Acórdão nº 0710027 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Maio de 2007

Data16 Maio 2007
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACÓRDÃO (Tribunal da Relação) Recurso n.º 27/07 Processo n.º …./03.3TDPRT Em audiência na 1.ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto RELATÓRIO 1- No .º juízo criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, no processo acima referido, foi o arguido B.......... julgado e condenado, em processo comum singular, pela forma seguinte: - pela prática de um crime de difamação através da comunicação social, pp pelos arts 180.º e 183.º do CodPenal, na pena de 240 dias de multa, à taxa diária de € 8 - condenado a pagar à assistente C………. a quantia de € 7.000 a título de danos não patrimoniais, com juros legais desde a sentença 2- Inconformado, recorreu o arguido, tendo concluído a sua motivação pela forma seguinte: Para se concluir se o recorrente incorreu ou não na prática do crime de difamação, através da comunicação social, era fundamental escalpelizar os textos em apreço nos autos, da autoria do recorrente, especificando quais as afirmações, as expressões ou os epítetos neles vertidos que consubstanciam ofensa à honra ou consideração da assistente; de tal análise há-de resultar, ainda, se a alegada ofensa foi cometida através da formulação de um juízo ou mediante a imputação, directa, ou sob a forma de suspeita, de factos; esta operação analítica não foi efectuada na decisão recorrida, uma vez que ficou por concretizar em que frase, expressão, ou segmento do texto do recorrente se afirma que a assessora ministerial, aqui assistente, e o Sr. Ministro mantinham ou uma relação amorosa extraconjugal no meio do trabalho; resulta, assim, manifesta a violação do disposto no n° 2, do artigo 374.°, do CódProcPenal; O carácter difamatório ou não de um texto é influenciado pelas circunstâncias de tempo e lugar em que o mesmo é escrito e pelas particularidades das pessoas em causa; o recorrente, no artigo 9.° da contestação, alegou diversos factos respeitantes ao circunstancialismo que se verificava ao tempo em que elaborou os escritos em apreço nos autos, essenciais para a decisão da causa, sobre os quais o tribunal a quo não se pronunciou, e ao não se pronunciar sobre tais factos, o tribunal a quo não só tomou uma opção errada como, também, subtraiu ao recorrente o direito, que lhe assiste, de poder submeter a sua defesa à análise do tribunal de recurso; a sentença recorrida está assim ferida de nulidade por força do disposto na alínea c), do n.° 1, do artigo 379.°, do Cód. de Proc. Penal; O tribunal considerou como provada matéria alegada pela assistente, que é meramente conclusiva, sem suporte factual e que, por isso, deve ser considerada como não escrita; A medida da pena foi determinada sem que venha fundamentada de direito, no que concerne aos limites, mínimo e máximo, em que se baseia, prejudicando, deste modo, a possibilidade de se sindicar se a medida foi equilibrada ou não, contrariando-se, assim o disposto na alínea a), do n.° 1, do artigo 379.° e n.° 2, do artigo 374.°, do CódProc. Penal; O recorrente não pode ser responsabilizado pelo teor dos títulos ou chamadas de capa da revista D……….; A avaliação da conduta do recorrente, sem prejuízo do que se disse quanto ao contexto em que os artigos foram escritos, terá, sempre, de estar balizada na análise e interpretação dos textos da sua autoria publicados na revista D……….; Os textos do recorrente, maxime o publicado na edição de 16 de Agosto de 2003, da revista D………., não revelam a existência de uma relação amorosa entre a assistente o Dr. E………. e por via dos textos do recorrente, jamais existiu na opinião pública a imagem de que o Dr. E………. e a assistente manteriam uma relação amorosa; A única expressão que se encontra nos textos do recorrente hipoteticamente ofensiva da honra e consideração da assistente é a seguinte: "correspondida, entre dois fervorosos católicos" que não tem a virtualidade de adjectivar a assistente com tudo o que no mesmo se diz sobre a pessoa nele visada - o Dr. E……….; O termo "paixão" usado pelo recorrente carece de sustentação factual, quer no texto onde foi inserido quer no contexto em que foi escrito, que permita interpretá-lo no sentido de relação amorosa; a paixão a que alude o recorrente na parte inicial do texto tem o mesmo sentido e âmbito da que vem mencionada na parte final do mesmo, pois só assim faz sentido falar da opção a favor de uma em detrimento da outra; Não houve por parte do recorrente, quando elaborou os seus escritos em apreço, nenhum intuito de difamar a Assistente; Ao considerar que o recorrente com a elaboração e publicação do artigo em discussão nos autos incorreu na prática de um ilícito penal - crime de difamação através da imprensa -, a decisão recorrida violou, ainda, o disposto nos artigos 37.°, n.° 1 e 38.°, n.°s 1 e 2, alínea a), da Constituição da República Portuguesa, que consagram a liberdade de expressão, designadamente a liberdade de expressão através da imprensa, na medida em que esta implica a liberdade de expressão e criação dos jornalistas: O montante da indemnização civil arbitrada pelo tribunal a quo à assistente assenta, sobretudo, em conclusões e pouco em factos concretos dos quais aquelas conclusões poderiam, eventualmente, derivar; Os factos efectivamente provados pela assistente quanto ao pedido civil, atento o disposto no n.° 1, do artigo 496.°, a contrario, do CódCivil, não lhe conferem nenhum direito de indemnização; mas ainda, que se valorassem as alegadas conclusões, a indemnização arbitrada à Assistente é manifestamente exagerada.

3- A assistente C………. apresentou recurso subordinado, em que conclui, em síntese: os factos ilícitos traduziram-se em danos não patrimoniais, inclusive para a saúde da assistente, pelo que a indemnização deve ser fixada em montante não inferior a € 17.500 4- Nesta Relação, o Exmo PGA emitiu douto parecer em que conclui pela improcedência do recurso 5- Foram colhidos os vistos legais e teve lugar a audiência.

+FUNDAMENTAÇÃO Os factos Na 1.ª instância deram-se como provados os seguintes factos: 1. No n° …, datado de 16 de Agosto de 2003, a revista D………., de periodicidade semanal, fez aparecer, em primeira página, uma `caixa' onde se lia: "A revelação de B………." "O Ministro E………. está apaixonado" 2. Dentro, na página 96 que dá guarida à denominada "F………." e a enquadrar uma foto em que aparece o Ministro E……… sorridente, pode ler-se num texto a vermelho: «Paixão - E………. apaixonou-se perdidamente por C………., a jornalista portuense que há um ano nem sequer olhou para trás, quando foi convidada para trocar os estúdios da Rádio G………. no Porto pela assessoria de imprensa do ministro do trabalho. Talvez por ter a cabeça e os sentidos preenchidos com esta paixão, correspondida, entre dois fervorosos católicos, E………. tenha negligenciado uma outra paixão mais antiga - o H……….. . Na sua ausência, o grupo de oposição à dupla de Vs, I………., tem sido liderado pelo antigo jornalista J……….. .».

  1. No exemplar da semana seguinte, no n° … da mesma revista, com data de publicação de 23.08.2003, apareceu na página 96, um texto igualmente vermelho, mas com o título a negro, onde se lia: «Resposta - E………. e C………., adjunta do ministro, tiveram a gentileza de me telefonar para esclarecer que a única paixão que sentem é pelo trabalho que desenvolvem em conjunto no Ministério com o mesmo nome. O marido qe C……….. também trabalha na mesma casa e o ministro, que não cede um milímetro no assunto "L………….", estava em ………., com a família, quando me disse que está com a mulher há 38 anos: "Já levo 7 anos de namoro mais 31 de casamento e fico por aqui" And so do I, como cantava Paulo Gonzo».

  2. Aquela revista, naqueles números, teve uma tiragem de 95.000 exemplares.

  3. Foi o arguido quem elaborou e fez publicar os sobreditos artigos/textos.

  4. Tendo actuado de forma livre, voluntária e consciente. Sabendo que estava dirigir-se a um colectivo de leitores.

  5. Visando fazer referência ao envolvimento amoroso da assistente com o Ministro de que era assessora de Imprensa desde Abril de 2002, assim falseando a verdade.

  6. Bem sabendo de quão ofensivo era para a honra e consideração a imputação daquele comportamento à...

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