Acórdão nº 0511/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Abril de 2007
Magistrado Responsável | LÚCIO BARBOSA |
Data da Resolução | 11 de Abril de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A…, com sede na Rua …, …, …, Matosinhos, impugnou judicialmente, junto do então Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto, a liquidação adicional de IVA relativa ao ano de 1998 e juros compensatórios.
O Mm. Juiz do TAF do Porto julgou a impugnação improcedente.
Inconformada, a impugnante trouxe recurso para este Supremo Tribunal.
Formulou as seguintes conclusões nas respectivas alegações de recurso: 1. A douta Sentença padece de nulidade por falta de pronúncia, no que concerne ao alegado erro de cálculo dos juros compensatórios (artigos 125º do CPPT, 660º n. 2 e 668º n. 1 d) CPC).
Quanto à matéria de fundo, 2. A douta Sentença padece de erro de julgamento: a Recorrente não pretende deduzir o IVA liquidado pela B… à C…, nem pretende qualquer "transmissão" do direito à dedução de IVA, da C… para a Recorrente.
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O direito de dedução do IVA em questão, nasceu, tão só, na esfera da Recorrente, com a emissão do respectivo certificado de renúncia à isenção de IVA.
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A douta Sentença não retirou as devidas ilações das contas movimentadas (contas 44 e 37) e registos contabilísticos efectuados pela C… e Recorrente, tal como delas se conclui à luz do POC, aprovado pelo DL 410/89 de 21/11.
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A douta Sentença não atendeu que, quer uma, quer outra, e até à escritura de venda, contabilizaram, meros adiantamentos e reembolsos de adiantamentos, meros movimentos financeiros (inócuos para efeitos de IVA), sem valor acrescentado ou resultado.
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Não atendeu que, só depois, e tendo por base a escritura de compra, é que a Recorrente deduziu e solicitou o reembolso de IVA em questão.
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A douta Sentença, indevidamente, não teve em conta que o IVA em causa foi integralmente liquidado à Recorrente, pela B…, na escritura pública de compra e venda entre ambas celebrada, sobre a totalidade do preço.
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Nascendo, em simultâneo, na Recorrente, o direito à dedução (independentemente do "timing" do pagamento, da forma do pagamento ou de quem pagou a quem), pelo que violou os artigos 7°, 8°, 19° n. 2 e 22° do CIVA.
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A douta Sentença omitiu, e violou, o artigo 7° do DL n. 241/86, de 20/8, segundo o qual essa escritura pública de venda, no caso concreto, substitui a factura; não "serve" apenas para determinar o momento a partir do qual o reembolso pode ser pedido.
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A douta Sentença padece de erro de julgamento quando afirma que o IVA em causa "não foi suportado" pela Recorrente: foi formal e integralmente liquidado à Recorrente, na dita escritura pública, e foi integralmente suportado, financeiramente, pela Recorrente.
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Não atendeu a douta Sentença ao facto do IVA se dirigir à tributação do consumo e do consumidor final, tão pouco ao princípio da prevalência da substância sobre a forma (cfr. al. f do ponto "4 - Princípios Contabilísticos" fundamentais do POC, e artigos 11° n. 3 e 38° da LGT, e 32°-A do CPT).
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Ao contrário do decidido, a Recorrente agiu em escrupuloso cumprimento do disposto nos artigos 4° nºs. 1 e 2 e 7° do DL n. 241/86, de 20/8, 12° nºs 4,6 e 7, 19° e 91° n. 2 do CIVA, violados peta douta Sentença.
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A douta Sentença não atendeu ao facto da Fazenda Pública não ter sido, nem ser, minimamente prejudicada.
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Ao contrário do entendimento da douta Sentença, a circunstancia do certificado de renúncia à isenção de IVA, concedido à B…, indicar, como adquirente, a C…, é irrelevante.
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Por um lado, porque a B… liquidou a totalidade do IVA à Recorrente, na escritura pública, e essa liquidação não foi posta em crise pela AF.
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Por outro, porque a própria AF reconheceu à Recorrente o direito de deduzir e obter o reembolso do IVA liquidado pela B… à Recorrente, nos adiantamentos por esta efectuados (pós cessão da posição contratual).
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A douta Sentença, ao coarctar, à Recorrente, o direito à dedução do IVA, viola os princípios constitucionais da justiça e proporcionalidade (artigos 5º e 55° da LGT, 3° e ss. do CPA e 266° da CRP).
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Estes princípios impunham que, (i) ou se aceitasse o direito à dedução da Recorrente, (ii) ou se revogasse a liquidação de IVA efectuada pela B… na escritura pública de venda à Recorrente.
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Como a AF não aceita a dedução da Recorrente, nem revogou a liquidação de IVA (e inerente entrega de IVA ao Estado pela B…), verifica-se um enriquecimento injustificado da AF.
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Se dúvidas persistirem, quanto à questão da dedução do IVA com base na escritura pública de compra, à luz do disposto na Sexta Directiva 77/388/CCC do Conselho, de 17 de Maio de 1977, solicita-se, ao abrigo do artigo 234° do Tratado de Roma, o seu reenvio, a titulo prejudicial, ao TJCE.
Por outro lado, 21. A douta Sentença violou o artigo 60º n. 6 da LGT, no que concerne ao alegado pela Recorrente em 17.06.1999 (vide termo de audição de fls. 78 a 87), no exercício do seu direito de audição prévia.
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Diversamente do decidido, todos os elementos novos, de facto ou de direito, suscitados em sede do exercício do direito de audição, devem ser objecto de apreciação pela AF; não de mera enunciação.
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Ao contrário do decidido, a impugnante invocou vários "elementos novos"no exercício do seu direito de audição prévia, quer de facto, quer de direito.
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O carácter inovador, ou não, dos elementos invocados pelo contribuinte, deve ser aferido em função do teor do projecto de correcções de fls. 71 a 74, nos termos do artigo 60° n. 4 da LGT.
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E não, como entende o Mm. Juiz "a quo", em função do hipotético conhecimento antecipado que deles já tivesse a AF.
Acresce que, 26. Ao contrário da douta Sentença, parece-nos que as liquidações não estão devidamente fundamentadas, tendo sido violados os artigos 35º n. 9 e 77º da LGT, 268º n. 3 da CRP e 125º n. 2 do CPA.
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Com efeito, a douta Sentença não atendeu ao facto da "fundamentação" das correcções (quer no projecto de correcções, quer no relatório final) apontar, exclusivamente, para o indeferimento parcial do pedido de reembolso de IVA do 4°T de 1998.
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E não para quaisquer liquidações adicionais de IVA ou de JC, como foi feito.
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Há diferença entre (i) não reembolsar o IVA ou (ii) efectuar liquidações adicionais, designadamente porque primeira opção nunca implicaria que fosse devidos JC; indeferia-se o reembolso, ponto final.
Mais, 30. As notificações das liquidações omitem as circunstâncias factuais que terão sustentado a "passagem" de uma situação de indeferimento do reembolso para uma situação de liquidação adicional de imposto e juros compensatórios, pelo que são inválidas.
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Permanecendo a invalidade de tais notificações, as liquidações caducaram por decurso do prazo legal de caducidade de 4 anos (artigos 33º do CPT, 45º n. 1 da LGT e 268º n. 3 da CRP).
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A douta Sentença viola, por isso, os artigos 87º e 90º n. 4 do CIVA, 19º b), 21º e 82º do CPT (em vigor ao tempo), e 268º n. 3 da CRP.
Por outro lado, 33. A douta Sentença violou a al. a) do n. 1 e n. 2 do artigo 60º da LGT, segundo o qual os contribuintes têm direito de audição antes da liquidação.
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Ao contrário da douta Sentença, a nova redacção do artigo 60º n. 3 da LGT, conferida Lei n. 16-A/2002, de 31/5, não tem carácter interpretativo, mas sim inovador.
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Com efeito, e conforme Jurisprudência deste Venerando STA, a lei antiga não dispensava a nova audição, antes da liquidação, ainda que o contribuinte tivesse sido anteriormente ouvido.
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Assim, a douta Sentença interpreta indevidamente o disposto nos novos artigos 60º n. 3 da LGT e 13º n. 2 da Lei n. 16-A/2002, de 31/5, violando o artigo 13º n. 1 do CC e os princípios da igualdade e justiça (artigos 55º da LGT, 5° e 6° do CPA e 266º da CRP).
Sem prejuízo, se, por hipótese, assim não se entender, 37. A douta Sentença interpretou indevidamente o artigo 60º n. 3 da LGT (na redacção conferida pela Lei n. 16-A/2002, de 31/05) e, com isso, violou este preceito e o disposto nos artigos 60º n. 1 a) e 4 da LGT, e 267º n. 5 da CRP.
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Com efeito, aquela disposição legal só dispensava o direito de audição, antes da liquidação, quando não tivessem entretanto surgido novos factos, sobre os quais não houvesse sido concedida ao contribuinte oportunidade de ser previamente ouvido.
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Ora, conforme m), n) e o) da matéria de facto provada, a descoordenação da AF, e a efectivação (alegadamente indevida) do reembolso, constituíram matéria factual superveniente, que conduziu às liquidações de IVA e JC, sobre a qual a Recorrente não foi previamente ouvida.
Consequentemente, 40. Porque as liquidações padecem dos aludidos erros, a douta Sentença violou os artigos 53º nºs 1 e 2 e 100º da LGT, e 171º do CPPT, ao não reconhecer o direito de indemnização previsto nestes preceitos legais.
Não houve contra-alegações.
Neste STA, o EPGA defende que o recurso não merece provimento.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
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É a seguinte a matéria de facto fixada na instância: a) Relativamente à impugnante foi elaborado pelos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária o relatório de folhas 18 a 22 do proc. reclamação ap. o qual aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais e onde em síntese consta que: «A empresa solicitou reembolso de IVA com referência ao 4º trimestre de 1998, no montante de 1.819.545.568$00.
(...) DESCRIÇÃO FACTUAL 1- Em 18/11/94 foi celebrado um contrato de promessa de compra e venda entre as empresas "B…", NIPC … e "C…", NIPC …, através do qual a primeira promete vender à Segunda "grande superfície comercial" destinada a hipermercado e serviços conexos (Centro Comercial …), com possibilidade de cessão de posição contratual de qualquer das partes, mediante acordo prévio.
2- Decorria do referido contrato a obrigação, por parte da C…, de efectuar adiantamentos à B…, emitindo esta notas de lançamento com liquidação de IVA.
3- Naqueles termos, a C… efectuou adiantamentos à B…, desde 23/11/94 até 30/9/96, no montante global de 7.877.349.406$00, acrescido do correspondente IVA no valor de 1.339.149.400$00.
4- Os pagamentos efectuados pela C… à B… a titulo de adiantamentos, foram...
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