 48.º do requerimento inicial e fotografias juntas, tanto danos morais como a perda de cerca de 7.000,00€, apenas relativo à destruição dos materiais da obra, e a reinstalação do portão e repavimentação do logradouro no caso de terem razão.

14– Os factos articulados consubstanciam prejuízos de difícil reparação, pois atingem um grau de intensidade ou gravidade que tornam merecedores da tutela jurídica, pois a lei refere num dos seus critérios, art.º120.º, n.º1, alínea b), segunda parte, fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que os requerentes pretendem acautelar no processo principal, pelo que é indubitável que existe o “periculum in mora”, e que os recorrentes alegaram factos suficientes para preenchimento do requisito legal.

15 – Em segundo lugar, quanto ao argumento de que o Tribunal ficou sem saber quais os danos irreversíveis que o Despacho suspendendo podia acarretar para os recorrentes, e no que tal Despacho se traduz no receio daquela constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação, os recorrentes sustentam que, o que o legislador exige não são danos irreversíveis, mas antes, e segundo um dos critérios, produção de prejuízos de difícil reparação, pelo que o Tribunal recorrido interpretou e aplicou mal o disposto no art.º120.º, n.º1, alínea b) do CPTA.

16- Os recorrentes forneceram factos concretos de que a execução do despacho de demolição acarreta prejuízos de difícil reparação, Cfr. art.º 39 a 48.º do requerimento inicial, bem como da resposta às excepções, não irreversíveis, sendo certo que tal exigência não consta da letra nem do espírito da lei, pois esta apenas exige que se trate de uma situação em que os danos sejam dificilmente reparáveis ou seja excessivamente oneroso repor a situação anterior, mas nunca um carácter de irreversibilidade, pois o art.º120.º, n.º1, al.b) do CPTA.

*O...

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