Acórdão nº 0225/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução12 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A…, B…, …, … E … intentaram, no Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, acção de responsabilidade civil contra a Câmara Municipal de Vale de Cambra, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 301.594,14, acrescida dos juros legais vencidos desde a citação até integral pagamento.

Por sentença do T.A.C. de Coimbra, proferida a fls. 159 e segs., foi julgada parcialmente procedente a acção e, em consequência, condenada a Ré a pagar aos autores a quantia de € 188 670,34 (cento e oitenta e oito mil, seiscentos e setenta euros e trinta e quatro cêntimos) acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Inconformada com a decisão a Ré interpôs o presente recurso jurisdicional para este Supremo Tribunal, apresentando alegações com as seguintes conclusões: "

  1. Existe nulidade da sentença sub judice, porquanto há oposição entre os factos e a decisão. Aqueles contradizem-se entre si no que se refere à matéria que integra os quesitos 1.º e 3.º com o 4.º e respectivas respostas, além da parte da Fundamentação onde se diz que "não se provou que houvesse uma real intenção de continuar a construção", enquanto na decisão se tem por assente que os autores iriam construir mais dois andares, cada um com dois apartamentos de tipologia T3, destinados a venda.

  2. Acresce que existe igualmente contradição no que respeita às respostas aos quesitos 5.º a 8.º, com as que foram dadas aos 14º e 15.º, que vão estar em oposição com o que foi decidido nessa parte, mesmo depois de se referir que "o custo da pintura a realizar não se conseguiu apurar". Impunha-se, quando muito, que esse valor fosse relegado para execução de sentença.

    Por outro lado, e sem prescindir; C) A matéria dada como provada não encerra todos os elementos, que se tornam necessários a uma decisão definitiva sobre as questões colocadas, o que obrigará, em última instância, a relegá-la para execução de sentença.

  3. Desde logo, os recorridos não lograram provar que "adjudicaram a conclusão dos dois pisos que restavam construir..." - resposta não provado ao quesito 1º, além de que "não se provou que houvesse uma real intenção de continuar a construção", como se extrai de parte da Fundamentação das respostas à matéria da Base Instrutória.

  4. O que está em franca contradição com o que vem referido na sentença sub judice, quando aí se diz que "Resulta dos elementos do processo que os autores iriam construir mais dois andares, cada um com dois apartamentos de tipologia T3, destinados à venda".

  5. De qualquer dos modos, sempre a matéria dada como assente não encerra todos os elementos necessários à determinação, e muito menos fixação, de uma indemnização aos recorridos.

  6. Já que o lucro num qualquer negócio não passa por uma simples conta de subtracção, como acabou por fazer o Mm° Juiz a quo, ao concluir que "Retirando ao valor total da venda o preço de custo da construção chegamos ao lucro que deixaram de auferir e que é, no total, de 184 195,34 €".

  7. O Mmº Juiz não ponderou os diversos factores de produção e, desde logo, o que vem provado no quesito 16º, já que o terreno respectivo é um desses elementos, para além do preço dos projectos de arquitectura, de especialidades e das infra-estruturas, sem contar com os juros bancários, despesas com escritura e registo de hipoteca bancária e encargos fiscais - todos eles conhecidos como custos a abater ao lucro I) Além de que qualquer eventual lucro, pois muitas vezes quem constrói não o obtém, pressupõe a construção efectiva, a vontade de vender e, em última instância, a venda efectiva - e isto não está de todo provado.

  8. Obter um lucro líquido como aquele que foi atribuído aos aqui recorridos, sem os inerentes encargos financeiro e fiscal, nem outros custos de produção, representaria uma enorme injustiça, pois que não é esse, de facto, o seu prejuízo real.

  9. A determinação do quantum indemnizatório justo passa necessariamente pela sua liquidação em execução de sentença, pois os autos não contêm os elementos necessários e suficientes a esse fim.

  10. A sentença sub judice violou o disposto nos artigos 659°-2, 661-2 e 668º-1,c), todos do Cód. Proc. Civil." Os Autores, ora recorridos, contra-alegaram, pela forma constante de fls. 186 a 188, sustentando o improvimento do recurso.

    A Excelentíssima Magistrada do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal Administrativo emitiu o parecer nos seguintes termos: A meu ver, improcede a alegação da recorrente.

    Na verdade, esta invoca, em síntese, que a sentença "sub judice", violou o disposto nos artºs. 659 nº 2, 661 nº 2 e 668 nº 1 al. c), todos do C.P.C., pelo que, deve ser declarada a sua nulidade ou, caso assim se não entenda, deve ser revogada e substituída por decisão que relegue a liquidação da indemnização aos recorridos, em execução de sentença.

    Importa, no entanto, desde já referir que não tendo a recorrente apresentado qualquer reclamação à resposta aos artigos quesitados na base instrutória, não pode agora pô-la em causa.

    Por outro lado, afigura-se-me não existir contradição entre a fundamentação e a decisão ora recorrida, não se verificando a arguida nulidade de sentença, prevista no artº 668 nº 1 al. c) do C.P.C..

    Por fim, creio que o processo contém os elementos necessários para o tribunal determinar o montante dos prejuízos causados aos recorridos, como efectivamente foi efectuado na sentença que, a meu ver, não padece de qualquer vício, nem merece censura.

    Sou, pois, de parecer que o presente recurso jurisdicional não merece provimento." Por acórdão de fls. 201-202 foi ordenada a notificação das partes e do Ministério Público para se pronunciarem sobre a questão da competência material dos tribunais administrativos para o conhecimento da presente acção.

    Apenas os Autores de pronunciaram sobre esta questão, defendendo a competência dos tribunais administrativos.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    2 - Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto: 1 - Os A.A. juntamente com sua mãe … eram os únicos herdeiros da herança aberta por óbito de …, pai dos A.A. (A…, … e …) e marido da referida … e da referida herança fazia parte o seguinte prédio: quarenta e um noventa avos indivisos de um prédio urbano, composto de casa de habitação térrea, com a superfície coberta de setenta metros quadrados e logradouro de seiscentos e oitenta e três metros quadrados, inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo número cento e trinta e seis, com o valor matricial de dois mil duzentos e vinte escudos, confrontando de norte com …, nascente com …, do sul com … e do poente com …, não descrito na Conservatória do Registo Predial deste concelho de ….

    2 - Por escritura de partilha tal prédio foi adjudicado em comum e em partes iguais aos autores, filhos, a sua nua propriedade, e o usufruto à mãe.

    3 - Em finais de 1984 princípios de 1985 a Câmara Municipal de Vale de Cambra contactou com os A.A. informando-os que necessitava deste prédio para acesso ao mercado municipal.

    4 - A Câmara, após mandar avaliar o prédio, ofereceu-lhes em troca o seguinte prédio: ‘parcela de terreno de mato, com a área de trezentos e cinquenta e um vírgula cinco metros quadrados, já devidamente delimitada, sita no lugar de …, freguesia de …, deste concelho, confrontando de norte com o caminho e terreno de …, do nascente com Herdeiros de …, do sul com a rua de acesso a abrir, que terá a largura de seis metros, no sentido Poente-Nascente, no alinhamento da fachada sul da sede da Associação … e do poente com a referida sede, destacada, conforme deliberação da Câmara Municipal de Vale de Cambra, de dois de Abril findo, do prédio rústico número oito mil trezentos e cinquenta e nove, sito no mesmo local, com o valor matricial de nove mil oitocentos e sessenta escudos e que no seu todo confronta, actualmente, do norte com … e caminho público, do nascente com Herdeiros de … e outros, do sul com Estádio Municipal das … e do Poente com o caminho velho e rego foreiro, não inscrito na Conservatória do Registo Predial deste concelho e descrito na de Oliveira de Azeméis sob o número trinta e quatro mil cento e cinquenta e oito, a folhas cento e setenta verso do livro B - cento e quinze e inscrito sob o número quatro mil quatrocentos e cinquenta e três a folhas cento e setenta e três verso do livro F - oito, ficando a Câmara Municipal com a obrigação de abrir a rua acima referida, desde a Estrada Nacional número trezentos e vinte e oito, até ao limite do terreno dos Herdeiros de ….

    5 - Mais ficou acordado, que a R. se comprometia a dar viabilidade de construção à descrita parcela de terreno, de molde a aí ser possível de construir um edifício de rés-do-chão e dois pisos, deste modo se atingindo um valor equivalente entre os prédios.

    6 - Os A.A. e sua mãe aceitaram tal proposta e em 5 de Maio de 1985 foi celebrado entre os A.A. e a Câmara Municipal de Vale de Cambra a escritura pública de permuta.

    7 - Em 1988 os A.A. solicitaram à R. o licenciamento para a construção de um edifício, a erigir no prédio que haviam recebido em permuta da R., de rés-do-chão e mais dois pisos, tendo uma área, por piso, de 260 m2, com duas lojas para comércio no r/c, no 1.º andar dois apartamentos tipo T-3 e no 2° andar mais dois apartamentos tipo T-3.

    8 - A R. deferiu o pedido dos A.A. e assim licenciou a requerida construção mediante o alvará n.º … de 15.11.1988.

    9 - Os A.A. iniciaram a construção, edificaram o rés-do-chão e interromperam a construção a seguir.

    10 - Em 1996 porque pretendiam continuar com a construção requereram novo licenciamento para a continuação do mesmo, nos termos do pedido inicial, tendo o pedido sido deferido e emitido o alvará de licença n° …, de 1998/09/30.

    11 - Em cinco de Janeiro de 1998 os A.A. procederam à escritura de constituição de propriedade horizontal do prédio, porque a divisão do prédio em propriedade horizontal também havia sido...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT