Acórdão nº 05B4325 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Março de 2006
Magistrado Responsável | ARAÚJO BARROS |
Data da Resolução | 23 de Março de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "AA" intentou, no Tribunal de Família de Lisboa, acção com processo especial de divórcio litigioso contra BB, pedindo que seja decretado o divórcio entre si e o réu, com culpa exclusiva deste.
Alegou factos, em seu entender, constitutivos de violação dos deveres conjugais pelo réu, por forma a comprometer as possibilidades de vida em comum.
Realizada tentativa de conciliação, na qual não foi possível conciliar os cônjuges, contestou o réu impugnando praticamente todos os factos alegados pela autora ou dando acerca deles diferente versão.
Deduziu reconvenção, pedindo o decretamento do divórcio, mas com culpa exclusiva da autora, por haver sido esta a praticar factos violadores dos deveres conjugais, de forma comprometedora das possibilidades de vida em comum.
Após prolação do despacho saneador e selecção da matéria de facto assente e controvertida, foi realizado o julgamento e foi proferida sentença que julgou procedente por provada a acção e improcedente por não provada a reconvenção e, consequentemente, decretou o divórcio entre AA e BB, declarando este único culpado.
Inconformado, apelou o réu, sem êxito, porquanto o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 1 de Março de 2005, julgou improcedente a apelação e confirmou a decisão impugnada.
Interpôs, então, o réu recurso de revista, arguindo a nulidade do acórdão e pedindo a sua revogação e substituição por decisão que considere a acção improcedente e, no limite, decrete o divórcio com culpas divididas de igual forma entre ambos os cônjuges.
Em contra-alegações defendeu a recorrida a bondade do julgado.
Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.
É, em princípio, pelas conclusões das alegações do recurso que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil.
Das conclusões formuladas pelo recorrente - que, à semelhança do que já aconteceu na apelação, pouco mais são que "uma crítica ao julgamento da matéria de facto e de conhecimentos sobre o modo como o juiz deve julgá-la, misturando questões de facto e de direito" (cfr. acórdão recorrido) - podem ver-se, no essencial, suscitadas as seguintes questões: I. A extemporaneidade das contra-alegações da recorrida de que o recorrente pretende extrair a nulidade do processo e do acórdão impugnado.
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A impossibilidade para o tribunal de concluir perante a matéria de facto provada pela existência de qualquer violação de deveres conjugais por parte do recorrente susceptível de fundamentar a decretação do divórcio com culpa sua.
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A falta de conhecimento pelo acórdão recorrido da caducidade da acção, acerca da qual oficiosamente devia ter-se pronunciado.
No acórdão recorrido foram tidos como assentes os seguintes factos: i) - a autora e o réu contraíram casamento católico, sem convenção antenupcial, no dia 19/03/1983; ii) - na constância do casamento nasceram CC, em 06/06/1984, e DD, em 17/02/1992, filhas da autora e do réu; iii) - com frequência não apurada, o réu jantava fora de casa sem avisar previamente a autora; iv) - o réu saía à noite, nos dias úteis e fins-de-semana, e regressava por volta da 2, 3, 4 ou 5 horas da manhã; v) - em 11/02/2000, o réu bateu na filha CC, por esta ter faltado às aulas, e, tendo-se a autora interposto entre ambos, para suster a agressão, o réu partiu-lhe um dedo da mão, sem que se apurasse exactamente o restante circunstancialismo em que o fez; vi) - pelo menos uma vez, em data não apurada, o réu referiu-se à autora, perante terceiros, rebaixando-a e dizendo que estava maluca; vii) - em datas não exactamente apuradas de 2001, o réu ameaçou e insultou, por forma não exactamente apurada, a autora, o que provocou receio nesta e nas filhas do casal; viii) - perante a degradação das relações conjugais e por causa do receio que sentia, a autora, em 20/11/2001, abandonou a casa de morada de família e foi viver com os pais, em casa de uma irmã; ix) - desde, pelo menos, há seis ou sete anos, o réu mantém um relacionamento amoroso com uma senhora de nome EE, que foi ama das suas filhas, passeando-se publicamente com ela; x) - embora o réu por vezes fosse levar as filhas à escola ou ao médico, era fundamentalmente a autora que as acompanhava na vida do dia-a-dia e nos estudos e vigiava a sua saúde; xi) - quando a autora se deslocava ao estrangeiro, deixava previamente organizada a vida das filhas; xii) - o réu opunha-se às consultas de psicologia que a filha CC frequentava, negando-se a pagar as mesmas e a falar com a psicóloga; xiii) - no último ano de vida em comum, o réu tomou algumas refeições, num tabuleiro, vendo televisão e não se sentando à mesa com a família; xiv) - nesse mesmo período, por depressão causada pela vivência conjugal, a autora teve que procurar apoio psicológico; xv) - ao que o réu se opunha, tentando evitar que as consultas fossem pagas através da conta bancária comum; xvi) - no dia 19/11/2001, o réu disse à autora que, no dia seguinte, não deveria estar em casa, por ser o dia do aniversário dele e querer ali fazer um jantar de família; xvii) - nos meses de Fevereiro, Março e Abril de 2003, a prestação mensal de reembolso dos empréstimos contraídos pelo casal, para a aquisição da fracção autónoma onde o réu tem instalado o seu estabelecimento comercial, foi...
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