Acórdão nº 06P1796 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelJOÃO BERNARDO
Data da Resolução28 de Junho de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I - O arguido AA, foi condenado pelo Tribunal Colectivo de Bragança, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p.p. pelos art°s 21° e 24° h) do DL n.º15/93 de 22/1 e Lei 45/96 de 3/9, e art° 54° da Lei 11/04 de 27/3, e art°s 75° e 76° CP, na pena de: Sete anos de prisão.

II - Recorre directamente para este Supremo Tribunal, concluindo a respectiva motivação do seguinte modo: - Da audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos: … A enumeração factual vai fazer-se abaixo.

- Face ao provado e não provado, há que ponderar, em nosso modesto ver, ao seguinte: 1 - A circunstância de os factos terem ocorrido no interior do estabelecimento prisional (por recluso) não produz o efeito qualificativo automático do artigo 24° h) do D.L 15/93 de 22/1.

2 - Assim, a conduta do recluso, a quem foram encontrados três embrulhos "panfletos", em plástico, que continham 0,213 g de "heroína" (sem que se haja provado que os destinava à venda a outros reclusos), deve ser subsumida ao tipo do artigo 25° do Decreto-lei 15/93 de 22 /1.

3 - Na verdade, o arguido vem acusado da autoria de um crime de tráfico de estupefacientes, agravado p. e p. pelo artigo 21 e 24 al. a) do referido decreto-lei.

4 - Por esse crime foi-lhe aplicada a pena de sete anos de prisão.

5 - No entanto, é de crer, que à respectiva conduta deve antes ser integrada no crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25°, daquele diploma.

5.1 - Não se compreende, nem é inteligível, tal condenação, já que se deu como não provado que a heroína apreendida se destinasse ao fornecimento a outros reclusos, seus clientes.

6 - Desta forma, "a avaliação da ilicitude não pode deixar de envolver uma avaliação global de todos os elementos que interessam àquele elemento do tipo, tanto no domínio do direito penal da droga como em qualquer outro. Aqui, como em qualquer outro campo do direito penal, não bastará, seguramente, a presença de uma circunstância, fortemente atenuante ou especialmente agravante para considerar preenchido um daqueles conceitos. A imagem global do facto, no que se refere à sua ilicitude, é que é decisiva." - Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça ano XIII - Tomo 1 /2005, página 225 de 30 de Março 2005.

7 - Nesta perspectiva, vejamos os factos relevantes para a formação do juízo sobre o grau de ilicitude da conduta do arguido: 8 - No dia dos factos, no interior do EP de Izeda, onde o arguido cumpre pena, foram-lhe encontrados 3 embrulhos "panfletos", em plástico, que continham 0,213 g de "heroína"; 9 - Não se provou que a "heroína" apreendida fazia parte de lote de quantidade superior; 10 - Não se provou que o arguido destinava essa droga para a fornecer e vender a outros reclusos; 11 - Não se provou que daquele lote, o arguido já havia fornecido a colegas reclusos não identificados, a "heroína" em outros três embrulhos do género.

12 - Perante tudo isto constata-se que: A quantidade de droga detida é muito diminuta; A modalidade de acção é a menos grave das descritas no tipo fundamental; Os meios utilizados são os mais simples - droga guardada nas sapatilhas; A finalidade da detenção da droga, por desconhecida, terá de se considerar a menos grave (in dubio pro reo); Tudo se passou no interior de uma cadeia.

13 - Nos crimes de perigo, como é classificado o crime ora em questão - tráfico de estupefacientes - a protecção é recuada a momentos iniciais da acção, independentemente da produção de qualquer resultado - Cfr. Acórdão do STJ de 30.06.04, pag.2242/04 da secção criminal.

14 - O artigo 24° alínea h) do DL 15/93, de 22/01, estabelece a circunstância de a infracção ter sido cometida em estabelecimento prisional, situação paradigmática dessa intenção.

15 - Desta forma, a posse de droga em estabelecimento prisional, por quem lá cumpre pena de prisão, constitui um facto particularmente perigoso, se a finalidade do agente é disseminá-la pela população prisional, seja pela indiferença que revela pelos fins da pena que cumpre, seja, como nos parece mais apropriado ao bem jurídico protegido com a incriminação, pelo perigo que isso representa para saúde dos detidos. - Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, ano XIII - Tomo 1 /2005, página 225, de 30 de Março 2005.

16 - Ora como se retira da douta decisão recorrida não ficou provado que o arguido destinava a referida heroína ao fornecimento a outros reclusos.

17 - Por outro lado, se o acima referido é "fundamento da agravação então, é de concluir que a circunstância da infracção ter sido cometida em estabelecimento prisional, não produz efeito qualificativo automático, antes exigindo a sua interpretação teleológica, por forma a verificar se a concreta modalidade da acção, a concreta infracção, justifica o especial agravamento da punição requerida pelo legislador". Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, ano XIII - Tomo 1 / 2005, página 225, de 30 de Março de 2005.

18 - É do entendimento do Supremo Tribunal de Justiça que desta situação possa resultar uma potencialidade fortemente agravante.

19 - Tendo em conta que nos presentes autos não vem provado que o arguido tivesse a droga para distribuir pelos outros reclusos.

20 - Segundo o mesmo entendimento a simples detenção, que no caso "sub Júdice"é o que resulta da matéria de facto provada, não assume esse significado.

21 - Também não ficou esclarecido se a referida droga era utilizada para consumo próprio, uma vez que o arguido declarou que a mesma não era para seu consumo, não tendo tal declaração merecido credibilidade ao Tribunal "a quo".

22 - No entanto, é também, do entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, que não será de avançar para a afirmação de que o arguido detinha a droga para consumo.

23 - Mas é completamente vedado a ideia de equacionar qualquer hipótese de tráfico.

24 - O Supremo Tribunal de Justiça entende que sendo a modalidade delituosa a menos grave das configuradas no tipo (uma vez que não ficou provado que a heroína se destinava a...

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