Acórdão nº 0646273 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Fevereiro de 2007
Magistrado Responsável | PAULA LEAL DE CARVALHO |
Data da Resolução | 12 de Fevereiro de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…………….. e C………….., patrocinados pelo Ministério Público, intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, contra Companhia D…………., SA e E………….., Ldª pedindo a condenação das RR, ou de qualquer uma delas, a pagarem-lhes: (a) a cada um dos AA., a pensão anual e vitalícia de 171.780$00, com início em 27.01.00, obrigatoriamente remível; (b) a quantia de 510.400$00 a título de despesas de funeral; (c) a quantia de 5.400$00 de despesas de transporte; (d) os juros de ora à taxa legal sobre as quantias pedidas.
Para tanto, alegam m síntese que: no dia 26.01.00 seu filho F………… foi vítima de um acidente, que descrevem, quando trabalhava para a 2ª ré, tendo em consequência do memo sofrido lesões que lhe causaram a morte.
* A Ré seguradora contestou alegando que o acidente se ficou a dever a negligência grosseira do sinistrado e à falta de condições de segurança por parte da Ré entidade patronal, concluindo pela improcedência da acção ou, quando assim se não entenda, pela sua condenação apenas em via subsidiária.
A Ré entidade patronal contestou alegando, em suma, que não violou qualquer regra de segurança, sendo que a Ré Seguradora é a única responsável pela reparação do acidente por força do contrato de seguro que com ela celebrou.
* Proferido despacho saneador, foi elaborada especificação e questionário.
* Procedeu-se a julgamento, com gravação da prova, respondeu-se à matéria do questionário e foi proferida sentença que condenou: (a) a ré, entidade patronal, a pagar aos AA. a pensão global, anual e vitalícia, de €5.604,28, com início em 27.01.00, a ratear entre os dois beneficiários legais, cabendo assim a cada um deles a quantia de €2.802,14, acrescida de subsídio de férias e subsídio de natal, no valor de 1/14 cada; (b) A Ré Seguradora, subsidiariamente, a pagar a cada um dos AA. a pensão de €560,43; (c) A Ré entidade patronal e, subsidiariamente, a Ré Seguradora, a pagarem aos AA. a quantia de €2.545,86 de despesas de funeral, €26,94 de despesas de transporte e os juros sobre as quantias em dívida, á taxa legal.
* A Seguradora veio arguir a nulidade de tal sentença e interpor recurso, na sequência do que, esta Relação, por Acórdão de 07.07.05 (cfr. fls. 492 e segs. dos autos), decidiu anular o julgamento e actos posteriores, incluindo a sentença, mais ordenando ao tribunal a quo que formulasse quesitos adicionais nos termos nela sugeridos, procedesse a julgamento quanto a essa matéria e, a final, proferisse sentença, sem prejuízo de poder alargar o julgamento a outros artigos da base instrutória, e tão somente para evitar contradições.
* Após baixa dos autos à 1ª instância e em cumprimento do ordenado no mencionado Acórdão, foram aditados à base instrutória os quesitos mencionados no despacho de fl. 506, tendo-se ainda determinado a exclusão da al. O) da matéria de facto assente dos factos referidos no sobredito acórdão, bem como do anterior quesito 7º .
Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, respondeu-se à matéria aditada à base instrutória, que não foi objecto de reclamações e proferiu-se sentença que condenou: I - A co-R. E………., LDª a pagar aos AA.: a pensão global, anual e vitalícia de € 5 712,10, com em início em 27 de Janeiro de 2000, a ratear entre os 2 beneficiários legais, cabendo, assim, a cada um deles a quantia de € 2.856,05, acrescida de subsídio de férias e subsídio de Natal, no valor de 1/14 cada, pensão essa que foi actualizada até 01.12.05, inclusive; II -A co-R. D………., subsidiariamente, a pagar a cada um deles a pensão de € 565,97; III - A co-R. empregadora e, subsidiariamente, a co- R. Seguradora a pagarem aos AA.: € 2.545,86 de despesas de funeral; € 26, 94, a título de despesas com transportes e juros sobre todas as quantias em dívida, à taxa legal.
* Inconformadas, vieram as RR. apelar da referida sentença, pretendendo a revogação da decisão recorrida e alegando nas respectivas conclusões que: I - A Ré Entidade Patronal: «PRIMEIRA É manifesto que a decisão recorrida faz uma errada apreciação da matéria de facto e consequente interpretação das normas aplicadas. Com efeito, não obstante a invocada falta de condições de segurança, tal não é suficiente para afastar a culpa exclusiva do sinistrado na produção do acidente.
SEGUNDA Na verdade, atendendo aos factos dados como provados, nomeadamente nos pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 16 e 17 e aos depoimentos prestados pela 1ª e 2ª, há que concluir, e deveria ter ficado como provado, que o sinistrado teve um comportamento censurável, indesculpável, temerário e inútil, exclusivamente imputável a este, que resultou no referido acidente.
TERCEIRA Ou seja, não foi o facto de a pinha dentada e a corrente da cremalheira não terem protecção que originou o acidente dos autos, mas antes o comportamento indesculpável do sinistrado. O que denota uma negligência grosseira por parte deste. Negligência esta que tem de ser apreciada não à luz da falta de condições de segurança mas em relação ao comportamento adoptado pelo sinistrado, que agiu com total menosprezo pela falta de condições de segurança e total desrespeito por toda a experiência profissional adquirida.
QUARTA De acordo com o disposto no artigo 7º, alínea b), da Lei n.º 100/97, não há direito a reparação quando o acidente provier exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado.
QUINTA Por tudo isto, é manifesto que a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 7º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 100/97, na medida em que faz uma errada interpretação e aplicação desta norma, devido a uma errada apreciação da matéria de facto.».
II - A Ré Seguradora: A. - A questão que se coloca à apreciação deste Venerando Tribunal é a de saber se o acidente ocorreu por negligência grosseira do sinistrado, situação integradora de descaracterização do acidente - cfr. art.7, n.º1, al. b), da Lei n.º100/97, de 13 de Setembro.
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- Relativamente a esta hipótese, descaracterização do acidente, na vertente supra referida, é indúbio que o comportamento do sinistrado integra inequivocamente o conceito de negligência grosseira, constante da citada disposição legal, porquanto o assumiu, voluntária, conscientemente e sem qualquer justificação, um comportamento temerário, desafiando o perigo sem que nenhuma razão existisse para tanto, não havendo, por isso, lugar a reparação.
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- O sinistrado conhecia perfeitamente o estado da máquina onde ocorreu o acidente, e por conseguinte, a inexistência de qualquer dispositivo de protecção da pinha dentada e da corrente da cremalheira e, ainda assim, de forma voluntária e sem qualquer causa justificativa, decidiu debruçar-se e estender-se sobre a mesa da máquina para apanhar a fita métrica que estava, precisamente, em cima da corrente da cremalheira, quase no lado, oposto ao seu, originando assim que a pinha dentada lhe apanhasse a roupa, arrastando-o para a morte.
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- Assim, o sinistrado, não obstante ter perfeito conhecimento da falta de condições de segurança da máquina, designadamente no que concerne à inexistência de qualquer dispositivo de segurança de protecção dos seus elementos mecânicos, repudiou por completo tal situação e, consequentemente, adoptou o...
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