Acórdão nº 0612342 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelFERREIRA DA COSTA
Data da Resolução08 de Janeiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B………. intentou acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra C………., pedindo que se condene a R. a pagar ao A. a quantia de € 2.880,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação, sendo € 2.400,00 respeitante à retribuição dos meses de Janeiro a Junho, todos de 2003 e € 480,00 relativa a férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal equivalentes.

Alega, em síntese, que o A. foi admitido ao serviço da R., mediante contrato de trabalho verbal, para exercer subordinadamente a actividade de jogador da equipa profissional de futebol deste, desde Agosto de 2002 até 2003-06-30, mediante a retribuição mensal de € 400,00, sendo certo que não lhe foram pagas as quantias ora pedidas.

Contestou a R., por excepção, alegando em síntese que a sua equipa de futebol é amadora e que o A. manteve com ela um contrato de prestação de serviços e, quanto ao mais, contestou por impugnação, para além de pedir a condenação do A. como litigante de má fé.

O A. respondeu à contestação, a qual não foi admitida pelo despacho de fls. 59, com fundamento em que o valor da acção está contido na alçada do Tribunal de 1.ª instância.

Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal e foi decidida a matéria de facto, sem qualquer reclamação.

Proferida sentença, foi julgada a acção parcialmente procedente e a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 2.400,00, a título de remuneração e de férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal proporcionais, acrescida de juros de mora.

Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpor recurso de apelação, pedindo que se revogue a sentença.

Pelo Acórdão desta Relação de 2005-02-14 foi decidido anular o julgamento relativamente aos factos assentes sob os n.ºs 3, in fine, 4 e 11, in fine, todos da respectiva lista e também para se consignar os factos não provados sendo certo que, conforme se refere a fls. 163, do mesmo aresto, "…após a audição da cassete contendo os depoimentos gravados, conclui-se que a matéria de facto dada como provada não merece qualquer reparo, a não ser no que a seguir se vai expor.", que foi a anulação do julgamento relativamente àqueles 3 pontos de facto: 3, 4 e 11.

Convidado a completar a petição inicial, o A. apresentou novo articulado, tendo a R. apresentado a sua contestação.

Procedeu-se a novo julgamento com gravação da prova pessoal[1] e foi decidida a matéria de facto, sem qualquer reclamação.

Proferida sentença, foi julgada a acção parcialmente procedente e a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 2.400,00, a título de remuneração e de férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal proporcionais, acrescida de juros de mora.

Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpor recurso de apelação, pedindo que se revogue a sentença e que se a substitua por decisão que a absolva do pedido, tendo formulado a final as seguintes conclusões: 1ªÉ entendimento do Recorrente, conforme supra alegado, com referência aos concretos meios de prova que impunham decisão diversa, devidamente transcritos, que houve factos incorrectamente julgados, que foram dados como provados, quando na realidade se impunha a decisão oposta.

2ªDeve ser dado como não provado que o A. tenha estado "(...) com a obrigação de obediência às ordens da equipa técnica, designadamente quanto à posição a ocupar no campo e forma de treinar (...)", já que nenhuma testemunha se referiu a factos donde derivasse a efectivação de tal direcção e ordens sobre o A.

3ªQuanto ao "(...) treinar; e no horário das 20:00H às 21:30h. pela Ré determinado e fixado. Às 20:00H tinham que estar nos balneários para se equiparem e para uma "palestra" proferida pelo treinador, iniciando-se o treino propriamente dito cerca das 8:30h" e especialmente quanto à hora de término do treino, à qual apenas uma testemunha se referiu, é incorrecto dá-lo como provado.

4ªPorquanto todas as testemunhas vacilaram entre "oito, oito e meia", "mais quarto de hora, menos quarto de hora", "não tenho a certeza" (!), o que é mais compatível com a realidade articulada pelo R.: "(...) os "treinos" não tinham hora inflexível de início e término aliás, bem pelo contrário, tanto começavam a uma hora como a outra, o que é, feliz ou infelizmente, sinal do amadorismo das partes".

5ªQuanto ao "poder de acção disciplinar do R.", nada se referiu em audiência que implicasse o A. - se bem que na primeira audiência, anulada parcialmente, tenha sido dito que ele era assíduo e bem comportado, o que é incompatível com a aplicação de multas!6ªHouve sim afirmações genéricas, e referências a supostas experiências pessoais das testemunhas que estas nem sequer bem contextualizaram e/ou confirmaram: ou não sabiam o valor, ou nunca pagaram.. e era descontado no "ordenado", mas afinal já era pago para uma "caixinha" que ninguém viu! E isto não é um jogo ou "joguinho", é um julgamento!7ªMais, "faltas aos treinos", "agressões" em campo, ninguém tampouco referiu, pelo que é impossível incluí-Ias no acervo de factos provados.

8ªPor outro lado, ninguém sabe se o A. sofreu alguma vez uma multa, porque ninguém falou dele (nem disso) em audiência... e é a sua relação com o R. que está em causa!9ªMal também quanto a dar como provado que "Os jogadores convocados estavam obrigados por determinação da ré, no dia anterior ao jogo, a recolher às suas residências até 24:00H", desde logo porque ninguém falou em "24:00h", mas apenas - e uma única testemunha! - a «Onze... onze e meia... mais ou menos.»10ªDisseram as testemunhas que num plantel de «Vinte e muitos» jogadores, «eram dezasseis, se dezassete jogadores» convocados para jogos e «A direcção e também os treinadores» faziam "ronda" em dezasseis casas e localidades diferentes, exactamente!... ou então que isso acontecia, mas pelos vistos nunca aconteceu! ou então que ligavam (para o telemóvel, para ver se os jogadores estavam em casa!?), mas nunca ligaram! Será um jogo? Não, são confusões e contradições, donde, é impossível dá-lo como provado! Certo é (e seria dá-lo como provado), perante isto, que "O R. não sabe nem tinha maneira de saber a que horas recolhia o A., nem lhe impunha nada neste domínio."11ªImpunha-se dar como não provado que "como contrapartida foi convencionado o pagamento da quantia mensal líquida de € 400,00, a que acresciam prémios de jogo, dependentes dos resultados", uma vez que nenhum depoimento revelou conhecimento sobre o quantitativo atribuído pelo Recorrente ao Recorrido - o qual, por dizer consistir em ressarcimento de despesas, compensações por remunerações perdidas, etc., não era aliás nem mensal nem fixo.

12ªBem assim, não deveria ter sido dado como provado que "o jogador recebeu as quantias correspondentes aos meses de Agosto a Dezembro", por inexistir prova bastante para tal: a testemunhal é, neste ponto, inconclusiva, e a documental não corresponde a toda a faixa de tempo em que o A. diz ter recebido uma quantia fixa mensal, apesar de vários testemunhos afiançarem que, nesse período, os pagamentos eram sempre feitos em cheque.

13ªA douta sentença proferida manifesta grande falta de "sensibilidade desportiva", no sentido em que adoptou, em grande parte, soluções do direito laboral comum, ou partiu da utilização dos seus quadros mentais, tendo-se furtado a buscar soluções jurídicas adequadas à realidade desportiva amadora, resultando numa solução completamente desfasada das necessidades dessa realidade.

14ªPor ser patente a complexidade das questões de direito e o manancial de regras de que o intérprete deste campo do Direito pode lançar mão, é que as recorrentes referências, constantes da sentença em crise, à LCT e ao DL 64-A/89, são incompreensíveis.

15ªO Clube R., ora recorrente, é uma instituição de utilidade pública, sem intuitos lucrativos, que tem por ideal o fomento da sã prática desportiva desde as camadas mais jovens, sendo que no seu seio se joga futebol a título eminentemente lúdico e, ainda - ou pelo menos assim se esperava -...

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