Acórdão nº 0554217 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Novembro de 2006
Magistrado Responsável | ANABELA LUNA DE CARVALHO |
Data da Resolução | 29 de Novembro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acórdão no Tribunal da Relação do Porto: IO MUNICÍPIO DE ………., representado pelo Presidente do seu órgão executivo, a Câmara Municipal de ………., veio intentar acção declarativa de simples apreciação e condenação, sob a forma de processo ordinário, contra B………., LDA, com sede no ………., freguesia de ………., do Concelho de Felgueiras, alegando em resumo que: O A. é dono de um prédio constituído por terreno para construção, que confronta de nascente com a Ré, sendo o mesmo prédio ocupado por esta, sem qualquer título para o efeito.
Por sua vez, as confrontações do prédio da Ré constantes da descrição de Registo Predial encontram-se erradamente efectuadas, pois que incluem o prédio ora reivindicado pelo Autor.
Essa ocupação e uso pela Ré causa prejuízos a este, cuja indemnização ainda não é possível quantificar.
Termina, pedindo que seja reconhecido e declarado o direito de propriedade do Autor sobre o seu articulado prédio; que a ocupação ilícita da Ré causou prejuízos ao Autor e, seja a Ré condenada a reconhecer esse direito de propriedade, a reconhecer que é ilegal a ocupação do prédio do Autor, devendo o mesmo ser restituído livre de pessoas e bens, bem como a respeitar o direito de propriedade do A. sobre o seu prédio, abstendo-se de o prejudicar, não praticando quaisquer actos que estorvem, impeça ou dificulte o exercício do mesmo direito; Pede ainda, a condenação da Ré a indemnizar o A. dos prejuízos causados e que venha a causar provindos da ocupação e que se vierem a liquidar em execução de sentença, por agora não serem liquidáveis.
E, que seja ordenado o cancelamento na Conservatória do Registo Predial de Amarante de todos e quaisquer registos que a Ré tenha feito a seu favor sobre o mesmo prédio, bem como todos os registos que posteriormente venham a ser feitos quanto ao aludido prédio, designadamente quanto à inscrição G-3 da descrição 00629/030492, na parte que inclua o prédio do Autor.
Contestou a Ré defendendo que o terreno reivindicado só agora na presente acção vem classificado pelo Autor como terreno para construção, o que nunca aconteceu antes no processo de desafectação para domínio público, sendo que o mesmo, na realidade não tem qualquer aptidão para construção.
Trata-se de um terreno de suporte da plataforma da ex-estrada nacional, fazendo, por conseguinte, parte da "zona de estrada".
Em reconvenção alegou a Ré que, a C………., Lda, que antecedeu a Ré na utilização do terreno em causa, apresentou à Câmara Municipal de ………. um pedido de licenciamento de um posto de combustíveis, no prolongamento do qual ocupava o talude em causa, pedido esse que foi deferido. Mais tarde, em 16 de Dezembro de 1994, o Município emitiu um alvará de utilização. Com base nesse alvará, bem como por autorização expressa da Autora, na sequência do processo de licenciamento, aquela sociedade passou a ocupar o terreno.
Quatro anos volvidos, o valor do prédio é muito superior por força das obras realizadas pela referida C………., Lda, tendo passado de Esc. 400.000$00 para o valor aproximado de Esc. 1.000.00000.
Assim sempre terá ou poderá adquirir a propriedade do talude, hoje o prédio identificado no artigo 2º da petição inicial, por acessão industrial imobiliária, mediante o pagamento daquele valor.
Pede, em consequência, que a acção seja julgada improcedente e não provada e, procedente e provada a reconvenção, e a Ré declarada proprietária, por acessão industrial imobiliária do prédio identificado no artº 2º da p.i. mediante o pagamento da quantia de 400.000$00.
Replicou o Autor, pugnando pela improcedência da reconvenção, concluindo como na petição.
Foi proferido despacho saneador no qual se julgou manifestamente improcedente a reconvenção, fixando-se a matéria assente e a base instrutória restrita à factualidade alegada na acção.
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1. Da improcedência da Reconvenção veio a Ré interpor recurso, a subir a final.
Em tais alegações de recurso, conclui que: 1 - O despacho saneador sustenta que no caso dos autos não se verificam os requisitos da aquisição da propriedade por acessão industrial imobiliária; 2 - Antes de mais, porque se estaria perante benfeitorias, e depois porque o autor da incorporação não seria a Ré mas um terceiro; 3 - Contudo, em face do actual Código Civil, entende-se que a benfeitoria consiste num melhoramento feito por quem está ligado à coisa em consequência de uma relação ou vínculo jurídico, ao passo que a acessão é um fenómeno que vem do exterior, de um estranho, de uma pessoa que não tem contacto jurídico com ela; 4 - As benfeitorias e a acessão constituem fenómenos paralelos que se distinguem pela existência ou inexistência de uma relação jurídica que vincule à pessoa a coisa beneficiada, e as benfeitorias, estando dependentes de uma relação jurídica (posse, locação, comodato, usufruto) assumem o carácter de excepcionais em relação à acessão que seria a regra; 5 - Ora, antes do início da obra o autor da incorporação ou obra não tinha qualquer vínculo jurídico com o prédio da Autora, tão pouco sendo seu possuidor, apenas passando a deter o prédio a partir do momento em que começou a obra; 6 - A autorização do Município foi precisamente para efectuar a obra, assim estabelecendo a boa fé do autor da obra e nada mais, pelo que muito menos qualquer vínculo jurídico anterior à efectivação da incorporação.
7 - Em todo o caso, com a obra efectuada, a coisa deixou de ser um mero talude de estrada para passar a ser uma parcela de terreno que a Autora, inclusivamente, alega ser destinado a construção, ou seja: com a obra efectuada, passou de terreno de suporte de estrada para parcela de terreno que, na versão da Autora, até se destinará a construção, 8 - Houve, pois, uma clara e evidente alteração da substância da coisa; 9 - Por outro lado, foi alegado que a autora da incorporação foi a sociedade "C………., Lda" (artº 25º da contestação/reconvenção) e que esta transmitiu a sua posição contratual à Ré (artº 27º do mesmo articulado) comprovado pelo doc. nº 4 junto com a petição inicial; 10 - E assim sendo, transmitiu-se à Ré todos os direitos que a referida C………., Lda detinha, nomeadamente o da acessão; 11 - Violou o douto despacho saneador o disposto no artº 1340º do C.Civil.
Termina pedindo seja revogada a decisão recorrida.
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2. Em contra-alegações, veio a Autora concluir que: 1- A Ré não articula factos respeitantes quer a construção de obra por ela realizada no prédio da A; 2 - Aquilo que a Ré alega que a C………., Lda fez no prédio da A. como apenas à C………., Lda assistia a faculdade de judicialmente a solicitar; 3 - O nivelamento do terreno que a C………., Lda tenha efectuado não integra o conceito de obra, sementeira ou plantação, requisitos indispensáveis para fundamentar a aquisição por acessão industrial.
4 - Não se verifica o elemento essencial de boa fé; 5 - Quando muito as despesas com o nivelamento do terreno poderão ser consideradas benfeitorias.
6 - Não foram articulados factos que conduzam ao valor do prédio antes da incorporação, nem factos que mostrem o valor que as obras transmitiram à totalidade do prédio; Pede, assim que seja negado provimento ao recurso e confirmada a decisão recorrida.
Prosseguindo os autos, teve lugar a audiência de julgamento e veio a ser proferida sentença, na qual se julgou a acção parcialmente procedente, reconhecendo-se e declarando-se: o direito de propriedade do Autor sobre o seu articulado prédio; que com a ocupação sucessiva que a Ré faz do prédio da Autora desde a data da compra do seu prédio, causou prejuízos ao Autor. Mais se condenou a Ré a: reconhecer esse direito de propriedade do Autor; a indemnizar o Autor dos prejuízos causados e a causar pela ocupação supra referida e que se vierem a liquidar em execução de sentença.
Finalmente ordenou a sentença o cancelamento na Conservatória do Registo Predial de Amarante de todos e quaisquer registos que a Ré tenha feito a seu favor sobre o mesmo prédio, designadamente quanto à inscrição G-3 da descrição 00629/030492, na parte que inclua o prédio acima identificado.
Absolveu-se a Ré do demais pedido, ou seja, do pedido de...
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