Acórdão nº 0107/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução17 de Maio de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A Associação de Mulheres em Acção, com melhor identificação nos autos, vem recorrer, ao abrigo do disposto no art.º 150 do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo, SUL (TCA), de 7.12.06, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (fls. 533) que julgou "procedente a excepção dilatória da ilegitimidade activa, absolvendo os requeridos da instância", no pedido de suspensão de eficácia do acto do Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (INFARMED), de 7.10.05, pelo qual foi autorizada a introdução no mercado do medicamento ... 1,50 mg (1 comprimido) por parte da sociedade ....

Terminou a sua alegação formulando as seguintes conclusões: "1) saber se, no caso da legitimidade activa das Associações para a impugnação de actos administrativos, prevista na alínea c) do art. 55-1, é preciso que venha escrita nos seus Estatutos expressamente a palavra "defesa" de determinados interesses, ou basta que a Associação tenha estatutariamente a capacidade para actuar no que diz respeito a esses interesses ou nessa matéria, para, se poder concluir que - implicitamente - são interesses que lhe cumpre defender e por isso tem legitimidade activa para atacar actos administrativos reputados de ilegais nessa mesma matéria; 2) do mesmo modo, saber se, no caso da legitimidade activa das Associações para a impugnação de actos administrativos em sede de "acção popular", prevista na alínea f) do art. 55°-1 e através dela, no n° 2 do art. 9° (ambos do CPTA), e "nos termos da lei" (de acção popular) é preciso que venha escrita nos seus Estatutos expressamente a palavra "defesa" de determinados interesses, ou basta que a Associação tenha estatutariamente a capacidade para actuar positivamente no que diz respeito a esses interesses ou nessa matéria, para se poder daí concluir que são interesses que lhe compete defender e por isso tem legitimidade activa para atacar actos administrativos reputados de ilegais nessa mesma matéria; 3) saber se, para se cumprir o contraditório e evitar "decisões surpresa", basta que tenha havido a resposta (ou a possibilidade de resposta) a uma questão prévia de excepção (neste caso de ilegitimidade) expressamente suscitada, podendo depois o Tribunal, no fim do julgamento e sem qualquer prévio aviso, decidir por outra questão diferente (que se abriga sob o mesmo nome de ilegitimidade) que nunca antes fora levantada nem por ninguém negada, ou se, pelo contrário, não deve haver apreciação e decisão de uma questão concreta que antes não foi como tal suscitada nem controvertida.

O douto Acórdão recorrido entendeu como se referiu acima quanto a estas três questões: dum modo rigorista, excessivamente formalista e restritivo as primeiras duas questões, quanto ao âmbito das possibilidades de quem quer acorrer a Tribunal. De modo, pelo contrário, já muito amplo quanto às possibilidades de actuação "de surpresa" pelo Juiz, no caso da última ou últimas questões, permitindo que já após encerramento dum julgamento venha a ser suscitado pelo Juiz um ponto novo, uma questão concreta nova, nunca antes contestada, e a seguir decidida sem audição da parte a quem esse ponto desaproveita.

A Requerente entende, pelas razões vindas de expressar, que o Tribunal fez incorrecta e ilegal interpretação da lei: nomeadamente dos arts. 55° n° 1 alínea c); do art. 55° n° 1 alínea f), art. 9° n° 2 do CPTA, e art. 1°, 2° e 6° da Lei 95/88, 17 de Agosto, e art. 52° n° 3 da CRP; do art. 87° nº 2 e 95° n° 2 do CPTA e 3° do CPC, pelo que deve ser totalmente revogado, com as demais consequências legais".

A recorrida, Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, apresentou contra-alegações que concluiu assim: "1ª- A interposição do presente Recurso de Revista é inadmissível, porquanto não se verificam os requisitos do n° 1 do artigo 150° do C.P.T.A.; com efeito, 2ª- Não estamos perante uma questão que revista relevância jurídica ou social de importância fundamental, nem perante uma situação em que a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, não carecendo o presente caso de ser excepcionalmente julgado para orientar os tribunais inferiores quanto ao sentido que deve presidir a respectiva jurisprudência; acrescendo que, 3ª- O caso em análise não atinge o grau de exigência particularmente reforçada nos casos em que a questão que o recorrente quer ver reapreciada se reporta apenas à tutela provisória do direito ou interesse que quer defender em sede de processo principal, como é o caso sub judice; por outro lado, ainda que assim não se considere, o que em mera hipótese se pondera, 4ª- Não se percebe o porquê de a Recorrente vir apelidar a decisão do T.A.F" de 05/06/2006, como uma "decisão surpresa" e violadora do principio do contraditório, na medida em que, ilegitimidade da Recorrente, não tendo sido alegada pelo Recorrido, foi-o, contudo, pela contra-interessada na sua douta e tempestiva contestação (cfr. artigos 21.º a 26.º da suas alegações) - o que, obviamente, não significa que o Recorrido tenha admitido a legitimidade da ora Recorrente; 5ª- Nem se diga em contrário, como faz a Recorrente, que o douto T.A.F. de Lisboa deveria ter suprido oficiosamente tal irregularidade ou, se tal não fosse possível, ter convidado aquela ao aperfeiçoamento dos articulados, nos termos dos nºs 1 e 2, respectivamente, do artigo 88.º e 95.º, n.º 2, todos do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA), uma vez que em sede cautelar, como é o caso, não são aplicáveis tais normativos processuais, mas apenas nos casos em que o juiz se defronte com uma "acção administrativa especial" (cfr. artigo 46.º, n.º 1 do CPTA); 6ª- Em sede cautelar apenas se prevê a possibilidade de "despacho liminar" (cfr. artigo 116.º CPTA) de rejeição do requerimento do interessado, in casu com fundamento na alínea b), do n.º 2, do artigo 116.º do CPTA, limitando-se aos casos em que "... o tribunal considere que é evidente ou manifesto que a pretensão formulada é infundada... ", não devendo ser aplicável nas situações em que o tribunal não esteja ab initio em condições de proferir uma decisão com tal teor, por não ser "manifesto", sendo que essa análise compete tão-só ao prudente juízo do juiz; 7ª- Ora, foi manifestamente esse o caso: não considerando ser manifesta a ilegitimidade activa da Recorrente, o douto T.A.F. de Lisboa mais não fez que, como mandam as regras da prudência, mandar seguir o processo, relegando para o fim o conhecimento desta excepção dilatória, que veio, e bem, a julgar procedente, o que dá indiscutíveis garantias de uma decisão jurisdicional mais maturada e reflectiva; 8ª- Acresce que, conforme bem decidiu o Acórdão do T.C.A. Sul, a Recorrente pronunciou-se sobre a questão da sua ilegitimidade, dizendo "(,.) Para além de que, neste caso em concreto - o de um medicamento destinado às mulheres - é uma questão que se situa no âmbito dos interesses próprios da Associação Requerente (al, c) do n° 1 do artº 55° do Código de Processo dos Tribunais Administrativos) - como consta do artº 33º da sua resposta à referida excepção de ilegitimidade activa"», pelo que é certo que a sentença do T.A.F. atentou à alegação jurídica...

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