Acórdão nº 094/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Maio de 2007

Data09 Maio 2007
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A... - , vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial que deduzira contra a liquidação de taxa, efectuada pela Câmara Municipal de Matosinhos, no montante de € 347.202,93, devido à ocupação do subsolo municipal por condutas utilizadas para o transporte de produtos petrolíferos, ao abrigo do Regulamento e Tabela de Taxas e Licenças do Município de Matosinhos.

Fundamentou-se a decisão recorrida em que o tributo cobrado tem natureza de taxa, que não de imposto, pelo que o Regulamento não padece de inconstitucionalidade orgânica por violação do princípio da legalidade, nem de inconstitucionalidade material por violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da confiança nem, por outro lado, de vício de desvio de poder.

A recorrente formulou as seguintes conclusões: 1.ª - A recorrente é dona e legítima possuidora de uma instalação, à superfície, sita no lugar de Real, concelho de Matosinhos, constituída por reservatórios destinados à armazenagem de gás de petróleo liquefeito (GPL) e produtos brancos, servidos por três condutas (oleodutos ou «pipelines») que atravessam o subsolo de terrenos do domínio público municipal; a) uma, pertença exclusiva da recorrente, com a extensão de 288 m (duzentos e oitenta e oito metros) e com 25,4 cm (vinte e cinco centímetros vírgula quatro) de diâmetro, para produtos brancos; - e - b) duas, em compropriedade, nas proporções de: b.1) 1/2 da recorrente e 1/2 da sociedade sua congénere ... - uma -, com a extensão de 1 151 m (mil cento e cinquenta e um metros) e com 25,4 cm (vinte e cinco centímetros vírgula quatro) de diâmetro, para gás de petróleo liquefeito (GPL); - e - b.2) 1/3 da recorrente, 1/3 da ..., e 1/3 da ..., S. A. - outra -, com a extensão de 863 m (oitocentos e sessenta e três metros) e com 30,48 cm (trinta centímetros vírgula quarenta e oito) de diâmetro, para produtos brancos.

  1. - Pela «ocupação do subsolo do domínio público municipal» com as condutas anteriormente referidas, a Câmara Municipal de Matosinhos tributou a recorrente, com referência ao ano de 2002, a título de taxa liquidada de acordo com o estatuído no art.º 36.°, 7, do REGULAMENTO E TABELA DE TAXAS E LICENÇAS DO MUNICÍPIO DE MATOSINHOS, em € 347 202,93 (trezentos e quarenta e sete mil, duzentos e dois euros e noventa e três cêntimos).

  2. - A proporcionalidade própria das taxas tem de pautar-se, no caso concreto, pelo valor que as parcelas do domínio público ocupadas pelas condutas têm ou pelo custo que a sua utilização pela recorrente provoca ao município.

  3. - O município de Matosinhos não presta à recorrente qualquer serviço público.

  4. - Nem a actividade de transporte de produtos petrolíferos, para refinação ou armazenagem, provoca quaisquer custos suplementares ao município.

  5. - As obrigações que, em matéria de transporte dos produtos petrolíferos e de segurança das instalações, decorrem para a recorrente - obrigações amplas, exigentes e onerosas - não geram a necessidade de qualquer prestação municipal.

  6. - As taxas não se mostram fixadas considerando a ocupação ou qualquer outro factor legalmente relevante, designadamente a área ocupada, o custo do uso privativo ou o seu valor; antes, em função dos produtos que circulam nas condutas («taxas» mais elevadas para as condutas de «produtos derivados do petróleo ou químicos» e «produtos petrolíferos e afins») e, em caso de igualdade de produtos e de dimensões das condutas - portanto, de utilizações exactamente iguais do domínio público -, distinguindo os fins a que se destinam esses produtos («fins industriais ou comerciais, para abastecimento» e «refinação ou (...) armazenagem», onerando este em relação àquele, sem justificar porquê, nem atentar em que sem armazenagem não há abastecimento); e também em função da actividade dos donos das condutas, da vantagem económica hipoteticamente retirada dessa mesma ocupação - em última análise, da capacidade contributiva da recorrente e demais empresas petrolíferas.

  7. - A taxa suportada pela recorrente, por via da «ocupação do subsolo do domínio público municipal» com as condutas referidas na conclusão 1.ª, passou de Esc. 85$00 (oitenta e cinco escudos), por ano e por metro linear, para € 274,12 (duzentos e setenta e quatro euros e doze cêntimos), também por ano e por metro linear; em termos percentuais, um aumento de 58 823,53% (cinquenta e oito mil, oitocentos e vinte e três vírgula cinquenta e três por cento); sob outro ângulo, mais de 588 (quinhentas e oitenta e oito) vezes!!! 9.ª - Não se verificou qualquer melhoria, acréscimo ou, sequer, alteração dos serviços prestados pela Câmara Municipal de Matosinhos, na utilização do bem do domínio público, passível de ser invocada como correspectivo do acréscimo da taxa de ocupação do subsolo.

  8. - As taxas foram fixadas em valores que, face aos montantes anteriores, não têm justificação que se vislumbre, sendo, de toda a evidência, um excesso.

  9. - A norma constante do art.º 36.°, 7, do REGULAMENTO E TABELA DE TAXAS E LICENÇAS DO MUNICÍPIO DE MATOSINHOS viola o art.º 266.°, 1 e 2 («princípio da proporcionalidade) da Constituição da República Portuguesa.

  10. - Em caso de igualdade de produtos e de dimensões das condutas - portanto, de utilizações exactamente iguais do domínio público -, a taxa distingue, sem justificação, os «fins industriais ou comerciais para abastecimento» (art.º 36.°, 4, do REGULAMENTO E TABELA) dos fins para «refinação ou (...) armazenagem» (art.º 36.°, 7, do REGULAMENTO E TABELA), a que se destinam esses produtos, onerando os últimos em relação aos primeiros.

  11. - Não é motivada a causa da diferença de tributação com base na diversidade de produtos que circulam nas condutas e na intensidade da sua utilização.

  12. - São estabelecidos montantes diferenciados consoante a actividade dos donos das condutas, a vantagem económica por eles hipoteticamente retirada dessa mesma ocupação - em última análise, a sua capacidade contributiva.

  13. - O art.º 36.°, 7, do REGULAMENTO E TABELA DE TAXAS E LICENÇAS DO MUNICÍPIO DE MATOSINHOS ofende também o art.º 13.° («princípio da igualdade») da Constituição da República Portuguesa.

  14. - O aumento das taxas em 58 823,53% (cinquenta e oito mil, oitocentos e vinte e três vírgula cinquenta e três por cento) - ou, de outro ponto de vista, em mais de 588 (quinhentas e oitenta e oito) vezes - põe em causa, segundo critérios de normalidade, de razoabilidade e de senso comum e à luz das regras da experiência e da vida, as expectativas jurídicas da recorrente [a)] nos investimentos por esta realizados na instalação das condutas e das estruturas necessárias à armazenagem dos produtos petrolíferos e [b)] de que o tributo por si suportado, por via da «ocupação do subsolo do domínio público municipal» com os oleodutos referidos na conclusão 1.ª, sendo uma taxa, não sofreria um aumento desrazoável, à margem do valor dos custos ou de uma qualquer melhoria do serviço prestado.

  15. - O art.º 36.°, 7, do REGULAMENTO E TABELA DE TAXAS E LICENÇAS DO MUNICÍPIO DE MATOSINHOS viola o art.º 266.°, 1 e 2 («princípio da boa fé») também da Constituição da República Portuguesa.

  16. - As taxas fixadas pelo município de Matosinhos são, assim, no caso concreto, um verdadeiro imposto lançado sobre a recorrente.

  17. - As autarquias não possuem competência para a criação de «impostos», nem tão-pouco de «contribuições especiais».

  18. - Aqueles e estas têm de ser criados por Lei (art.º 103.°, 2, da Constituição) ou por Decreto-Lei «autorizado» [art.º 165.°, 1, i), da Constituição da República Portuguesa].

  19. - Neste contexto, a norma do art.º 36.°, 7, do REGULAMENTO E TABELA DE TAXAS E LICENÇAS DO MUNICÍPIO DE MATOSINHOS (anteriormente à «renumeração da Tabela de Taxas», em 1999) enferma de inconstitucionalidade orgânica, por ofensa dos preceitos citados no artigo anterior.

  20. - Decidindo como decidiu, a sentença sub censura violou o disposto nos art.ºs 266.º, 1 e 2 («princípio da proporcionalidade»), 13.º («princípio da igualdade»), 266.º, 1 e 2 («princípio da boa-fé»), 103.º, 2 e 165.º, 1, i), da Constituição da República Portuguesa.

    Nestes termos e nos do disposto nos normativos citados supra, bem como em todos os mais, de direito, aplicáveis, que não deixarão de ser supridos, deve ser concedido provimento ao recurso - decidindo-se em conformidade com o propugnado nesta alegação -, com as legais consequências, o que se fará por obediência à lei e imperativo da JUSTIÇA! Por sua vez, contra-alegou a recorrida: 1ª - O Regulamento e as suas normas são plenamente válidas e, por isso, inquestionavelmente aplicáveis.

  21. - Actualmente, o subsolo é considerado como um espaço autónomo do domínio público e é objecto próprio de incidência tributária, de acordo com o preceituado na nova Lei das Finanças Locais.

  22. - O tributo anteriormente existente era uma simples taxa moderadora que visava disciplinar a procura; não se tratava de uma verdadeira taxa.

  23. - Daí que não possa nem deva falar em aumento, mas em criação ou definição de uma taxa.

  24. - O valor simbólico do tributo anteriormente existente é a melhor prova de que não se curava ali de uma taxa em sentido técnico.

  25. - A concepção constitucional de taxa pressupõe a necessidade de existência de uma relação sinalagmática, a desnecessidade de uma exacta equivalência económica, a aferição do respectivo montante em função não só do custo mas igualmente do grau de utilidade prestada e a exigência de uma não manifesta desproporcionalidade na sua fixação.

  26. - A taxa em apreço tem natureza sinalagmática, visto que é devida em função de uma utilização individualizável de um bem do domínio público municipal, bem expressamente autonomizado na lei; 8ª - Vistos os critérios estabelecidos para a sua fixação (e respectiva aplicação), tem de concluir-se pela proporcionalidade da taxa aplicada.

  27. - O critério da área ocupada é indisputável e o critério da ponderação dos...

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