Acórdão nº 06S698 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelSOUSA GRANDÃO
Data da Resolução13 de Julho de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1- RELATÓRIO 1-1 AA intentou, no Tribunal de Trabalho de Lisboa, acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente do contrato individual de trabalho, contra "BB.", pedindo seja declarada a natureza laboral da relação jurídica firmada entre as partes - e a consequente ilicitude do seu despedimento - bem como a condenação da Ré a pagar-lhe as componentes retributivas pretensamente em dívida, que discrimina, e os respectivos juros moratórios, além de uma indemnização por danos morais, e da fixação de uma sanção pecuniária compulsória, ambas devidamente quantificadas.

A Ré excepcionou a competência material do foro demandado, dizendo que a relação estabelecida entre ela e o Autor não é de trabalho subordinado mas consubstancia, ao invés um contrato de agência e, com base nessa qualificação, reclama a improcedência total da acção e a condenação do Autor como litigante de má fé.

1-2 Instruída e discutida a causa, a 1ª instância proferiu sentença, em que começa por rejeitar a defesa exceptiva da Ré, cujo conhecimento fora relegado para final, após o que julgou parcialmente procedente a acção, em consequência do que: 1 - declarou que o contrato que unia o Autor à Ré era um contrato de trabalho; 2 - declarou ilícito o despedimento do Autor; 3 - Condenou a Ré a pagar-lhe o correspondente ao valor das retribuições, que o Autor deixou de auferir no período compreendido entre 11/9/02, e o trânsito da sentença (incluindo o valor das proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal referentes ao mesmo período), acrescido de juros de mora a contar desse trânsito, a liquidar em execução de sentença, fixando-se, para o efeito e como valor de referência, a retribuição mensal em € 1.192,16; 4 - Condenou a Ré a pagar ao Autor uma indemnização no valor de € 17.882,42, acrescida de juros de mora "... a contar da presente data"; 5 - mais a condenou a pagar ao Autor a quantia global de € 2.980,40, referente aos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal no ano de cessação do contrato de trabalho, acrescida de juros de mora, desde 31/10/01 até ao integral pagamento; 6 - julgou improcedente o pedido de condenação da Ré em indemnização por danos morais, de cujo pedido a absolveu, bem como o pedido de fixação de sanção pecuniária compulsória; 7 - por fim, considerou também infundado o pedido de condenação do Autor como litigante de má fé.

Em síntese, considerou a 1ª instância que os segmentos condenatórios, retributivos e ressarcitórios, acima transcritos decorriam da qualificação, que também operou, da relação jurídica firmada entre as partes como contrato de trabalho e do consequente despedimento ilícito de que foi alvo o Autor.

Inconformada com a decisão, dela apelou oportunamente a Ré: porém, sem qualquer êxito o fez, visto que o Tribunal da Relação confirmou integralmente a sentença apelada.

1-3 Continuando irresignada, a Ré pede a presente revista, em que reclama a sua absolvição integral por entender que o contrato ajuizado deve ser qualificado como "contrato de agência", sendo, consequentemente lícita a sua denúncia por banda da Ré.

Nesse sentido, remata a respectiva minuta alegatória com as seguintes conclusões: 1 - a recorrente impugnou especificamente todos os concretos pontos de facto que considera terem sido incorrectamente julgados; 2 - também precisou quais os meios probatórios, constantes do processo e do registo da gravação neste realizada, que impunham sobre os pontos da matéria de facto impugnados, decisão diversa da recorrida; 3 - a recorrente indicou os depoimentos em que se funda o recurso por referência ao assinalado na acta, precisando qual a cassete e o número de volta, 4 - impugnando, assim, a decisão sobre a matéria de facto no estrito cumprimento do art.º 690º - A do C.P.C.., 5 - da pena documental e testemunhal constante dos autos emergem todos os elementos caracterizadores do contrato de agência, nomeadamente: - que o recorrido se obrigou a promover a celebração de contratos; - que o recorrido, na sua qualidade de agente, actuou sempre por conta da recorrente; - que o recorrido gozava de autonomia na organização da sua actividade e do seu próprio trabalho; - que a relação contratual esclarecida entre ambos tinha carácter estável, tendo durado cerca de 10 anos; - que a retribuição auferida pelo recorrido nunca incluiu qualquer remuneração fixa; - que o recorrido, pelo menos desde 1989, já se encontrava inscrito na Segurança Social e colectado nas Finanças como trabalhador independente; 6 - o Acórdão recorrendo, ao caracterizar a relação contratual existente entre as partes, no período de 1992 a 2001, como contrato de trabalho, interpreta e aplica erradamente o disposto no art.º 1º do D.L. nº 49.408, de 24/11/69 e os art.ºs 1º, 6º e 7º do D.L. nº 178/86, de 3 de Julho na redacção que lhe foi dada pelo D.L. nº 118/93, de 13 de Abril; 7 - o presente recurso deve ser julgado procedente, revogando-se o Acórdão recorrendo e, consequentemente, deve ser ordenado que os autos baixem ao Tribunal "a quo" para que aí seja correctamente julgada a matéria de facto impugnada; 8 - Se assim se não entender e face à matéria de facto dada como provados, deve, mesmo assim, ser julgado procedente o recurso, revogando-se o dito Acórdão e decidindo-se, face ao acervo fáctico, apurado, que a relação existente entre as partes consubstancia um contrato de agência e não qualquer outro tipo legal.

9 - Além dos preceitos já supra citados, foram violados os art.ºs 519º e 690º A do C.P.C..

1-4 O recorrido contra-alegou, sustentando a improcedência total do recurso e a consequente confirmação do julgado.

1-5 No mesmo sentido se expressou a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta, a cujo Parecer a recorrente não respondeu.

1-6 Corridos os vistos legais legais, cumpre decidir.

2 - FACTOS As instâncias deram como provada a seguinte factualidade.

1 - o A. preenchia, a pedido da R., um relatório de despesas, pensado, criado e elaborado por esta; 2 - a R. pagava mensalmente, em média, ao A. uma quantia de € 150, em cheque ou em numerário, a título de despesas; 3 - o A. utilizava um cartão "Galp - Frota", fornecido pela R. e pago por esta, com um "plafond" médio de € 250 mensais; 4 - o A. enviou à R. em 31/8/01, a carta junta a fls. 57-60 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.

5 - carta, essa que não recebeu resposta da R.; 6 - o A. "barricou-se" nas instalações da R., sitas em Sacavém, atravessando um armário no meio do corredor; 7 - No dia 11/10/01, foi entregue ao A. o doc. junto a fls. 64, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e no qual consta, nomeadamente, que "... está dispensado de comparecer nas instalações da empresa ... até ao final do mês, de Outubro de 2001, prazo reputado bastante para esclarecer qual a situação contratual do mesmo (contrato de trabalho, contrato de prestação de serviços, contrato de agência ou outro) e, consequentemente, para pôr termo ao contrato que se concluir ser existente"; 8 - no dia 22/10/01, o A. recebeu da R. a carta junta a fls. 65, cujo conteúdo se dá integralmente reproduzido, constando nomeadamente da mesma - "Assunto: denúncia do contrato de agência (...), denúncia essa que produzirá efeitos a partir do próximo dia 31 do corrente mês de Outubro de 2001"; 9 - no dia 22/10/01, o A. remeteu à R. a carta junta a fls. 67, cujo teor se dá...

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