Acórdão nº 0647190 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelAIRISA CALDINHO
Data da Resolução11 de Abril de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção Criminal:*I. No processo de instrução n.º …/03.5TAVNF do ..º Juízo de Competência Criminal de Vila Nova de Famalicão, a assistente "Companhia de Seguros X………., S.A.", inconformada com o despacho de fl.s 255- 259 que não pronunciou os arguidos B………. e C………. pela prática de um crime de burla na forma tentada p. e p. pelos art.s 217.º, n.º 1 e 22.º do CP e de um crime de falsificação de documento p. e p. pelos art.s 255.º e 256.º, n.º 1, al. b) do CP, dele interpôs o presente recurso com os fundamentos constantes da respectiva motivação e as seguintes conclusões: - "… 1.º- No que concerne à decisão de não pronúncia dos Arguidos pelo crime de burla, sob a forma tentada, e pelo crime de falsificação de documentos o tribunal a quo limita-se a remeter a fundamentação da decisão recorrida para a motivação alegada pelo Ministério Público no douto despacho de arquivamento, alicerçando-se indevidamente na interpretação extensiva do artigo 307.º n.º 1 do CPP.

  1. Sendo certo que o artº 307º, n.º 1, in fine do CPP, limita expressamente a possibilidade de remissão da fundamentação para o despacho de acusação ou para o requerimento de abertura de instrução.

  2. Fá-lo porque tais peças, ao porem termo ao processo judicial, têm já por lei que conter de forma completa um esclarecimento aos interessados dos concretos fundamentos de facto e de direito que os motivam, nos termos nomeadamente do artigo 283.º, 3 e 287.º, 2 e 283,3, alíneas b) e c) do CPP.

  3. - Pelo que se conclui que a decisão recorrida, no que respeita à fundamentação, encontra-se ferida de nulidade, porquanto baseou-se numa interpretação extensiva do art.º 307º, n.º 1, In fine do CPP que além de não encontrar correspondência na letra e espírito da lei, a viola e contraria; 5.º- Acresce que o despacho recorrido tem a natureza de uma verdadeira sentença, como a define o n.º 1 do art.º 97º do CPP (alínea b)), porque conhece do objecto do processo, decidindo que os arguidos não devem ser responsabilizados criminalmente e põe termo aos autos, pelo que tem que obrigatoriamente especificar os motivos de facto e de direito da decisão (97.º, 4 do CPP), o que não faz.

  4. - Tem pois que se entender que lhe é aplicável o disposto nos artºs 374º e 379º, nº 1, al. a) e nº 2 do CPP, que exigem que a decisão manifeste a respectiva fundamentação, especificando os motivos de facto e de direito que a determinam e o conhecimento do raciocínio lógico desenvolvido pelo Tribunal.

  5. - Viola, pois, a decisão recorrida o disposto nos artigos 97.º do CPP (designadamente no seu n.º 1 alínea b) e n.º 4), bem como o disposto nos artigos 374º e 307, 1 do CPP - neste caso ao dar uma interpretação indevida a esta norma, já que esta tem que ser entendida tal como o seu texto expressa, em como o julgador apenas pode fundamentar a sua decisão por remissão para as razões de facto e de direito enunciadas na acusação ou no requerimento de abertura da instrução (e não já como ali se entende por remissão para o despacho de arquivamento).

  6. - Nos termos do artigo 379º, n.º 1, al. a) e n.º 2 do CPP tem que haver-se tal decisão como nula.

    AINDA 9.º- Mesmo que - o que por mera hipótese de raciocínio se configura - se admita estar fundamentada e ser válido o despacho recorrido - quanto à decisão de não pronúncia do crime de burla que aqui está em causa, cometeu o Tribunal a quo um erro notório na apreciação da prova 10.º- Porquanto embora resulte claro para o tribunal a quo que se encontram preenchidos os elementos típicos do crime de burla na forma tentada, ao dar como indiciada a factualidade constante dos artigos 2 a 12 inclusive do seu requerimento de abertura de instrução, ali se alega que o Arguido B………. desistiu, com a declaração junta aos autos de fls., de prosseguir o iter criminal.

  7. - A deduzir-se que proferirá o entendimento de que o crime de burla não será punível nos termos do artigo 24, 1 do CPP, atenta a aludida desistência, constata-se que a decisão recorrida não atende a que o perito averiguador D………. já tinha apurado a verdade quando procura o Arguido B………. (conforme resulta claro do teor do seu relatório de averiguação de fls. (documento junto com queixa como documento n.º 4): "De diligência em diligência, apurei que o veículo garantido (…) não interveio no sinistro…" e "Face ao que tinha apurado, contactei o n/ cliente, Sr. B………. …" 12.º Só depois de descoberta a verdade é que procurou o Denunciado B………. e o confrontou com a verdade, obtendo a aludida confissão de 06.06.03, constante da sua declaração de fls. (documento junto à denúncia como documento n.º 5), pelo que era irrelevante para a Assistente a sua confissão ou arrependimento.

  8. - Por isso, o Denunciado B………. não teve qualquer margem de escolha entre desistir ou prosseguir com o projecto criminoso.

  9. - Termos em que devem os autos prosseguir contra os Arguidos, com pronúncia destes pelo crime de burla sob a forma tentada p.p no artigo 217.º, n.º 1 e 2 do CP., com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, atentos todos os factos já expostos.

    ACRESCE QUE 15.º- Não esclarece a douta decisão recorrida - e mesmo que se considere que é admissível uma interpretação extensiva do citado normativo (307, 1 do CPP), o que não se concede e por mera hipótese de raciocínio se admite - quais as razões de facto e de direito que lhe permitem concluir no douto despacho recorrido que tal desistência é extensível ao co-arguido C………. .

  10. - É que no douto despacho de arquivamento nada consta quanto à motivação da conclusão de que tal declaração de desistência do arguido B………. é extensível ao Arguido C………. . Ao invés, até ali se invoca um acórdão (Ac. da Relação do Porto de 10.01.01, processo 111037) onde houve declaração de desistência expressa de todos os Arguidos (além de existirem ali apenas meras suspeitas da prática do crime, ao invés do que sucedeu in casu, como se expôs).

  11. - Na realidade, resulta evidente que em momento algum o outro arguido C………. admitiu a verdade verbalmente ou por escrito perante o perito ou tentou fazer algo no sentido de evitar a consumação do crime. Ao invés, faltou a três encontros marcados com o perito (conforme se comprova pelo teor do seu relatório de averiguação de fls. Quando ali dá conta que "…foi marcado um lugar, seguidamente de outros dois lugares para que seja reposta a verdade dos factos. Porém nunca compareceu aos três lugares indicados.").

  12. - Assim sendo, e mesmo que se entenda - o que não se concede e só por mera hipótese de raciocínio se admite - que o Denunciado B………. desistiu de prosseguir com a execução do crime, esta desistência não pode ser "extensível ao seu co-autor", como se alega no douto despacho recorrido.

  13. - É que quanto à alegada desistência, vigora o princípio da pessoalidade da desistência da tentativa (artigo 24, n.º 1 e 25.º do CP). Nos termos do artigo 25.º do CP...

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