Acórdão nº 111/02.8TACLB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelBELMIRO DE ANDRADE
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM, EM AUDIÊNCIA, NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA I. RELATÓRIO Nos presentes autos, após realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença mediante a qual foi decidido: - Julgar improcedente a acção penal, absolvendo o arguido A...

do crime de homicídio por negligência p e p pelo artigo 137º do C.P. pelo qual vinha acusado; - Julgar improcedentes os pedidos de indemnização civil com base na responsabilidade civil conexa com a criminal deduzidos nos autos {por: -B...

, viúva; - C...

, menor, representado pela primeira, sua mãe; e - D....

} assim absolvendo a demandada civil E...

, dos pedidos contra ele formulados.

* Recorrem da referida sentença os demandantes civis B... (admitida a intervir nos autos como assistente - fls. 153/266) e C....

, este representado por aquela.

Motivam o recurso com as seguintes CONCLUSÕES: 1. Na sentença sob recurso houve — salvo melhor entendimento -, erro notório na avaliação e ponderação dos factos, factos que não foram devidamente valorados, outros que foram incorrectamente julgados e que impunham decisão diversa e insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

2 Não se deve considerar provado que o F...

seguia a uma velocidade não concretamente apurada mas superior a 50 Km/h. pois, com ao devido respeito por entendimento contrário, o raciocínio que leva a tal conclusão não está correcto.

  1. Factos e argumentos há nos autos que convencem que ao Km 125,956 da EN 17, área da comarca de Celorico da Beira, o Arguido ao efectuar a curva para a esquerda atento o seu sentido de circulação, invadiu parte da hemi-faixa de rodagem esquerda, indo embater no F...; 4. E dando-se o embate entre os dois veículos na hemi-faixa de rodagem direita, atento o sentido Gouveja/Celorico, o Arguido actuou com violação das regras de cuidado a que se encontrava obrigado, não tendo previsto o embate e as suas consequências, o que era-lhe exigível de acordo com as suas capacidades pessoais e circunstâncias do caso detendo consciência, tanto mais que era condutor profissional, de que a sua conduta era proibida por lei e punida por lei penal 5. Prova-o o teor do croqui e da participação do acidente; 6. Prova-o as características do local onde ocorreu o acidente.

  2. Prova-o o local onde se ficaram os vestígios de vidros e plásticos decorrentes do embate dos veícu1os acidentados.

  3. Prova-o a falta de sinais de travagem no asfalto onde ocorreu o acidente 9. Prova-o o local da imobilização do Autocarro conduzido pelo Arguido.

  4. Prova-o as Leis da Física Mecânica.

  5. Prova-o as testemunhas apresentadas pelos Recorrentes e pelo Ministério Público.

  6. Logo, conclui-se que o acidente ocorreu porque o veiculo conduzido pelo Arguido invadiu a faixa de rodagem do veiculo conduzido pelo depois falecido F...e dado que o local da ocorrência e uma curva fechada sem visibilidade, impediu que houvesse travagens de qualquer um dos veículos ou tentativa de escapar por parte do Jeep onde seguia F....

  7. Foi repentinamente, em cima da curva, que tudo sucedeu.

  8. E tudo sucedeu na faixa de rodagem do veículo do F..., logo, o Arguido invadiu a faixa de rodagem contrário e logo provocou o acidente.

  9. Assim sendo, deverá ser condenado o Arguido pela autoria de um crime de homicídio por negligência e a Seguradora condenada no pagamento da indemnização peticionada.

  10. Obtendo o presente recurso provimento, revogando-se a douta sentença sob recurso, e substituindo-se a mesma por outra que condene nos termos referidos OU, o que por mera hipótese se coloca, seja anulado o julgamento e realizado o mesmo novamente, desta feita com a reconstituição do acidente no local por forma a esclarecer o teor da participação do acidente e o croqui.

    * Respondeu a demandada E... Seguradora sustentando o bom fundamento da decisão recorrida.

    Respondeu também a digna magistrada do MºPº junto do tribunal recorrido pugnado pela improcedência do recurso, destacando que não houve registo da prova produzida em audiência em virtude de todos os sujeitos processuais terem prescindido dessa faculdade, não se verificando qualquer dos vícios previstos no art. 410º, n.º2 do CPP.

    No visto a que se reporta o art. 416º do CPP o Ex. Mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no qual manifesta inteira concordância com os fundamentos da resposta apresentada em 1ª instância.

    Foi cumprido o disposto no art. 417º, n.º2 do CPP.

    Corridos os vistos, tendo-se procedido a julgamento, mantendo-se a validade e regularidade afirmadas no processo, cumpre conhecer e decidir.

    *** II. FUNDAMENTAÇÃO 1. O âmbito do recurso é definido pelas respectivas conclusões – Cfr. art. 412º, n.º1 do CPP e Germano Marques as Silva, Curso de processo Penal, 2ª ed., III, 335, jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada), Simas Santos / Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 5ª ed., p. 74.

    Assim, sintetizando, são as seguintes as questões a decidir: - existência dos vícios de erro notório e insuficiência previstos no art. 410º n.º2 do CPP; - impugnação da matéria de facto com base na reapreciação da prova; - verificação da existência dos pressupostos da responsabilidade criminal e da responsabilidade civil conexa.

    Questões cuja decisão obriga à ponderação da decisão da matéria de facto recorrida.

    * 2. A decisão da matéria de facto, com a motivação que a suporta, é a seguinte: Factos provados: 1. Da acusação, da contestação e do pedido de indemnização civil resultaram provados os seguintes factos: 2. No dia 9 de Novembro de 2002, pelas 18h30m, o arguido conduzia o veículo pesado de passageiros, de matrícula TR-70-13, pela Estrada Nacional n.º 17, no sentido Celorico da Beira – Gouveia.

  11. Nas mesmas circunstâncias espacio-temporais, F..., conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula 53-85-HD, em sentido contrário, ou seja de Gouveia para Celorico da Beira.

  12. Ao Km. 125,956 da EN 17, área desta comarca de Celorico da Beira, o arguido deparou-se com uma curva à esquerda, tendo em conta o seu sentido de marcha 5. O F..., que circulava pela hemifaixa de rodagem direita, tendo em conta o seu sentido de marcha, passava nesse momento pela mesma curva, que para si se orientava para a direita, em descida.

  13. Os veículos embateram um no outro, respectivamente a parte frontal esquerda do veículo conduzido pelo arguido e a parte frontal esquerda do veículo conduzido por F....

  14. O veículo conduzido por F..., por força do embate, foi projectado para o local onde se veio a imobilizar, em cima da margem direita da estrada, atento o sentido Gouveia – Celorico da Beira.

  15. Na hemi faixa de rodagem direita, atento o sentido Gouveia – Celorico da Beira ficaram vestígios – vidros, plásticos, óleo, etc.

  16. O TR-70-13 ficou imobilizado obliquamente, com a frente virada para Gouveia.

  17. A EN 17 tem 6,20m de largura, configurando uma curva de reduzida visibilidade. O piso estava húmido e não havia nevoeiro.

  18. Em consequência do embate o F...sofreu farcturas dos ossos que constituem o tecto da orbita direita, fractura dos ossos da base, lesões da massa encefálica, essencialmente na região occipital, lesões no cerebelo e Bolbo, facturas dos ossos da orbita direita, pequeno hematoma nas paredes do tórax, laceração do pulmão esquerdo, pequeno hemotorax, hemoperitoneu extenso, hematoma do mesentério, fractura do fígado, fractura da coluna cervical, com secção parcial da medula, fractura do fémur esquerdo e fractura do fémur direito.

  19. Estas lesões cranioencefálicas, torácicas, abdominais, e dos membros inferiores foram causa directa e necessária da sua morte, verificada às 18h30m do mesmo dia 9 de Novembro de 2002.

  20. O condutor F... era portador de uma TAS de 0,68g/l.

  21. O embate entre os veículos foi violento.

  22. Por força do embate entre o TR e o HD, o eixo da roda do TR partiu e ficou destruída toda a parte lateral da zona do rodado do TR.

  23. Era noite.

  24. O veículo conduzido pelo F... não tinha efectuado a inspecção obrigatória.

  25. O F... seguia a uma velocidade não concretamente apurada, mas superior a 50 km/h.

  26. A velocidade máxima permitida no local do embate é de 50 km/hora.

  27. O arguido é motorista de ambulâncias nos Bombeiros de Seia, onde aufere o salário mínimo nacional.

  28. É condutor há mais de 30 anos (desde 13.5.1975) 22. É considerado cuidadoso, prudente e conduz com atenção.

  29. Tem um filho com 26 anos que trabalha.

  30. É casado e a mulher é operária numa fabrica, onde aufere o valor do salário mínimo.

  31. Tem casa própria.

  32. Tem de escolaridade a 4.ª classe.

  33. O arguido foi condenado no Tribunal Judicial de Seia, em 12.1.1999, transitada em julgado, pela prática do crime de injúria, na pena de 50 dias de multa, à razão diária de 1.000$00.

    Do pedido de indemnização civil: 28. A E... Companhia de Seguros, SA., assumiu perante a União Desportiva de Seia, a responsabilidade decorrente dos prejuízos causados pelo veículo matrícula TR-70-13, através do contrato de seguro, titulado pela apólice n.º 9915944.

  34. O F... nasceu em 23.11.1973, tendo há data do acidente 26 anos de idade.

  35. Era uma pessoa saudável e de compleição robusta.

  36. Gozava de boa saúde, era activo e trabalhador, e exercia a profissão de técnico de ar condicionado, na Vismea em Viseu.

  37. F... casou com Elisabete Sofia de Sousa Lopes, no dia 22 de Junho de 2001, na Conservatória do Registo Civil de Viseu.

  38. C..., nascido em 19 de Março de 2002, é filho de F....

  39. A demandante Elisabete despendeu a quantia de € 1343,00 de despesas de funeral.

  40. Comprou roupa de luto.

  41. O F...era marido e pai extremoso, amantíssimo de sua mulher e de filho Leandro, a quem dedicava todo o amor.

  42. Em consequência do falecimento do marido a Elisabete sofreu perturbações, depressão profunda e insónia, tendo sido medicada e acompanhada por médico particular e depois em consultas no hospital de Abraveses (Viseu), tendo dispendido em despesas farmacêuticas a quantia de € 115, 35.

  43. O A....conduzia o veículo automóvel TR, enquanto empregado da União Desportiva...

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