Acórdão nº 07B1070 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Abril de 2007
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 26 de Abril de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA e BB instauraram, no dia 31 de Dezembro de 2003, contra CC-Imobiliária Ldª, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe, a título de cláusula penal, € 19 951,92 e juros de mora à taxa legal desde a citação, com fundamento no incumprimento de identificado contrato-promessa de compra e venda de um armazém industrial celebrado no dia 5 de Dezembro de 2001.
Contestou a ré, afirmando que o atraso na obtenção da licença de utilização, necessária à realização da escritura, se deveu única e exclusivamente aos autores, por virtude dos seus sucessivos pedidos de alteração do projecto de construção, e invocou o abuso do direito por parte deles e, com fundamento em litigância de má fé, pediu a condenação deles a indemnizá-la em montante não inferior a € 2500.
Na réplica, os autores impugnaram os factos de excepção articulados pela ré, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 23 de Fevereiro de 2006, por via da qual a ré foi condenada a pagar aos autores a quantia de € 7 481,97 e juros de mora, à taxa anual de 4%, contados desde a data de citação, sob o fundamento de mora concorrente de ambos e da limitação da mora da última ao prazo de três meses.
Interpôs a ré recurso de apelação, e a Relação, por acórdão proferido no dia 12 de Outubro de 2006, revogou a sentença recorrida e absolveu a recorrente do pedido, com fundamento na mora dos recorridos e na inexistência de mora daquela recorrida por não ter sido novamente interpelada para cumprir por aqueles.
Interpuseram os apelados recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - é a seu favor, como credores, o prazo estipulado ao expressar-se que se o devedor não entregar o armazém até determinado prazo incorre em penalidade mensal; - por isso é que a recorrida, como devedora, devia interpelá-los para dizer que queria o cumprimento do prazo; - equivale a interpelação a carta dos recorrentes de remessa dos seus elementos para a realização da escritura e a dizer que não abdicavam da cláusula penal acordada; - a obtenção de licença de ocupação incumbia à recorrida, construtora e vendedora, e ela agiu com culpa e dolo ao interpelá-los para o cumprimento do contrato sem estar em condições de o outorgar; - os recorrentes, credores, não estão em mora porque a recorrida não os interpelou para cumprir nem invocou ser o prazo impossível de cumprir por culpa de alguém; - como a obrigação da recorrida era de prazo certo, não era necessária a sua interpelação, e os recorrentes não se constituíram em mora porque nunca foram interpelados por ela para aceitar a prestação; - não foi ilidida a presunção de culpa da recorrida, e, ainda que o tivesse sido, como não houve acordo sobre a determinação do prazo, foi deferido ao tribunal, que o fixou em três meses; - o acórdão incorreu em erro de interpretação e de aplicação dos artigos 768º, nº 1, 777º, nº 2, 779º, 799º, nº 1, 805º, nº 2, alínea a), 813º e 814º, nº 1, todos do Código Civil, pelo que deve ser substituído por outro que confirme a sentença proferida pelo tribunal da 1ª instância.
Respondeu a recorrida, em síntese de conclusão de alegação: - não entregou o armazém aos recorrentes no prazo convencionado por facto que lhe seja imputável; - o atraso na alteração dos projectos, no licenciamento e no início dos trabalhos só ficou a dever-se aos constantes pedidos dos recorrentes de alteração do projecto inicialmente acordado; - os mencionados pedidos implicaram a alteração das obrigações assumidas pela recorrida, designadamente quanto à observância dos prazos; - os recorrentes não praticaram os actos necessários ao cumprimento da obrigação da recorrida, pelo que entraram em mora, tendo deixado de relevar para o cumprimento do prazo da obrigação de entrega do armazém o fixado na sentença; - para que a recorrida se constituísse em mora, teria de ser interpelada pelos recorrentes para cumprir, e não a interpelaram; - os factos não revelam o dolo da recorrida, e, como o funcionamento da cláusula penal pressupõe a culpa do devedor, e não a houve por parte da recorrida, não pode ser condenada na penalização; - ao peticionar com base no atraso da celebração da escritura de compra e venda e na entrega do armazém entraram os recorrentes em contraditório anti-jurídico.
II É a seguinte a factualidade considerada assente no acórdão recorrido: 1. No dia 5 de Dezembro de 2001, o representante da ré, como primeira outorgante, por um lado, e os autores, por outro, como segundos outorgantes, declararam por escrito, acordarem prometer: - a primeira vender e os últimos comprarem, por € 364 122,46, um armazém industrial com o nº 6, área do lote de 825 m2, com as alterações ocorridas, na zona administrativa identificada na planta, construção de 660 m2; - ser a escritura de compra e venda realizada, com a respectiva licença de utilização do armazém, durante o mês de Dezembro de 2002, em dia, hora e local a indicar pela primeira outorgante, devendo esta avisar os segundos outorgantes, por escrito, com, pelo menos, quinze dias de antecedência; - ficarem as despesas relativas à realização da escritura, nomeadamente a sisa, se a ela houver lugar, e os emolumentos notariais a cargo dos segundos outorgantes; - ser a venda do armazém livre de quaisquer ónus e encargos e entregue devidamente pronto a ser utilizado até ao dia 31 de Dezembro de 2002; - a não entrega pela primeira outorgante do armazém até ao dia 31 de Dezembro de 2002, implica o pagamento por ela aos segundos outorgantes de uma penalização de € 2 493,99 por cada mês que ultrapasse a referida data; - entregarem naquela data os segundos outorgantes à primeira outorgante a quantia de € 36.412,25, a título de sinal e princípio de pagamento, e esta dar...
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