Acórdão nº 05B2208 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução17 de Novembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Por apenso aos autos de falência n° 499/2002, a correr termos pelo 2° Juízo do Tribunal Judicial de Ílhavo, em que é requerida "Empresa-A", foi apresentada por "Empresa-B" reclamação de créditos, do montante de 41.464,71 Euros, relativo ao fornecimento de combustíveis e óleos lubrificantes.

O crédito reclamado não foi impugnado e, consequentemente, por decisão de 17/05/2004, certificada de fls. 69 a 84, foi considerado verificado e graduado como comum.

Inconformada, a "Empresa-B" recorreu, pretendendo que o seu crédito fosse graduado, em relação ao produto da liquidação do navio "...", em 1° lugar, tal como aconteceu com os créditos de "Empresa-C" e AA, referentes a reparações efectuadas ao mencionado navio e seus motores.

Conhecendo do recurso, o Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdão de 11 de Janeiro de 2005, decidiu julgá-lo improcedente, mantendo a decisão recorrida.

Interpôs, então, aquela reclamante recurso de revista, pugnando pela revogação do acórdão recorrido.

Não houve contra-alegações.

Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.

Nas alegações do recurso formulou a recorrente as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. O acórdão recorrido violou as normas dos arts. 574º, n° 7 do 578° e 579° do Código Comercial e do art. 604° do Código Civil devido a erro de interpretação ou de aplicação da norma prevista no § único do art. 578° do Código Comercial.

  1. O crédito da recorrente é um crédito que goza de privilégio creditório sobre o navio "..." por corresponder a despesas de custeio a ele relativas, nos termos do n° 7 do art. 578° e do art. 574°, ambos do Código Comercial.

  2. Pelo que a recorrente tem preferência no pagamento pelo produto da venda do referido navio relativamente aos credores comuns ou quirografários da sociedade falida sua proprietária, nos termos do art. 604° do Código Civil.

  3. O § único do art. 578° do Código Comercial não pode ser interpretado no sentido de restringir os privilégios creditórios sobre o navio, elencados nos n°s 1 a 9 do mesmo dispositivo, às dívidas relativas à última viagem do mesmo ou aos que se constituíram por motivo dela.

  4. Essa norma não pode, assim, ser interpretada fora do dispositivo legal em que se integra, o art. 578° do Código Comercial, que trata da graduação das dívidas com privilégio sobre o navio, ou seja, determina a prevalência dos diversos créditos privilegiados sobre o navio consoante o número de ordem ou a classe em que se integram.

  5. O legislador não transcreveu o advérbio "somente", que existia no art.

    1300° do Código de 1833, fonte do § único do art. 578° do Código Comercial.

  6. Assim, o § único do art. 578° do Código Comercial apenas vem estabelecer, para os n°s 1 a 9 do mesmo preceito, um critério, assente na última viagem do navio, para determinar a prevalência dos créditos dentro da mesma classe.

  7. Desta forma, os créditos mencionados nos n°s 1 a 9 (o que inclui o crédito referido no n° 7) são sempre privilegiados, embora os relativos à última viagem e constituídos por motivo dela prevaleçam sobre os que se constituíram em viagens anteriores, conforme bem tem entendido a doutrina e, unanimemente, a jurisprudência dos tribunais superiores.

  8. É também esse o sentido com que o art. 6° da Convenção Internacional para a unificação de certas regras relativas aos privilégios e hipotecas marítimos, assinada em Bruxelas em 10 de Abril de 1926, utiliza o conceito de última viagem.

  9. Doutra forma, estar-se-á, por absurdo, a admitir que os privilégios creditórios previstos nos n°s 1 a 9 do art. 578° do Código Comercial se extingam a cada nova viagem do navio, ou seja, fora dos casos do art. 579°.

    11 Tal entendimento atenta contra a lei, contra o princípio da justiça e contra a certeza e segurança jurídicas, enquanto valores que o Direito deve tutelar.

  10. O acórdão recorrido devia, assim, ter determinado que o crédito da recorrente fosse graduado em primeiro lugar, juntamente com os dos demais credores privilegiados pertencentes à mesma classe em que se insere o crédito do recorrente.

    Com interesse para a decisão, considerou o Tribunal da Relação assentes os seguintes factos: i) - por sentença de 04/12/2002, proferida nos autos de falência n° 499/2002, do 2° Juízo do Tribunal...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT