Acórdão nº 2410/06.0TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelSILVA FREITAS
Data da Resolução26 de Junho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra A... Companhia de Seguros, S.A.

, com sede na Avenida..... Lisboa, propôs acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumaríssimo, contra B...

, sociedade por quotas, com sede em ....... Castelo de Paiva, e C....

, casado, trolha, residente em ..... Marco de Canavezes, com os seguintes fundamentos: No exercício da sua actividade seguradora, a Autora celebrou com a 1.ª R. um contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho, titulado pela apólice n.º 291219523, mediante o qual foi transferida para a A. a responsabilidade infortunística dos trabalhadores ao serviço da 1.ª Ré.

E, tal como estava legal e contratualmente obrigada, a ora 1.ª Ré participou oportunamente à Autora um acidente de trabalho ocorrido no dia 16 de Março de 2004, pelas 15h10m, numa sua obra situada na localidade de Galifões, do Concelho e Comarca de Viseu, com o seu trabalhador C....

De acordo com a referida participação, o identificado trabalhador encontrava-se em cima de um andaime a fixar uma régua junto ao beiral da varanda quando se desequilibrou e caiu ao solo.

Como consequência directa e necessária de tal queda o referido trabalhador fracturou várias costelas do lado direito, o que determinou a sua incapacidade para o trabalho.

Recepcionada tal participação, a Autora aceitou de boa-fé o seu conteúdo e, prontamente prodigalizou ao ora 2º Réu todos os tratamentos necessários à sua recuperação, bem como as demais prestações legais devidas em consequência da sua incapacidade parcial temporária para o trabalho.

Assim, ao abrigo e no estrito cumprimento do referido contrato de seguro, a Autora liquidou ao 2º Réu e às entidades hospitalares e médicas que lhe prestaram assistência a quantia total de € 2.184,20.

Sucede que, no decurso das averiguações entretanto encetadas e dos pagamentos efectuados, veio a Autora a constatar que o referido trabalhador, apesar de ser trabalhador da 1ª Ré desde 1 de Julho de 2003, de forma ininterrupta, não constava nas folhas de férias enviadas à Seguradora.

Acresce que, a ora 1ª Ré ao ter declarado expressamente à Autora que o referido funcionário apenas havia sido admitido ao seu serviço em 1 de Março de 2004 – o que não corresponde à verdade, atento o alegado no art. 9º – prestou intencionalmente falsas declarações com o único intuito de prejudicar a ora Autora – o que, efectivamente, veio a suceder.

Resulta, assim, do exposto que a Autora pagou indevidamente assistindo-lhe, consequentemente, ao abrigo do preceituado no artigo 476.º, do Código Civil, o direito de ser reembolsado dos montantes despendidos.

Pelo pagamento de tal quantia é responsável o ora 1º Réu, na qualidade de entidade patronal do sinistrado, pelo facto de ter intencional e reflectidamente prestado falsas declarações com o único intuito de obter para si um enriquecimento ilegítimo à custa da ora Autora.

O 2º Réu é solidariamente responsável pelo pagamento de tal quantia porquanto foi ele quem efectivamente recebeu indevidamente tal quantia incumbindo-lhe, consequentemente, o dever de a restituir.

Os Réus são, assim, devedores à Autora da quantia de € 2.184,20 à qual acrescem juros de mora vencidos desde a citação dos RR. até efectivo e integral pagamento.

Concluindo a petição inicial, a Autora pediu que os Réus fossem solidariamente condenados a pagar à Autora a quantia de € 2.184,20 acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação dos RR. e até efectivo e integral pagamento.

**** Os Réus apresentaram contestação em que disseram, nomeadamente: O 2º Réu trabalhou durante algum tempo para uma firma em nome individual do Sr.

D...

, que por coincidência é sócio gerente da sociedade B..., certo é que à data do acidente era e é trabalhador da 1ª Ré.

Assim, era frequente que trabalhadores da firma em nome individual do Sr. D... trabalhassem em obras da sociedade, ora aqui 1ª Ré.

O 2º Réu nunca poderia constar da folha de férias da 1ª Ré, pura e simplesmente porque não era seu trabalhador.

Certo é que por questões de logística e necessidade técnica, a 1ª Ré admitiu em 1 de Março de 2004 o 2º Réu ao seu serviço, não prestando assim qualquer tipo de falsas declarações à Autora.

Sendo, aliás, esta é que intencionalmente criou um facto virtual no sentido de se eximir às suas verdadeiras e reais responsabilidades, não tendo participado ao Tribunal do Trabalho competente o acidente, refugiando-se no facto de os seus serviços clínicos terem dado alta ao sinistrado no prazo dos 3 meses após a data do acidente, pese embora este não ter atingido o estado de cura clínica.

Tudo o que a Autora até agora pagou, fê-lo de acordo com as reais obrigações contratuais, ao abrigo da apólice de seguro de acidentes de trabalho.

A Autora olvida que o contrato de seguro é sempre regido pelo princípio da boa fé, e pretende agora colocar esse princípio em causa, quando bem sabe que as folhas de férias para efeitos do cálculo do prémio de seguro só são recepcionadas pelas seguradoras no dia 15 do mês seguinte ao processamento dos salários.

Os Réus concluíram a contestação pedindo que a presente acção fosse julgada totalmente improcedente, por não provada, com todas as consequências legais.

**** A Meritíssima Juiz proferiu um despacho a determinar a notificação das partes para se pronunciarem, querendo, sobre a questão da competência material do Tribunal, questão que suscitou oficiosamente, em face da causa de pedir na acção.

**** Apenas a Autora veio pronunciar-se, o que fez nos seguintes termos: 1. Tem sido entendimento doutrinal uniforme que a competência material do Tribunal em razão da matéria se afere pela análise da estrutura da relação jurídica material em causa segundo a versão apresentada em juízo pelo Autor.

  1. Ora, o direito que a Autora se arroga na presente acção é um direito de reembolso relativamente a quantias por si indevidamente pagas.

  2. Funda-se, assim, a presente acção no instituto civilístico do enriquecimento sem causa.

  3. A procedência da presente acção depende apenas da verificação cumulativa dos pressupostos da obrigação de indemnizar previstos nos artigos 473º e 483º do Código Civil.

  4. Para que fosse competente o Tribunal de Trabalho necessário se tornaria que se discutisse nos presentes autos qualquer questão emergente de acidente de trabalho – questões estas taxativamente elencadas na lei.

    A alusão ao acidente de trabalho é um facto meramente instrumental nos presentes autos.

    Inexistindo qualquer questão emergente de acidente de trabalho, prévia ou principal, que importe conhecer.

    Pelo que, deveria concluir-se pela competência material do Tribunal.

    **** Foi proferida decisão a declarar o Tribunal incompetente em razão da matéria para julgar o presente litígio, e, em consequência, absolveram-se os Réus da instância, com custas pela Autora.

    **** Notificada da decisão, a Autora interpôs recurso.

    **** Por despacho proferido a fls. 65 dos autos, o recurso foi devidamente admitido como recurso de agravo, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

    **** Em doutas alegações que apresentou, a recorrente formulou as seguintes Conclusões: 1. Na presente acção a Autora arroga-se o direito de ser reembolsada pelos Réus da quantia por...

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