Acórdão nº 686/03.4TBTNV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelJAIME FERREIRA
Data da Resolução26 de Junho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I No Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas, foi instaurado pelo Município de Torres Novas contra A...

e mulher B...

, residentes na Rua ......, em Torres Novas, o presente processo de expropriação por utilidade pública, nos termos do artº 51º do Código de Expropriações, relativo à expropriação, por utilidade pública e com carácter de urgência, de uma parcela de terreno com a área de 900,60 m2, a destacar do prédio misto sito na freguesia de S. Pedro, em Torres Novas, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 32, secção H, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Novas sob o nº 25528, a fls. 162 do livro B/64, com vista à realização da via circular interior de Torres Novas – troço entre a Av. Dr. João Martins de Azevedo e o Largo General Humberto Delgado.

A declaração de expropriação respectiva foi publicada nos D. R. – II série, nºs 138, de 18/06/2002 (relativa a uma parcela de terreno com a área de 38,44 m2), e 252, de 31/10/2002 (relativa a uma parcela de terreno com a área de 862,14 m2).

Encontra-se depositada na C. G. D., à ordem dos presentes autos, a quantia de € 38.820,00 , correspondente ao valor da indemnização fixada em auto de avaliação a que se procedeu na fase administrativa – fls. 151 e 209.

Por despacho judicial de fls. 222, foi adjudicada a propriedade da referida parcela à entidade expropriante.

II Do dito laudo de avaliação interpuseram recurso a Expropriante e os Expropriados, nos termos do artº 52º do Código das Expropriações (aprovado pela Lei nº 168/99, de 18/09), recursos que foram admitidos em 1ª instância – fls. 257 e 272.

No decurso da tramitação destes recursos procedeu-se à avaliação da referida parcela por peritos, os quais apresentaram o relatório de fls. 320 a 329.

Depois dessa avaliação teve lugar a realização da audiência de discussão e julgamento, com inquirição de testemunhas, posto que foi proferida sentença, na qual foi fixado o montante indemnizatório a ser pago aos Expropriados em € 36.399,70 – fls. 416 e segs.

III Desta sentença interpuseram recurso os Expropriados, recurso que foi admitido como apelação e com efeito meramente devolutivo.

Este recurso foi objecto de anterior acórdão desta Relação, conforme fls. 514 e segs., no qual foi decidido anular o laudo pericial constante de fls. 320 e segs., assim como todos os actos processuais subsequentes, designadamente a referida sentença de 1ª instância, com vista a proceder-se a uma nova avaliação.

Na sequência desse acórdão teve lugar uma nova avaliação pericial, conforme fls. 551 a 557 e 568 a 576, e bem assim uma inspecção judicial ao local, conforme auto de fls. 583.

Proferida nova sentença em 1ª instância sobre o mérito da causa, nela foi decidido fixar o valor da indemnização a atribuir aos Expropriados em € 36.899,70 , montante este a ser actualizado à data da decisão final, de acordo com a evolução de preços no consumidor e desde a data em que foi proferida a declaração de utilidade pública, conforme fls. 589 a 611.

IV Desta sentença voltaram a recorrer os Expropriados – fls. 616 -, recurso admitido como apelação e com efeito meramente devolutivo – fls. 621.

Nas alegações que apresentaram os Apelantes concluíram do seguinte modo: 1ª - Ao contrário do afirmado na sentença recorrida, os Recorrentes não peticionaram qualquer indemnização pelos danos não patrimoniais por si sofridos, mas sim pela depreciação da parte não expropriada, em virtude da divisão do prédio, resultante da expropriação, de acordo com o previsto no artº 23º, nº 1, do Código das Expropriações.

  1. - Ao não ponderar o pedido dos Expropriados, a sentença recorrida deixou de se pronunciar sobre questão que deveria apreciar, sendo nula por força do disposto no artº 668º, nº 1, al. d), CPC.

  2. - A sentença recorrida pôs em causa a parcialidade do perito designado pelos Expropriados e não ponderou o relatório por ele elaborado, sem qualquer fundamento.

  3. - A sentença recorrida utiliza o conceito de fraccionamento administrativo, como se se tratasse de uma figura jurídica autónoma. Porém, não esclarece o respectivo significado e nem as suas consequências, Tal conceito é ignorado pelos Recorrentes, que o não encontram na lei e nem na jurisprudência ou na dogmática, pelo que é ininteligível a sentença.

  4. - A conclusão contida na sentença, segundo a qual “os gases provenientes da circulação rodoviária dos veículos que transitam pelo viaduto são anulados e arrastados pela acção do arejamento e dos ventos, atenta a altura do mesmo”, que é apenas de 6 metros em média, é desprovida de qualquer fundamento e unanimemente desmentida pelos estudos científicos e ambientais, e, ainda, pelas decisões de tribunais superiores e pela legislação nacional e comunitária vigente.

  5. - Existe errado julgamento dos factos não provados com os nºs 2, 3, 4 e 5 que, como factos notórios que são, não carecem de alegação ou prova, nos termos do artº 514º CPC, pelo que deverão constar como factos provados.

  6. - Ao ignorar a indemnização concedida pela entidade expropriante relativamente ao prédio situado frente ao dos expropriados, adquirido por via de direito privado, a sentença recorrida fez uma interpretação e aplicação inconstitucional do artº 26º C. das Expropriações, por violação dos artºs 13º e 69º da Constituição.

  7. - O nº 3 do artº 25º do C. Exprop. impõe um requisito para aplicação do critério previsto no nº 2 da mesma norma, cujo preenchimento não se presume e não se verifica no caso dos autos. Ocorreu, pois, errada interpretação e aplicação da Lei.

  8. - Ao caso presente não podia a sentença ter deixado de aplicar os nºs 5 e segs. do artº 25º do C. Exprop. Não o tendo feito, violou o nº 4 do mesmo preceito.

  9. - A percentagem de 10% fixada na sentença é arbitrária. E pretende-se fazê-la incidir sobre um valor ilegal, que não obedece aos pressupostos legais.

  10. - A indemnização de € 500,00 relativa à desvalorização da parte sobrante do prédio é ilegal, por violar os princípios da proporcionalidade e da igualdade e afrontar o sentido de justiça e equidade, em face dos prejuízos comprovadamente causados à parte não expropriada do imóvel pela expropriação.

  11. - Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso.

V Não foram apresentadas contra-alegações por parte da Expropriante.

Nesta Relação foi aceite este novo recurso de apelação e tal como foi admitido em 1ª instância, tendo-se procedido à recolha dos necessários “vistos” legais, pelo que nada obsta a que se conheça do seu objecto.

E este objecto, dadas as conclusões constantes das alegações de recurso e supra referidas, pode resumir-se à apreciação das seguintes questões: A – Nulidade da sentença recorrida, ao abrigo do artº 668º, nº 1, al. d), do CPC.

B – Alteração da matéria de facto dada como assente na sentença recorrida.

C – Reapreciação dos critérios de avaliação da parcela expropriada.

D – Reapreciação do eventual direito dos Expropriados a receberem indemnização pela depreciação da parte sobrante do prédio.

Apreciando, cumpre fazer notar que não está em causa, no presente recurso, o direito à justa indemnização que os Expropriados e Recorrentes têm, em resultado da expropriação de parte de um seu prédio (a parcela expropriada), pelo que nos abstemos de fazer qualquer referência a tal direito positivo, o que se acha abundante e conceptualmente feito nas duas sentença já proferidas em 1ª instância, até mesmo em função do disposto no artº 62º, nº 2, da Constituição Portuguesa.

Apenas estão em causa neste recurso questões atinentes à quantificação desse direito, o que cumpre tratar (e segundo as regras do Código de Expropriação aprovado pela Lei nº 168/99, de 18/09, que era o que vigorava à data da declaração de utilidade pública), além de questões de natureza adjectiva ou processual, conforme supra se deixou enunciado. Começando a nossa apreciação pela primeira das sobreditas questões, argumentam os Expropriados, muito em resumo, que a sentença recorrida não podia ter deixado de apreciar o pedido de indemnização pela perda de valor de mercado da parte sobrante do prédio expropriado, onde se insere a sua casa de habitação, omissão esta que se traduz numa nulidade, conforme disposto no artº 668º, nº 1, al. d), do CPC.

Mas, com o devido respeito por tal alegação, para que tal vício formal da sentença tivesse lugar era necessário que não tivesse havido qualquer pronúncia sobre tal questão, isto é, que na sentença recorrida nem sequer tivesse sido abordada tal aspecto do invocado direito dos Expropriados, uma vez que no recurso que oportunamente interpuseram da decisão arbitral proferida na fase administrativa do processo, por eles foi expressamente pedida a atribuição de indemnização pela depreciação da parte no prédio não expropriada, conforme resulta do ponto III dessas alegações – fls. 238 a 240 -, cujo valor então reclamado, para este efeito, foi de € 449.036,00 .

Ora, na sentença de 1ª instância agora sob recurso – proferida a fls. 589 e segs. -, tal questão foi expressamente apreciada, conforme fls. 596, 597, 605, 606 e 607, onde se escreve (entre o mais que aborda esta problemática): “… tendo em conta que está em causa nos presentes autos uma expropriação parcial do bem, deverá ainda ser paga aos expropriados uma indemnização referente à depreciação da parte não expropriada e em resultado da mesma… Pretendem ainda os expropriados no seu requerimento de recurso que seja ponderada a eventual depreciação que a parte sobrante do seu prédio terá sofrido em consequência da expropriação… o Tribunal considera que, quanto a este ponto ocorrerá a existência de uma desvalorização ou depreciação da parte sobrante do prédio-mãe, que ficou após a expropriação, em resultado do aumento da referida poluição pela concentração de lixo enviado de cima do viaduto. Conclui-se que ficou igualmente demonstrada a ocorrência de uma depreciação das partes sobrantes do prédio de onde foi retirada a parcela expropriada...

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