Acórdão nº 0110/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução21 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. A…, veio interpor recurso da sentença, proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (TAFL) - 4º Juízo Liquidatário que julgou improcedente a acção ordinária, ali proposta pela ora recorrente contra o Município de Lisboa, para efectivação de responsabilidade civil por acto lícito, pedindo a condenação do Réu no pagamento da quantia de Esc. 29.610.000$00, acrescida de juros legais, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos, com perda de clientela e facturação, no estabelecimento comercial da recorrente, situado na Avenida João XXI, em consequência das obras de desnivelamento daquela artéria, relacionadas com a construção do túnel subterrâneo de ligação entre a Praça do Campo Pequeno e a Praça do Areeiro, em Lisboa.

    Apresentou alegação, constante de fls. 548 a 554, dos autos, e na qual formulou as seguintes conclusões:

    1. O caso discutido na acção é um caso paradigmático de responsabilidade civil por causa de obra pública, cuja solução deve observar o princípio estabelecido no Artigo 22° da CRP - quadro em que se move a disciplina jurídica prevista nos Artigos 8° e 9° do Decreto-Lei nº 48051, de 21 de Novembro; b) da obra realizada na Av. João XXI em Lisboa, resultaram para a Alegante os prejuízos peticionados, comprovados documentalmente pelo relatório junto aos autos a fls.-; c) Com efeito, na douta sentença recorrida dá-se como assente, pois, a conclusão deduzida na prova produzida que da obra em causa resultaram prejuízos para a Alegante e que entre a obra e esses prejuízos há um nexo de causalidade.

    2. Por outro lado, da matéria assente na acção, resulta que a CML reconheceu a existência dos danos directamente resultantes da obra e o seu dever de indemnizar em negociações com a União das Associações de Comerciantes do Distrito de Lisboa - Al. h) e e) que na sequência desse reconhecimento propôs a atribuição de uma indemnização de Esc. 200 mil a cada comerciante - Al. dd); f) A generalidade enquanto elemento diferenciador em que se densifica o conceito de dano especial previsto no Artigo 9° do Decreto-Lei 48051, não exclui o efeito danoso a categorias ou grupos de cidadãos; g) O prejuízo especial de que fala o apontado preceito legal não afasta os danos sofridos pela Alegante, só porque tenham também afectado outros - não sabemos se todos - comerciantes da Av. João XXI.

    3. Essa limitação não se contém no Artigo 22° da CRP.

    4. O parâmetro de comparação não são esses comerciantes da Avenida, mas sim os restantes comerciantes da Lisboa.

    5. Ou seja, o critério em que se deve concretizar o conceito de prejuízo especial deve assentar numa relação não restritiva ao espaço em que a obra se localiza, mas sim à cidade em que mesma tem lugar.

    6. Com efeito, é aí que a relação risco-proveito da obra se coloca e não no espaço restrito da Avenida João XXI, por um lado e, l) por outro, que o parâmetro do princípio da igualdade opera como critério diferenciador de valor e de onde deve partir a solução a dar ao caso em discussão na acção.

    7. A anormalidade dos prejuízos sofridos pela Alegante resulta da circunstância de a obra do túnel da Av. João XXI em Lisboa ter durado mais de um ano e nas condições em que teve lugar, o que foi a sua causa directa, como a douta sentença recorrida o reconhece.

    8. Admitir-se - como o faz a douta sentença recorrida -o conceito redutor de prejuízo especial para os efeitos do Artigo 9° do Decreto-Lei nº 48051, impõe a conclusão de que este preceito é supervenientemente inconstitucional, do ponto de vista material, por ofensa directa do Artigo 22° da CRP .

    9. A douta sentença recorrida, ao decidir como decidiu, viola o Artigo 22° da CRP e os Artigos 8° e 9° do Decreto-lei nº 48051.

    Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências que / desde já se invoca, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente e, em consequência, a douta sentença recorrida anulada, com todos os efeitos legais aplicáveis, com o que será feitaJustiçaO recorrido Município de Lisboa apresentou contra-alegação, na qual formulou as seguintes conclusões: a)- De acordo com o art. 9° do DL n° 48 051, a actuação legítima dos órgãos administrativos, regra geral, não pode abrir direito à indemnização.

    b)- Só no caso de esses prejuízos serem anormais ou especiais é que serão indemnizáveis.

    c)- Só quando um prejuízo se revista de certo peso ou gravidade, ultrapassando os limites daquilo que um cidadão tem de suportar enquanto membro da comunidade, ou seja, que vá para além dos encargos sociais normais, é que pode ser considerado prejuízo anormal.

    d)- O prejuízo especial ou anormal é aquele que não é imposto à generalidade das pessoas, mas que vai somente incidir, de forma desigual, sobre um determinado indivíduo ou grupo. Cf. os Acórdãos do STA nesse mesmo sentido: 12.7.94, 24.1.95, 14.6.95, 2.2.00, 8.3.00, 25.5.00, 27.6.00, 27.9.00, 16.5.02, 10.10.02, 21.1.03 e 29.5.03, resp. procs. nºs 32.911, 32.873, 36.833, 44.443, 39.869, 41.420, 44.214, 509/02, 48.404, 990/02 e 688/03 - in acórdão que agora se junta sob doc. n° 1.

    e)- O Município de Lisboa executou obras de desnivelamento da Av. João XXI, no quadro da obra da abertura do túnel subterrâneo que liga a Praça do Campo Pequeno à Praça do Areeiro, para permitir uma melhor circulação de automóveis e mais estacionamentos subterrâneos na Praceta junto do antigo Cinema Roma.

    f)- Tais obras decorreram durante um período de cerca de 9 meses, o que, apesar das mesmas, sempre foi permitido o acesso ao estabelecimento da A, tal qual consta dos pontos ee), ff), gg), hh) da matéria de facto dado como assente e provada.

    g)- Ora, os prejuízos invocados pela A não se apresentam como especiais ou anormais, tal qual como é exigido pelo art. 9° do DL n° 48 051.

    h)- As obras em causa não colocaram a A. numa situação de desigualdade, face aos demais munícipes, moradores e outros comerciantes do local.

    i)- Esteve bem a sentença ao decidir que "Por um lado os danos sofridos pela A. foram semelhantes à que a generalidade das demais empresas e lojas comerciais terão sofrido em consequência das obras na Av. João XXI; doutro passo, não se afigura que as perdas e sacrifícios patrimoniais que a A. invoca (e que de resto não logrou provar em toda a sua plenitude) possam considerar-se anormais por efeito da sua gravidade." j)- As obras em questão para além de afectarem um conjunto de pessoas, quer moradores e comerciantes, e não uma só em especial, tal como pretende a A., também irão beneficiar mais e compensar mais todos aqueles que com aquelas sofreram, pelas vantagens que advêm da intervenção viária do Município.

    l)- O Município actuou tendo em vista o interesse público que lhe cabe prosseguir, mais concretamente a manutenção das vias de circulação e as condições de fluidez de tráfego, sob pena de, e mesmo actuando de forma lícita, caso fosse condenado a indemnizar a A., deixar de prosseguir e actuar no desenvolvimento do Concelho! m)- Não houve uma verdadeira ruptura da igualdade na repartição dos encargos públicos que justifique a indemnização à A.

    n)- A A. não foi certamente uma vítima e não foi "eleita" para suportar sozinha o efeito nocivo do que é decidido em benefício de todos.

    o)- Nesse mesmo sentido se pronunciou o acórdão do STA, de 5 de Novembro de 2003, Proc. n° 1100/02, de que se junta cópia.

    p)- Quanto à invocada inconstitucionalidade do art. 9° do DL n° 48 051, de 21 de Novembro de 1967, é manifesto que tal não se verifica, pois a seguir-se a tese da recorrente teríamos que o Estado e as demais entidades públicas seriam obrigadas a indemnizar todo e qualquer cidadão que sofresse prejuízos ou...

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