Acórdão nº 02A4254 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Janeiro de 2003

Magistrado ResponsávelFARIA ANTUNES
Data da Resolução28 de Janeiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça "A" - Equipamentos e Instalações Industriais, Ldª instaurou contra B, acção ordinária, pedindo a condenação desta a pagar-lhe 12.700.107$00, com juros à taxa legal contados da data da sua citação. Alegou, em síntese, ter-lhe sido confiada uma subempreitada, na construção do edifício destinado à instalação da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Castelo Branco, pela empreiteira C e quando já tinha parte dos materiais instalados na obra, foi-lhe comunicado que a empreiteira passaria a ser a ré, por trespasse, tendo-lhe esta solicitado a apresentação da sua "melhor proposta para a eventual continuidade dos trabalhos". Porém, a ré não tinha a intenção de manter, em condições algumas, a subempreitada da autora, pois concedeu-lhe um prazo exíguo para responder e quando lhe dirigiu a consulta já havia adjudicado a subempreitada a outra empresa do seu grupo; e manipulou o direito para si resultante da cessão da posição contratual na escolha das suas subempreiteiras, por forma abusiva, ferindo gravemente os interesses da autora, agindo em abuso de direito; e locupletou-se ilicitamente à custa da autora, que pretende ser ressarcida dos custos que teve com a preparação da sua proposta para a C, bem como do valor dos lucros esperados na execução da subempreitada; pela perturbação que na sua máquina administrativa causou a ilícita conduta da ré, traduzida em custos inesperados, perdas de tempo, delicadas negociações para anulação de encomendas já tornadas firmes e pelos danos provocados na sua imagem. Contestou a ré pedindo a improcedência da acção. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente. Apelou a autora para a Relação de Lisboa que concedeu parcial provimento ao recurso, revogando a sentença e condenando a ré a pagar à autora a indemnização de 16.303,60 Euros, equivalentes a 3.268.579$00, acrescida dos juros de mora vencidos desde 23.1.95- às taxas legais de 15% desde 23.1.95 até 30.9.95, de 10% de 1.10.95 até 17.4.99, e de 7% desde 18.4.99 até integral pagamento- e vincendos até integral pagamento. Inconformada, recorreu a ré de revista, tirando as seguintes Conclusões: 1) O fundamento da condenação da recorrente é, exclusivamente, o abuso de direito, instituto à luz do qual sempre foi ponderada, nos presentes autos, a conduta da recorrente; 2) O abuso de direito é um princípio geral de recurso extremo, excepcional, para mais num domínio codificado do Direito, com normas jurídicas que permitem dirimir o litígio objecto do processo; 3) As normas jurídicas directamente aplicáveis à matéria em apreço nos autos negam a pretensão da recorrida, pois a cessão da posição contratual no contrato de empreitada não envolve a transmissão automática, ope legis, das posições contratuais detidas pelo empreiteiro cedente nos diversos contratos de subempreitada; 4) Actua abusivamente quem excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito que exerce, o que pressupõe a existência e a titularidade do poder formal que constitui a substância do direito subjectivo, o exercício desse poder em absoluta, manifesta ou clamorosa contradição com o fim (económico ou social) a que esse poder se encontra adstrito ou com o condicionalismo ético-jurídico (boa fé e bons costumes) a que esse poder está vinculado; 5) O direito cujo exercício abusivo se imputa à recorrida é a faculdade de contratar e de escolher com quem contrata, domínio por excelência da liberdade de actuação, enquanto elemento estruturante da autonomia privada; 6) As limitações à liberdade de contratar são, por isso, excepcionais e devem decorrer, implícita ou explicitamente, da lei; 7) Considerar abusivo o exercício da faculdade de contratar representa, in casu, impedir esse exercício: se tem de manter o contrato de subempreitada e não pode escolher como parceiro nesse contrato senão a recorrida, então a recorrente não pode escolher o seu parceiro contratual, isto é, não tem liberdade contratual; 8) A aplicação do instituto do abuso de direito redundaria, por isso, não na limitação do direito, mas no seu despojamento, na sua frustração; 9) Só é abusivo o exercício do direito quando se mostre evidente, clamorosa, gritante, a divergência entre o resultado daquele e alguns dos valores impostos pela ordem jurídica para a generalidade dos direitos ou, pelo menos, dos direitos de certo tipo; 10) Tendo exercido a liberdade de contratar e de escolha do contraente contratando e escolhendo um contraente, não se vê como pode essa escolha ser entendida como manifestamente contrária aos valores impostos pela ordem jurídica para os direitos deste tipo, que são sobretudo os valores da liberdade e da autonomia; 11) É abusivo o exercício do direito que exceda manifestamente os limites impostos pelo fim social ou económico do direito subjectivo que se...

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