Acórdão nº 07P1895 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução14 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

O Tribunal Colectivo do 2º. Juízo Criminal da Comarca de Gondomar (proc. n.º 180/06.1PCGDM), por acórdão de 28.3.2007, condenou AA, com os sinais dos autos, como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes do art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão.

Inconformado, recorre o arguido para este Supremo Tribunal de Justiça pedindo a dispensa de pena ou, ao menos a sua atenuação especial, ou ainda a redução para 5 anos.

Respondeu o Ministério Público que concluiu pela rejeição por manifesta improcedência, ou pelo menos pelo improvimento.

Distribuídos os autos a 16.5.2007 neste Supremo Tribunal de Justiça, teve vista o Ministério Público.

Colhidos os vistos, teve lugar a audiência. Nela, o Ministério Público relembrou os factos e sublinhou que, diversamente do pretendido pelo arguido, ele não abandonou voluntariamente a actividade, não diminuiu o perigo respectivo, nem colaborou na captura de outros responsáveis. A única colaboração que prestou foi na busca, desencadeada apesar da sua vontade. Por outro lado, referiu, que o divórcio não é fundamento para uma atenuação da pena. Admitiu, no entanto, uma eventual diminuição da pena para 6 anos de prisão. A defesa manteve a posição assumida em sede de motivação.

Cumpre, assim, conhecer e decidir.

2.1.

E conhecendo.

Antes de entrar na apreciação das questões suscitadas, impõe alinhar a matéria de facto provada e que é a seguinte: 2.1. - Desde, pelo menos, inícios de Julho de 2006, o arguido dedicava-se à venda de heroína, em Gondomar e zonas limítrofes.

2.2. - No dia 28 desse mês, pelas 8,15 horas, no decurso de uma busca domiciliária efectuada à casa onde habitava o arguido, sita na Rua do Bolhão, nº. ..., em Jovim, Gondomar, foram encontrados, para além do mais, os seguintes artigos: No hall de entrada, sob o tampo em pedra de um móvel, 835,00 Euros em notas do Banco Central Europeu e várias embalagens de heroína, com o peso bruto de 3,373 gramas e, líquido, de 2,718 gramas; Na cozinha, no interior de uma gaveta de um móvel, uma embalagem de heroína com peso bruto de 343,214 gramas e, líquido, de 304,993 gramas, e, no interior de uma outra gaveta, envolto num lenço de bolso, vários artigos em ouro; Na lavandaria, no interior de um móvel de arrumos, uma embalagem de comprimidos "Noostan", contendo 33 comprimidos, uma balança digital da marca "Tanita", um pincel com cabo em madeira, de cor castanha, da marca "Universal", um moinho de marca "Taurus", artigos estes que apresentavam resíduos de heroína e vários sacos de plástico, de cor transparente; Num dos quartos, três telemóveis da marca "Nokia", modelo 1100; Na casa de banho do mesmo quarto, no interior do respiro da banheira, um saco plástico contendo várias embalagens de heroína, com o peso bruto de 140,819 gramas e, líquido, de 130,412 gramas.

2.3. - O arguido detinha a heroína ali encontrada em seu poder, destinando-a à venda a terceiros.

2.4. - Para o efeito e com recurso ao restante material aprendido, designadamente os comprimidos "Noostan", o moinho, a balança e os sacos de plástico, o arguido fazia a divisão e pesagem do produto para a sua posterior comercialização.

2.5. - Utilizava o arguido dois dos telemóveis apreendidos, um para o estabelecimento de contactos com o seu fornecedor e, outro, com os clientes da droga.

2.6. - O dinheiro apreendido era proveniente das vendas já feitas de heroína.

2.7. - O arguido conhecia as características da heroína que foi encontrada em seu poder, sabendo que aquela substância por lei é considerada estupefaciente.

2.8. - O arguido previu e quis ter consigo o produto estupefaciente já referido, para o vender a quem o quisesse adquirir, bem sabendo que para tal não estava autorizado e desse modo auferir os lucros provenientes dessa actividade.

2.9. - O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era ilícita e penalmente punível.

2.10. - O arguido foi detido e encontra-se em prisão preventiva, à ordem destes autos, desde 28 de Julho de 2006.

2.11. - Do CRC do arguido consta que: a) - No Processo de Querela 103/83, do 2º. Juízo Criminal do Porto, pelos crimes de furto qualificado e porte de arma proibida foi condenado, por Acórdão de 26/01/84, em pena única de 2 anos e 3 meses de prisão, cuja suspensão foi revogada e, depois, perdoado um ano de prisão; b) - No Processo de Querela 22/89, do Círculo de Paredes, pelo crime de furto qualificado foi condenado, por Acórdão de 14/03/89, em pena de 12 meses de prisão, perdoada; c) - No Processo Comum 308/92, do 1º. Juízo Criminal do Porto, por Acórdão de 26/11/1992, e por crime de tráfico de estupefacientes, foi condenado na pena de 6 anos de prisão e 80.000$00 de multa, tendo-lhe sido perdoado um ano de prisão e a multa, pena de prisão que cumpriu durante 38 meses recluso, tendo-lhe sido concedida a liberdade definitiva por decisão de 23/05/97.

2.12. - O arguido fora abordado por um tal BB, já seu conhecido, que lhe trouxe e entregou, tudo dentro de um saco, meio quilograma de heroína, a balança, o moinho e dois telemóveis, sendo um para ambos comunicarem entre si e, o outro, para comunicar com clientes, propondo-lhe que servisse de depositário do estupefaciente, utilizasse aqueles apetrechos para o pesar e dividir, entregasse as porções que lhe fossem encomendadas, e lhe guardasse o dinheiro recebido em troca delas.

2.13. - O arguido aceitou tal proposta, mediante a contrapartida de 5 Euros por cada grama que vendesse.

2.14. - Na altura, o arguido estava separado da esposa, vivia sozinho, encontrava-se desempregado e recebia como subsídio 406 Euros/mês. Tem dois filhos do casamento, de 19 e 15 anos. Tem o 6º. Ano de escolaridade, trabalhou de marceneiro, como motorista e já explorou um Café. Construíra a casa que habitara com os recursos da sua profissão (quando a exercia, ganhava 750 Euros mês) e da esposa (que, como pasteleira, ganhava 500 Euros/mês) e um empréstimo bancário no montante de 7.000 contos, para o qual pagava 150 Euros de prestação mensal.

2.15. - Um dos telemóveis era dele. O ouro pertence-lhe, bem como aos filhos e esposa.

2.16. - No Estabelecimento Prisional de Custóias, o arguido só foi visitado uma vez pelo tal BB, o qual lá entrou com "cunha" e sem ficar registado, lhe entregou "oito contos" e lhe disse que lhe ia arranjar advogado, mas nunca mais apareceu. Tem-se ocupado a trabalhar como marceneiro na carpintaria. Apenas o filho o visita, levado pelos padrinhos.

2.17. - Na busca, o arguido prontamente franqueou a casa, apontou onde tinha os objectos apreendidos e mostrou-se colaborante com a PSP.

2.18. - No decurso da audiência, o arguido confessou e explicou nos termos abaixo detalhados a sua conduta.

Factos não provados Que a actividade do arguido remontasse a "pelo menos a Junho de 2006"; Que tal actividade fosse exercida "em outras localidades do Norte do País" diversas das provadas.

Que tal actividade englobasse outros "produtos estupefacientes" diferentes da heroína; Que as formas da alegada "comercialização e cedência" fossem diversas da venda; Que um dos telemóveis (que lhe pertencia) e o pincel também fossem utilizados no tráfico; Que os artigos em ouro fossem provenientes das vendas de produtos estupefacientes.

2.2.

Sustenta o recorrente que a matéria de facto dada como provada resultou única e exclusivamente da sua confissão (pontos 2.17 e 2.18): "na busca, o arguido prontamente franqueou a casa, apontou onde tinha os objectos apreendidos e mostrou-se colaborante com a P.S.P. "e "no decurso da audiência, o arguido confessou e explicou nos termos abaixo detalhados a sua conduta "(conclusões 1 a 3), sem o que não se lograria obter aquela matéria de facto (conclusão 4). Assumiu, pois, uma postura de colaboração com a justiça desde o primeiro momento, imprescindível para a descoberta da verdade dos factos (conclusão 5).

Tal conduta - diz - constitui um claro arrependimento conforme resulta da sua total e integral confissão, que não foi devidamente valorada, como resulta de fls. 14 e 15 do acórdão recorrido (conclusões 6 e 23), vivendo à data dos factos uma situação pessoal/familiar muito conturbada que o afectava psicologicamente, e que contribuiu para o seu envolvimento na prática do crime (conclusões 7 e 24), o que também não foi valorado (conclusão 10).

Atendendo ao art. 31.º do DL n.º 15/93, a pena deveria ter sido dispensada, ou especialmente atenuada (conclusão 11), face à sua colaboração e indicação aos agentes onde se encontravam alguns dos objectos apreendidos, sendo que se não o tivesse feito aqueles não os conseguiriam detectar (conclusão 12), identificação dos demais responsáveis, com descrição pormenorizada das informações que possuía de forma a que autoridade policial possa detê-los (conclusão 13), nada mais podendo fazer (conclusão 14), numa postura de total arrependimento, de ajuda e auxilio com a justiça, e principalmente de reparação do mal que praticou e de diminuição do perigo produzido pela sua conduta (conclusão 15). Desta forma, deveria o Meritíssimo Juiz a quo na medida da pena ter aplicado o art. 31.º do D.L n ° 15 /93 de 22 de Janeiro, e dessa forma ter dispensado a pena, ou quanto muito, ter especialmente atenuado aquela (conclusões 16 e 17).

Se a pena tem em vista a ressocialização do agente, a prevenção geral e a prevenção especial, tendo o recorrente confessado integralmente, colaborado, indicando o local onde estava escondido algum estupefaciente, que doutra não seria possível aos agentes encontrarem, a pena de 6 anos e 6 meses é de tudo excessiva e desadequada aos princípios da prevenção geral e especial (conclusão 18), não lhe permitindo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT