Acórdão nº 00363/04.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução16 de Novembro de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do TCAN: I- RELATÓRIO “Município de Santa Maria da Feira”, inconformado com a sentença do TAF de Viseu, datada de 27.DEZ.05, que, em ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM, oportunamente, contra ela interposta por M…, id. nos autos, o condenou no pagamento da quantia de € 6 602,53, recorreu para o TCAN, formulando as seguintes conclusões: A) Sendo a causa do acidente que nos ocupa a existência de um buraco na via rodoviária por onde seguia a A. recorrida, buraco esse cujo surgimento acontece - como diz a própria recorrida - de forma súbita e imprevisível, e no preciso momento em que por aí circulava, não é legalmente exigível impor ao R. que "adivinhasse" que tal situação iria ocorrer e assim a prevenisse; B) Tendo ficado provado nos autos que a) À data do invocado acidente o R. dispunha de equipas de fiscalização que diariamente percorriam as estradas sob sua jurisdição, com vista a detectar deficiências e assim prevenir acidentes como o que nos ocupa e que b) À data - e como é do conhecimento de todos - todo o país foi violentamente fustigado com condições climatéricas excepcionalmente adversas, com fortes e intensas chuvas, ventos ciclónicos, que se abateram sobre o país, em especial nas regiões Centro e Norte e que se prolongaram por semanas seguidas, ininterruptamente, tendo tal situação climatérica anormal provocado, naturalmente, danos graves e desgaste para além do usualmente previsto num grande número de estradas, prejudicando, em alguns casos, as comunicações e deslocações de pessoas e bens, o que levou a Assembleia da República e o Governo do país a produzir diversa quantidade de legislação, com vista a minorar os danos ocorridos por força de tal intempérie, c) Situação à qual o concelho de Santa Maria da Feira não escapou, Em face de tais factos entende o R. que não lhe era legalmente exigível que adoptasse qualquer outro comportamento para além do supra referido e que ficou provado nos autos e que assim desenvolveu uma actividade diligente, tal como faria um bom pai de família se colocado em idêntica situação; C) O acidente em causa ficou, pois, a dever-se a causas de força maior e de todo imprevisíveis e incontroláveis, pelo que nenhuma culpa pode ser assacada ao R; D) Ao não decidir desta forma e ao concluir pela culpa do R. na eclosão do sinistro que nos ocupa, entende o recorrente que a douta Sentença recorrida fez errada apreciação e valoração da prova, bem como errada interpretação e aplicação da lei, violando o disposto no n° 2, do art° 487º do CC e no n° 3, do art° 659º do CPC; e E) Ao não se pronunciar pela não exigibilidade de outro comportamento por parte do R. em face da situação concreta que se lhe deparou à data do sinistro, a douta Sentença é nula nos termos do disposto na al. d), do n° 1, do art° 668º do CPC.

A Recorrida contra-alegou, tendo apresentado, por seu lado, as seguintes alegações: A- A douta sentença recorrida não enferma de qualquer nulidade; B- O Tribunal recorrido pronunciou-se sobre a alegada excepção (inexigibilidade de outro comportamento por parte do Réu em face das especiais circunstâncias em que o sinistro ocorreu), considerando não ter sido provado pelo recorrente, como lhe competia, que as ditas “especiais circunstâncias” em que ocorreram no concelho tivessem interferido com o sinistro ocorrido; C- Conforme jurisprudência pacífica do S.T.A a presunção de culpa estabelecida no artº. 493º, nº1 do C. Civil é aplicável à responsabilidade extracontratual dos municípios, por factos ilícitos de gestão pública; D- Ao recorrente cabia elidir tal presunção, alegando e provando que cumpriu os deveres que se lhe impunham de conservar e vigiar o estado da Rua da Atafona onde se deu o acidente dos autos por forma à sua utilização segura ou que os danos resultantes do acidente se teriam produzido apesar da sua actuação diligente; E- Ora nenhum facto provou o recorrente que se relacionasse com a diligência por si exercida quanto à Rua da Atafona, via particularmente sensível porque «…pavimento antigo…» e construída «…sob uma mina que em certas partes da referida Rua se encontra muito à superfície»; F- Diligência que, segundo “um bom pai de família e em face das circunstâncias” do caso concreto, mais se acentuaria com redobradas vigilância e preocupação pelas condições de segurança do tráfego na referida Rua; G- Sendo certo que a abertura de um buraco naquela Rua com «…cerca de 1 m 60 cm / 1 m nas suas dimensões e cerca de 40 cm de profundidade;» e resultante «… do “aluimento” do pavimento da faixa de rodagem aquando da passagem do veículo conduzido pela A.; » indicia uma deficiente construção da via e uma não menos cuidada preocupação de vigilância e fiscalização da sua segurança; H- Sem a existência da menor prova que tal buraco se devesse às particulares condições climatéricas que se viveram no país e concelho, por essa altura; e I - Tudo razões pelas quais deve ser integralmente mantida a douta sentença recorrida.

O Dignº Procurador-Geral Adjunto emitiu pronúncia nesta instância, no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Administrativo para julgamento do recurso.

II- QUESTÕES A DECIDIR NO RECURSO a) A nulidade da sentença por falta de pronúncia sobre a inexigibilidade de outro comportamento por parte do Recorrente em face das circunstâncias especiais em que ocorreu o acidente; e b) O erro de julgamento sobre a imputação da ocorrência do acidente.

III- FUNDAMENTAÇÃO III-1.

Matéria de facto A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: A) A A. é proprietária de um veículo automóvel ligeiro de passageiros da marca SEAT, modelo Ibiza, com a matrícula …-…-… – cfr. doc. n.° 1 junto com a petição inicial (p.i.); B) A Câmara de Santa Maria da Feira transferiu a responsabilidade que, ao abrigo da lei civil, lhe seja imputável, enquanto na qualidade ou no exercício da actividade expressamente referida nas Condições especiais e Particulares do contrato de seguro titulado pela apólice n.° 002383735 – cfr. doc. n.° 1 junto com a contestação; C) Consta do contrato de seguro referido em B), como data de início: 01.06.2000 e como data de Renovação/Termo: 01.06; D) No dia 05/04/2001, a A. apresentou ao Réu Município o requerimento/participação do acidente infra referido – cfr. doc. n.° 11 junto com a p.i; E) No dia seguinte ao do acidente infra referido (27/03/2001), abriram-se outros buracos na Rua da Atafona, os quais foram sinalizados pela Ré Município; F) No dia 26 de Março de 2001, entre as 00/01.00 horas, a Autora conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros identificado em A) na Rua da Atafona, freguesia de São Paio de Oleiros; G) No sentido São Paio de Oleiros / E.N. 1-14; H) E pela metade direita da faixa de rodagem, atento o seu sentido de marcha; I) O tempo estava “chuvoso”; J) Perto do local em que a Rua da Atafona entronca na Rua do Valado, abriu-se um buraco no meio da metade da via onde a A. seguia e debaixo do rodado do veículo RA; K) De imediato, o veículo imobilizou-se tendo sido parcialmente “engolido” pelo buraco referido em J); L) O Réu Município no dia seguinte ao do acidente cercou com grades e fitas o buraco referido em J) e mais tarde procedeu à reparação da via com o tapamento dos buracos (melhor identificados na fotografia junta como Documento n.º 2); M) O buraco referido em J) tinha cerca de 1 m 60 cm /1 m nas suas dimensões e cerca de 40 cm de profundidade; N) E resultou do “aluimento” do pavimento da faixa de...

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