Acórdão nº 06S4474 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução02 de Maio de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 13 de Outubro de 2003, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA instaurou acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, na qual alegou, em substância, que a ré, no período compreendido entre 10 de Janeiro de 2000 e 29 de Julho de 2002, violou de forma continuada, persistente e dolosa o seu direito de ocupação efectiva e que, no mesmo período, não lhe pagou o prémio de disponibilidade, o prémio de avaliação de desempenho, o bónus de gestão, e o prémio Empresa-B extraordinário, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe: a) 20.000 euros de indemnização por danos morais; b) 11.708,89 euros de prémios vencidos e não pagos; c) demais prémios que se vençam e não venham a ser pagos; d) juros de mora à taxa legal.

Realizado julgamento, foi exarada sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou «a ré a pagar ao autor: a) € 10.000 de indemnização de danos morais e juros, a partir do trânsito em julgado da presente decisão; b) € 228,70 de prémios de disponibilidade vencidos e não pagos e juros de mora vencidos e vincendos sobre tal quantia.» Ambas as partes interpuseram recurso de apelação para a Relação de Lisboa, que julgou procedentes a apelação da ré e a ampliação do recurso do autor, anulando a sentença e ordenando a ampliação da matéria de facto, com a elaboração de nova base instrutória, após a prolação de despacho ao abrigo do artigo 27.º, alínea b), do Código de Processo do Trabalho.

Cumprido o determinado pela Relação e efectuado julgamento, foi proferida nova sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando «a ré a pagar ao autor € 228,70 de prémios de disponibilidade vencidos e não pagos e juros de mora vencidos e vincendos sobre tal quantia, absolvendo a ré do demais pedido».

  1. Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou parcialmente procedente e, em conformidade: (i) alterou a decisão recorrida no que se refere à alínea NN) da matéria de facto, ficando com a seguinte redacção: «Quer o bónus de gestão quer o prémio Empresa-B extraordinário constituem gratificações concedidas pela ré e pela Empresa-B aos trabalhadores que aquelas entendem ser deles merecedores»; (ii) condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 500 a título de prémio Empresa-B extraordinário; (iii) condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 261,85 a título de prémio de disponibilidade.

    É contra esta decisão da Relação de Lisboa que primeiro o autor e depois a ré se insurgem, mediante recursos de revista, sendo o primeiro independente e o segundo subordinado, ao abrigo, em substância, das seguintes conclusões: RECURSO DO AUTOR: - Para ajuizar das razões que o acórdão recorrido invoca como dirimentes de culpa da ré na não ocupação do autor convém, antes de mais, atentar que a sua inocupação viria a prolongar-se por 2 anos e 1 dia; - Uma vez que o autor esteve sem funções efectivas entre 10.1.00 e 10.4.00 e entre 4.8.00 e 14.8.01, ou seja, durante 1 ano, 3 meses e 10 dias, «impedido de comparecer ao serviço, em regime de verdadeira prisão domiciliária, e esteve confinado no gueto do Beco dos Apóstolos, "a cumprir o horário de trabalho", mas sem quaisquer funções, entre 17.9.01 e 20.11.01 e entre 10.1.02 e 29.7.02, ou seja, durante 8 meses e 21 dias»; - E aí continuaria seguramente ainda hoje não fora a providência cautelar que, em 5 de Julho de 2002, propôs contra a entidade empregadora e que obrigou esta, receosa da sanção pecuniária compulsória que pendia sobre a sua cabeça, a dar-lhe funções condignas, pondo assim termo a uma desocupação injustificada e indignificante; - A «diligência» da ré de que o acórdão abundantemente fala, apenas lhe havia conseguido 2 meses e 6 dias de trabalho no Porto Brandão, de 10 de Abril a 16 de Junho de 2000, e um estágio em Cabo Ruivo com a duração de 50 dias, de Novembro de 2001 a Janeiro de 2002; - Em 930 dias disponíveis de trabalho a ré ocupou-o apenas durante 116, se ao estágio se puder chamar trabalho, ou seja, 12% dos dias possíveis; - De forma que justificar a desocupação do autor durante mais de 2 anos pela Expo 98, a extinção da Direcção de Informática no final de 1996 (onde nunca trabalhou) ou um projecto que designou «Optimização 2000», que ninguém soube explicar em que consistiu, «é querer tapar o sol com uma peneira»; - Uma vez que se encontra provado que, de 18 de Fevereiro de 1988 a 17 de Março de 1994, o autor exerceu funções na Refinaria de Cabo Ruivo, e quanto à extinção da Direcção de Informática, que terá ocorrido no final de 1996, o autor encontrava-se a trabalhar no Aeroporto e aí continuou até Janeiro de 2000, pelo que tal extinção nada teve a ver com a sua posterior desocupação; - E quanto à «Optimização 2000» não se vê em que é que tal fantasia que teria levado a «dispensar» cerca de 700 trabalhadores, teve a ver com o autor, que não foi «dispensado»; - Finalmente quanto à pretensa «extinção do posto de trabalho», no Aeroporto de Lisboa, esquece-se que a extinção do posto de trabalho é uma figura jurídica que se previa na Lei então em vigor, artigos 26.º e seguintes da LCCT, que dependia de um certo número de pressupostos e sujeito a formalismos vários, pressupostos que não se provaram verificar--se, formalismos que não foram minimamente cumpridos; - Não pode, pois, falar-se em extinção do posto de trabalho, sendo aliás significativo que a carta da ré de 10.1.00, que o «manda para casa», não faz a menor referência a tão mirífica extinção; - E quanto à «reestruturação» que se invoca, «não passa de um chavão vazio», sem qualquer conteúdo concreto, pois o que havia que demonstrar era em que consistiu a dita «reestruturação» em cada um dos 8 anos que vão de 1994 a 2002, e salvo o que atrás se referiu, nada se provou, porque mais reestruturação alguma se pode ter como ocorrida, capaz de justificar a desocupação do trabalhador; - Aliás ainda que reestruturação tivesse existido, ela teria sempre de fazer--se, conforme é entendimento pacífico da jurisprudência, com pleno respeito de todos os direitos dos trabalhadores, entre os quais se inclui o de ocupação efectiva (cf. Acórdão do STJ de 22.5.91, in BTE, 2.ª Série, n.º 4-5-6/94, pág. 396); - A desocupação ofendeu-o gravemente na sua dignidade e bom-nome, reduziu-o a um pária olhado com desdém pelos colegas, familiares e vizinhos, desvalorizou-o profissionalmente e ofendeu-o gravemente na sua imagem de profissional competente e dedicado; - Frustrou a sua realização pessoal, que notoriamente é causa de desgosto, de desestima, de sofrimento moral em suma, uma vez que como reza a CRP e é entendimento pacifico da jurisprudência, o trabalhador, todo o trabalhador, tem direito «à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal», pelo que, como a doutrina salienta, o nosso ordenamento jurídico-laboral perfilha «uma concepção do trabalho que transcende a sua expressão económica, fazendo dele, principalmente, um factor de satisfação moral e de consideração pessoal»; - Daí os graves danos morais que por facto ilícito da ré o autor sofreu, cuja compensação sempre precária não pode considerar-se excessiva fixando--a nos 20 mil euros pedidos, atenta a gravidade da culpa da ré, a longa duração da desocupação efectiva e a grave ofensa do trabalhador na sua dignidade, no seu bom-nome e na sua imagem; - Quanto ao prémio de avaliação de desempenho como o próprio nome inculca dependia do desempenho, da actividade do trabalhador, mas se desempenho não houve foi por culpa da entidade pagadora, pelo que, de tal ela não poderá valer-se para negar o prémio ao trabalhador; - Deve entender-se que hipoteticamente ao seu desempenho corresponderia a avaliação máxima, ou seja, 5 em 2000, 4 em 2001 e 3 em 2002, a que correspondiam respectivamente 75% do salário, 4 salários e 3,49 salários; - O acórdão recorrido violou as disposições dos artigos 59.º, alínea b), da CRP, 22.º, n.º 1, e 82.º da LCT, 483.º, 484.º e 494.º do Código Civil, e normas de atribuição dos prémios.

    Termina pedindo a condenação da ré nas importâncias reclamadas.

    A ré contra-alegou, defendendo a confirmação do acórdão recorrido quanto à improcedência do pedido de indemnização por danos não patrimoniais e de recebimento do prémio de avaliação de desempenho.

    RECURSO DA RÉ: - O prémio Empresa-B extraordinário constituiu uma gratificação concedida pela ré e pela Empresa-B SGPS aos trabalhadores que aquelas entenderam dele ser merecedores; - Por efeito da deliberação da Empresa-B de 11 de Abril de 2002, ficaram excluídos do prémio, os colaboradores excedentários ou disponíveis à data de 31 de Dezembro de 2001, que se tivessem mantido nessa situação à data de Março de 2002 e que nela se encontrassem durante a maior parte do ano de 2001; - A escolha do universo dos trabalhadores que adquiriram o direito a receber este prémio, assenta num único critério objectivo: visou premiar os trabalhadores que prestaram trabalho efectivo e contribuíram para os resultados do Grupo; - A Empresa-B quando referiu a condição de não disponibilidade em 31 de Dezembro de 2001, quis salvaguardar aqueles que só depois dessa data passaram a essa situação, tendo trabalhado durante a maior parte ou mesmo todo o ano, solução que nos parece inteiramente justa, tendo presente a finalidade de tal prémio; - E não se quis contemplar a situação do autor que esteve ocupado apenas 40 dias em formação realizando um estágio profissional entre 20.11.2001 e 10.01.2002 [alínea R) dos factos assentes]; - Este facto (ocupação do autor no ano de 2001) não retirou a qualificação de disponível no contexto em que a deliberação foi tomada e tendo presente a finalidade por que foi instituído o prémio em causa; - Esse estágio aconteceu na sequência de uma tentativa da ré para dar ocupação ao autor, tendo vindo a frustrar-se essa expectativa pela recusa do próprio trabalhador, que...

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