Acórdão nº 06S3958 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução21 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

"AA" propôs, em 12 de Outubro de 2000, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, contra "Empresa-A- (...)", actualmente, "Fundação ... - ... - ... e ... ...", pedindo a condenação da Ré, - a reintegrá-lo, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria; e - a pagar-lhe a remuneração correspondente ao mês de Setembro de 2000, no montante de Esc.: 855.286$00; todas remunerações vencidas, daquele valor mensal, desde Outubro de 2000, inclusive, até à data da sentença; e uma indemnização por danos não patrimoniais, no valor de Esc.: 2.565.000$00.

Alegou, no essencial, que: - Por contrato denominado Contrato de Trabalho a Prazo, datado de 21 de Outubro de 1978, foi admitido ao serviço da "Empresa-A", para, sob a autoridade e direcção desta, com início naquela data e termo em 30 de Setembro de 1979, exercer funções de docente universitário, no estabelecimento de ensino pertencente à referida cooperativa, sito na Rua Vítor Cordon, n.os ... a ..., em Lisboa, contrato esse prorrogado nos termos do Decreto-Lei n.º 781/76, de 28 de Outubro.

- Em 1986, o Ministério da Educação deixou de reconhecer a validade dos cursos ministrados na Empresa-B, cujo processo referente à autorização de funcionamento, ficou suspenso até decisão judicial quanto à legitimidade da entidade requerente titular daquele estabelecimento, sendo dado aos respectivos alunos um prazo para, querendo, requererem a transferência para outra Universidade.

- Em 1986, ano em que foi constituída a Ré, com sede na Rua da Junqueira, e se iniciou a actividade da Empresa-A, o Autor mantinha-se como professor da Empresa-B, funções que desempenhou, ininterruptamente, desde 21 de Outubro de 1978, primeiro na Rua Victor Cordon e depois na Rua da Junqueira.

- Em 20 de Maio de 1987, a Ré adquiriu a propriedade dos edifícios sitos na Rua da Junqueira, ... e ... a ..., nos quais têm as sedes quer a "Cooperativa de Ensino Empresa-B", quer a "Cooperativa de Ensino Empresa-A", ora Ré.

- Datada de 6 de Agosto de 1999, o Presidente da Direcção da Ré remeteu ao Autor a carta junta a fls. 70, onde junta documentos, a fim de o Autor, "querendo e no prazo de dez dias... responder o que tiver por conveniente à imputação das faltas" que dos mesmos documentos constam e que ao Autor são atribuídas.

- O Autor, que esteve de férias naquele mês de Agosto, recebeu a dita carta em 1 de Setembro de 1999, tendo respondido no dia seguinte, por fax.

- Datada de 2 de Setembro de 1999, o Presidente do Conselho Directivo da Ré remeteu a carta junta a fls. 81, em que "são indicadas as faltas no ano lectivo de 1998/1999", e à qual o Autor respondeu, por fax, no dia 8 do mesmo mês.

- Em 1 de Setembro de 1999, o Dr. BB dirigira ao Presidente da cooperativa Ré a carta junta a fls. 87 a 89, onde afirma: que, tendo-se deslocado às instalações da Ré, para serviço de exame da disciplina de Sociologia de que era Regente na turma PL (pós-laboral), verificou que os alunos se encontravam na sala SF, atribuída no calendário de exames à turma A; que o exame se desenrolou normalmente, não se tendo verificado qualquer movimento anormal de alunos; que o Autor apenas faltou a um exame por indisposição física, facto de que o Autor dera conhecimento ao Presidente da Direcção da cooperativa Ré.

- Por carta datada de 24 de Novembro de 1999, o Presidente da Direcção da cooperativa R. remeteu ao Autor o "relatório final do processo respeitante à falta (...) ao exame da disciplina de Sociologia, marcado para 30 de Julho", no qual é referido: a) que o Autor faltou ao exame "por estar de férias"; b) que a carta do Dr. BB ao Presidente da Direcção da cooperativa Ré foi ditada e imposta pelo Autor, que faz parte do corpo docente do Instituto Superior das Ciências Sociais e Políticas, onde o Dr. BB está preparando o seu doutoramento; c) que o contrato de docência que a cooperativa celebrara com o Autor "é um contrato a prazo, pois as funções docentes que constituíam o seu objecto eram exercidas no regime de acumulação"; d) que o procedimento do Autor, relativo à falta ao exame de Sociologia do dia 30 de Julho "impõe a não renovação do respectivo contrato de docência e tê-la-ia imposto ainda que não fosse a referida, a natureza do citado contrato"; e) que "se declara não renovado o contrato de docência em causa.

" - A única comunicação da Ré ao Autor que refere a sua intenção de o despedir é a carta de 22 de Outubro de 1999 - junta a fls. 91 -, a qual refere, textualmente: "das faltas dadas demonstram elas tal gravidade que não poderiam deixar de exigir a rescisão do contrato de docência então em vigor, salvo se.., apresentasse justificação que a tal obstasse", carta essa que não foi acompanhada de qualquer nota de culpa e na qual o uso do termo verbal indicia que o Presidente da Direcção da Ré considerava já, então, que o contrato era coisa do passado.

- A falta do Autor ao referido exame deu-se porque esteve impedido, nesse dia e hora, em serviço oficial, tendo comunicado a sua indisponibilidade dias antes da data do exame; não foi culposa, não foi tão grave, nem teve consequências tais que determinasse, por si só, a impossibilidade da relação de trabalho, que subsistia há já 21 anos; não foi injustificada, nem determinou directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa cooperativa Ré.

- O despedimento do Autor pela cooperativa Ré não pode deixar de ter-se por ilícito.

- Após a cessação do seu contrato de trabalho com a Ré, o Autor não encontrou colocação noutra escola, não tendo iniciado qualquer nova actividade posteriormente ao despedimento.

- O Autor recebeu, no ano lectivo de 1998/1999, a título de ordenados, férias pagas, subsídio de férias e subsídio de Natal, na Universidade ... de Lisboa e Porto, o valor bruto total de Esc. 11.974.010$00, a que corresponde a média mensal de Esc. 855.286$00.

- A redução do seu estipêndio mensal em cerca de 850 contos provocou o abaixamento do seu nível de vida pessoal e o da sua família.

- O Autor sofreu moralmente - e ainda sofre -, por ter sido despedido da forma que o foi e por ter deixado de auferir o vencimento pago pela Ré, com o qual se habituara a contar desde há 21 anos a esta parte.

Conclui que: - O contrato que o liga à Ré é um contrato de trabalho, que se iniciou como Contrato de Trabalho a Prazo em Outubro de 1978, e se converteu, há muito, em contrato de trabalho por tempo indeterminado, tendo a Ré sucedido à "Cooperativa Empresa-B", com a transmissão para aquela da posição que do contrato de trabalho decorre para a entidade patronal, nos termos do n.º 1 do artigo 37.º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24 de Novembro de 1969.

- Sendo ilícito o despedimento, e face ao disposto pelo artigo 13.º do RJCCT, a Ré deverá pagar-lhe a quantia de Esc. 855.286$00 relativos à remuneração do mês anterior ao da propositura da acção, bem como todas as remunerações que se vencerem desde o mês de Outubro de 2000, inclusive, até à data da sentença, no montante mensal de Esc. 855.286$00.

- Pelos danos não patrimoniais que causou ao Autor e atendendo ao grau de culpa da Direcção da Cooperativa Ré e à desproporção entre a situação económica desta e a do lesado, deverá, ainda, ser condenada numa indemnização no montante de Esc. 2.565.000$00, correspondente a 3 meses de remuneração.

  1. Na contestação, a Ré deduziu a excepção da incompetência em razão da matéria, com fundamento no facto de entre as partes ter sido celebrado um contrato de docência, semelhante ao de prestação de serviços, e sustentando não ser responsável pelo contrato que o Autor alega ter celebrado com a Cooperativa de Empresa-B, que continua a ter personalidade jurídica e a existir, independentemente da Ré. E impugnou os factos articulados pelo Autor, dizendo, em súmula, que: - Em 8 de Outubro de 1986, o Autor foi contratado pela Ré, mediante a celebração de um contrato de docência, pelo período de um ano; no ano lectivo de 1986/87, foi ainda celebrado entre as partes outro contrato de docência, para uma turma de pós-laboral; outros contratos de docência foram sendo celebrados, tendo em conta alterações da carga horária atribuída ao Autor.

    - Esses contratos de docência seriam renovados por iguais períodos, excepto se alguma das partes comunicasse à outra a sua intenção de não os renovar.

    - O contrato de docência universitária é um contrato atípico, na categoria de prestação de serviços e o Autor não estava sujeito à autoridade e direcção da Ré, nem esta lhe podia dar quaisquer ordens quanto à execução da sua actividade docente.

    - A Ré decidiu não renovar o contrato de docência do Autor, após ter procedido a averiguações e ter dado ao Autor a oportunidade de justificar os factos que lhe foram imputados.

    - Pelo facto de leccionar em várias Universidades, o Autor chegava sistematicamente atrasado e faltava às aulas que tinha assumido perante a Universidade ..., o que gerou mau estar no seio do corpo docente da Ré, disseminando a ideia de que o Autor não cumpria as suas funções e que comprometia, com a sua atitude, o prestígio da casa e o bom nome de todo o corpo docente, que exerceu pressões sobre a Ré no sentido de proceder a averiguações e à oportuna dispensa dos serviços prestados pelo Autor, pressões a que a Ré cedeu.

    - No dia 30 de Julho de 1999, pelas 19.30 horas, o Autor faltou ao exame final de Sociologia, Turma A, apesar de ser regente da disciplina e responsável pela mesma e de saber que, nessa qualidade, não poderia deixar de estar presente.

    - O Autor havia solicitado a dispensa deste exame, não tendo sido possível notificá-lo da decisão de indeferimento, proferida em 23 de Julho de 1999, em virtude de ele se ter ausentado para férias.

    - A falta ao mencionado exame implicou a não realização do mesmo, sabendo o Autor que sem a sua presença ele não se realizaria, com os inerentes prejuízos para os alunos e para o funcionamento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT