Acórdão nº 06B734 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DOS SANTOS
Data da Resolução16 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. "AA". juiz desembargador. instaurou. nas Varas Cíveis do Porto, contra BB e CC, ambos jornalistas do "Jornal ...", a "Empresa-A", a presente acção declarativa. com forma de processo ordinário. pedindo a condenação solidária dos RR. no pagamento de 400.000 Euros. acrescidos de juros legais desde a citação até integral pagamento, a titulo de indemnização por danos de natureza patrimonial sofridos.

Para fundamentar a sua pretensão alega, em síntese. que os RR. pessoas singulares, como autores dos respectivos textos, fizeram publicar no jornal "...", propriedade de "Empresa-A". quatro artigos nas edições de 22 de Agosto de 2001, 25 de Agosto de 2001, 16 de Setembro de 2001 e 26 de Setembro de 2001, sob os títulos de, respectivamente, "Pai em greve de fome acampa à porta do Tribunal", "Pai termina greve de fome em Braga", "Pais de Braga unem-se contra juiz do Tribunal de Família e de Menores" e "Escritório de DD a recebe pais de Braga", nos quais relacionavam a greve de fome de EE com uma decisão judicial por si proferida enquanto juiz do Tribunal de Família e Menores de Braga, contendo afirmações falsas e juízos de valor (opiniões) que reputa serem gravemente atentatórias do seu nome, reputação e honra, enquanto juiz e pessoa.

  1. Contestaram os RR pelo que designaram de excepção inominada e por impugnação, alegando que os textos em causa foram publicados no exercício dos seus legítimos direitos/deveres de informação e de liberdade de expressão, que a matéria neles tratada era verdadeira, com relevância jornalística e noticiosa, foram redigidos de forma correcta e contida não sendo ilícito comentar as decisões dos tribunais, e ainda que tentaram colher informações sobre o processo junto do A., que a tal se escusou.

    Terminam pela procedência da excepção e pela improcedência da acção 3. Replicou o A e, impugnando a alegada defesa por excepção, no mais reafirma e conclui como na petição aduzindo ainda, que, no exercício do seu direito de informar, se impunha aos RR. a observância do cuidado na recolha e análise dos factos.

  2. Tendo o A. referido juntar aos autos de certidão de depoimento (de um conselheiro do STJ) prestado no âmbito de uma providência cautelar por si instaurada no Tribunal de Oeiras, que justificou como tendente a demonstrar as suas características profissionais e pessoais, junção que, todavia, apenas veio a fazer mais tarde, e que foi admitida (cfr. despacho de fls. 211), com a oposição dos RR, dele agravaram estes e, tendo o agravo sido admitido com subida diferida, formularam, nas pertinentes alegações as seguintes conclusões: 1 ª: A certidão com o testemunho do Conselheiro FF configura um verdadeiro depoimento testemunhal.

    1. : Os depoimentos estão sujeitos ao princípio do contraditório, nos termos do artº 638º do CPCivil.

    2. : Assim sendo, a junção da certidão viola o referido artº 638º.

    3. : Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente e a certidão em causa ser desentranhada dos autos, assim se fazendo JUSTIÇA.

  3. O A. não contra-alegou.

  4. Com dispensa de audiência preliminar, foi proferido despacho saneador em que, afirmada a validade e regularidade da instância, se declarou a matéria assente e se elaborou base instrutória, que se fixaram após deferimento parcial das reclamações apresentadas por A e RR. em audiência 7. Arguida, pelos RR., a nulidade do despacho saneador. que foi desatendida, dele interpuseram recurso, que foi admitido como de agravo e com subida diferida, apresentando alegações em que formulam as seguintes conclusões: 1ª: Vem o presente recurso interposto do despacho que indeferiu a arguição de nulidade de fls. 231 a 233.

    1. : Tal nulidade resulta do facto de. por um lado, não conhecer a excepção alegada pelos recorrentes na sua contestação. e, por outro lado. mesmo que se entenda, como o veio a fazer a Mmª juiz a quo que o seu conhecimento é relegado para final, tal despacho não permite, de facto, tal conhecimento a final porque impede que se inclua os factos necessários ao seu conhecimento.

    2. : Tal impedimento resulta do facto de nenhum dos factos alegados em sede de excepção terem sido incluídos na matéria assente ou na base instrutória.

    3. : Pelo exposto, o despacho saneador é nulo por violação do disposto nos artºs 510º, nº 1, al. a). e 668º, nº 1, al. d), conjugados com o artº 511º, nº 1, todos do CPC.

    Terminam pela revogação do despacho que indeferiu a arguição da nulidade e pela sua substituição por outro que declare nulo o despacho saneador, na parte em que não conhece a excepção alegada.

  5. Contra-alegou o A no sentido de ser negado provimento a esse agravo tendo sido proferido despacho de sustentação.

  6. Teve lugar audiência de discussão e julgamento com gravação e observância do formalismo legal, sem que a decisão da matéria de facto tenha sido objecto de censura, vindo. a final, a acção a ser julgada improcedente. com a consequente absolvição dos RR. do pedido.

    Inconformado, apelou o A., mas sem sucesso, já que o recurso foi julgado improcedente.

    De novo inconformado, pediu revista.

    Alegou e formulou as seguintes conclusões: 1 ª - Não havia qualquer motivo válido para a conduta aberrante do EE; 2ª - Os réus não se inteiraram, como podiam e deviam, da ausência de fundamentos para tal conduta; 3ª - Perante a gravidade das imputações do EE, os réus deveriam agir com maiores cuidados na notícia da alegada greve e das imputações que aquele fazia; 4ª - Deveriam, em especial, pedir ao EE quaisquer documentos ou cópias de despachos ou decisões do A., bem como deveriam ouvir a mãe do menor; 5ª - Mesmo omitindo tais deveres, os réus não deveriam ter publicado as imputações do EE, que eram altamente difamantes; 6ª - Do mesmo modo, os réus excederam o âmbito do facto que poderia merecer ser noticiado, tecendo comentários e análises que são subjectiva e objectivamente gravemente desprestigiantes e ofensivas para o A.; 7ª - Em especial, e em concreto, ao citarem o nome do A. e ao chamar-lhe polémico e controverso juiz, à revelia do facto essencial em si mesmo, os réus abusaram claramente das suas prerrogativas de informação; 8ª - Isso mesmo resulta da matéria de facto provada, pois as pessoas passaram a ter uma ideia negativa do autor e a terem reservas sobre a sua competência e qualidades, como homem e juiz; 9ª - Também está provado (ponto 41) que por virtude da conduta dos réus, o autor viu agravados diversos sintomas e o que mais se prova nos pontos 23 a 44 e 56 a 60, pois se prova (ponto 45) que os danos descritos e o prejuízo calculado são consequência directa da publicação, entre outros, dos artigos redigidos pelos réus e a que se alude nos autos; l0ª - Igualmente se provou que, considerando a personalidade do autor; a sua condição de magistrado, o elevado apreço em que era tido; as suas classificações - as mais altas -, as referências elogiosas provenientes de inspectores judiciais, a sua profunda dedicação aos problemas dos menores e o seu incontestado respeito pela Lei, todas as condutas dos réus todas as suas referências, afirmações e imputações feitas nas noticias em causa nestes autos, constituem uma agressão fortíssima ao seu equilíbrio bio psíquico, deixando-o em estado de prostração; 11ª - Não havendo, como não há, quaisquer dirimentes, estio verificados todos os requisitos da responsabilidade civil dos réus.

    O douto acórdão recorrido violou, além do mais, o disposto nos art°s 70° e 483° e ss. do Código Civil.

    Os RR recorridos contralegaram, pugnando pela manutenção do julgado.

    II - Cumpre decidir.

    Como é sabido, são as questões postas nas conclusões das alegações do recurso que delimitam, em princípio, o seu âmbito.

    São estes os factos apurados: 1) Em 3 de Maio de 2001, pelo Ministério Público, foi intentada no Tribunal de Família e Menores de Braga, onde o autor era o único Juiz, uma acção de regulação de poder paternal, autuada com o n.º 135/2001, 2ª Secção, em que é requerido EE - (A) dos Factos Assentes); 2) Em conformidade, no dia 4 de Maio, foi proferida decisão provisória, confiando o menor à guarda e cuidados da mãe, estabelecendo-se o seguinte regime de visitas: "O pai poderá visitar livremente o menor, sem prejuízo das suas actividades, e tê-lo consigo em fins-de-semana alternados, entre as 10:00 H de Sábado e as 09:00 H de Domingo" - (B) dos Factos Assentes); 3) Desta decisão, foi o requerido EE notificado, pessoalmente, em 08 daquele mês de Maio - (C) dos Factos Assentes): 4) Em 04 de Julho os autos foram de novo conclusos, com a junção de um expediente pela GNR, a propósito de um eventual incumprimento, o que mereceu o seguinte despacho: "Desentranhe e devolva, pois é impertinente para estes autos, cabendo ao R. o exercício, perante o tribunal. da denúncia de eventuais incumprimentos." - (O) dos Factos Assentes): 5) Em 09 de Julho deu entrada um requerimento da Sr.ª Procuradora da República, denunciando que o réu ali manifestava "total indiferença e desrespeito pelos hábitos, horas de sono e de alimentação do menor, bom como pela privacidade da requerida, tem entendido o poder de visitar livremente o menor, como um direito total de a qualquer hora exigir estar e levar aquele menor e invadir a privacidade, nomeadamente a habitação e horários da requerida, de acordo unicamente com a sua vontade e disponibilidade.

    Além disso, o menor com apenas 5 meses de idade, é também amamentado pela mãe e o requerido vive numa residência universitária, o que não se compadece com a entrega do menor durante todo o fim de semana ao pai, por falta de condições que assegurem, designadamente, a sua alimentação.

    A conduta do requerido, conhecida deste tribunal, desde logo através dos elementos escritos que o mesmo tem junto ao processo administrativo respectivo, tem causado dificuldades e sérios transtornos à requerida, afectando consequentemente o bem-estar, desenvolvimento e cuidados devidos ao menor.

    Nestes termos, requer-se a V.ª Ex., que provisoriamente se limitem as visitas durante a semana às...

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