Acórdão nº 06P1043 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Junho de 2006
Magistrado Responsável | RODRIGUES DA COSTA |
Data da Resolução | 01 de Junho de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
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RELATÓRIO 1.
No 3.º Juízo Criminal da Comarca de Cascais, foi julgada a arguida AA, filha de …….. e de …….., cidadã estrangeira, nascida em Cabo Verde no dia 26.1.1949, solteira, sem profissão definida, residente na Avenida ………, n.º ….-…. B, Portela, 2795 Carnaxide, em regime de prisão preventiva à ordem deste processo entre 14.04.05 e 15.07.05 e, desde então, sujeita à obrigação de permanência na habitação com controlo electrónico. No final, foi condenada pela prática do crime de tráfico de estupefacientes do art. 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22/1 na pena de 4 (quatro) anos de prisão e na pena acessória de expulsão e interdição de entrada no território nacional pelo período de 5 (cinco) anos.
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Inconformada, interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo assim a sua motivação: a) Atendendo aos princípios gerais de direito e à tão visada reinserção social, afere-se como excessivamente gravosa e, acima de tudo, contraproducente a medida da pena aplicada à ora recorrente; b) Ao contrário do que julgou o Tribunal a quo, na decisão ora recorrida, entende-se ser possível fazer-se o tal juízo de prognose favorável à reintegração social da arguida; c) Salvo o devido respeito, não foram levados em consideração os critérios enunciados no n° 2 do artigo 71° do C.P.; d) Nomeadamente no que diz respeito ao disposto na sua alínea d); e) A própria condição pessoal do agente, é de molde a decidir-se por medida que contribua para a reintegração e não para a segregação, cumprindo-se assim o disposto no artigo 40° do C;P.; f) Acresce o facto de não se ter provado o período de tempo a que se dedicava à prática desta actividade, tendo-se a provado que ocorreu no dia em que foi detida; g) Tão pouco foram levadas em consideração as circunstâncias pessoais que, depondo a favor da recorrente, concorriam para uma atenuação da pena; h) O doseamento da pena arbitrado pelo tribunal a quo denuncia uma nítida violação do princípio da proporcionalidade das penas; i) A este respeito, desde já se advoga que as normas constitucionais que se consideram violadas são as vertidas no n° 2 do artigo 32°, n° 6 do artigo 29° e n.° 4 do artigo 30° da Constituição da República Portuguesa.
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Crê-se que estão reunidas as condições de facto e de direito para uma efectiva atenuação da pena.
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Assim e nestes termos é forçoso colocar a hipótese de suspensão da pena, ao abrigo do artigo 50°, n° 1 do C:P.,concluindo-se, como pugnamos, que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
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Relativamente à pena acessória de expulsão, a mesma não se encontra suficientemente fundamentada, além de olvidar razões de natureza familiar e pessoal que justificam a permanência da arguida em Portugal, devendo por isso ser revogada.
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Concretizando, a expulsão decretada à arguida parece resultar da interpretação segundo a qual da condenação pelo crime de tráfico p,p. nos termos do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro, decorre necessariamente a expulsão do país.
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Ainda que não tivesse sido essa a interpretação que esteve na base da decisão de expulsão pelo período decretado, a parca e assaz genérica fundamentação quanto aos motivos que, na sua concretude, presidiram à decisão recorrida, apontam no sentido já sublinhado.
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Aliás, o entendimento que, ao que parece, esteve na base da decisão de expulsão, mereceu já a veemente censura do Tribunal Constitucional, melhor expressa no Ac.93-359.2 TC, de 25 de Maio de 1993, quando por via, daquele se julgou inconstitucional a norma constante do artigo 34°, n° 2 do Decreto-Lei n° 430/83, de 13 de Dezembro, interpretada .no sentido de que a condenação de um estrangeiro pelo crime de tráfico, tem como efeito necessário a expulsão do País.
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Aquele Tribunal Constitucional estribou a sua posição na estatuição consagrada no nº 4 do artigo 30° da Constituição da República Portuguesa, onde se estabelece que nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos, abrangendo tanto os efeitos ligados a certas penas como os ligados à condenação por certos crimes, "pretendendo-se com tal preceito proibir que, em resultado de quaisquer condenações penais, se produzisse «ope legis» a perda daqueles direitos".
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Como resultado daquela decisão constitucional veio a ser conferida, por via da publicação do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro, actualmente em vigor, uma nova redacção ao artigo 34°, desta feita conforme com o Texto Constitucional, de onde resulta que ao julgador assiste a faculdade de poder ordenar a expulsão do País.
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Tal significa, em abono do princípio do Estado de Direito democrático, e do princípio vigente por via do artigo 15°, n° 1 da C.R.P., de igualdade de tratamento, ou até por força do princípio político-criminal de luta contra o efeito estigmatizante, dessocializante e criminógeno das penas, que se apresenta indiscutível que a nossa Constituição político-criminal, através do artigo 30°, n° 4 da C.R.P., não aceita que a condenação de alguém em pena superior a três anos de prisão, implique sem mais (automaticamente, necessariamente) a sua expulsão.
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(…) A insuficiente fundamentação da decisão de expulsão parece querer "ressuscitar" uma interpretação contrária à letra e ao espírito da Constituição da República Portuguesa, e bem assim...
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