Acórdão nº 0209/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução15 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. O Ilustre Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, interpôs recurso contencioso pedindo a declaração de nulidade: - do despacho, de 25.01.1998, do Vereador do Pelouro do Urbanismo da CM de Ovar, - do despacho, de 26.01.1998, do Presidente daquela Câmara, - do alvará de loteamento n.º 34/98, da Câmara Municipal de Ovar, - e, de um modo geral, dos "actos de aprovação e licenciamento do loteamento titulado pelo alvará n.º 34/98 ", alegando que os mesmos violavam o Plano Director Municipal (PDM) daquela autarquia.

    A Entidade Recorrida e o Recorrido Particular contestaram aqueles pedidos tendo este último, para além disso, invocado a caducidade do direito de recurso.

    O Sr. Juiz a quo elaborou despacho saneador onde: - rejeitou o recurso quanto aos actos não especificamente identificados, ao alvará de loteamento e ao despacho de 26/01/98 atribuído ao Presidente da Câmara - julgou improcedente a excepção de caducidade invocada pelo Recorrido Particular - e ordenou o prosseguimento do recurso no tocante ao pedido de declaração de nulidade do despacho, de 25.01.1998, do Vereador do Pelouro do Urbanismo da CM de Ovar que licenciara o controverso loteamento.

    Despacho que não foi objecto de recurso de nenhuma das partes.

    Instruído o processo foi proferida sentença (fls. 101/115) dando provimento ao recurso, pelo que o despacho de 25/01/1998 do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo da CM de Ovar foi declarado nulo com o fundamento de que o mesmo violava o disposto no art.º 38.º do PDM de Ovar e respectivos Anexos.

    Inconformados, tanto o Recorrido Particular como o identificado Autarca interpuseram recurso.

    Todavia, o requerimento de interposição de recurso do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo da CM de Ovar não chegou a ser junto aos autos e, por isso, mesmo não chegou a ser admitido, mas tal não o impediu de apresentar alegações.

    E, porque assim, foi proferido Acórdão onde se escreveu "Notificada às partes, apenas o Recorrido Particular recorreu dessa sentença, recurso que foi admitido pelo despacho de fls. 120.

    Todavia, a Autoridade Recorrida, apesar de notificada daquela decisão e de não ter reagido contra ela, apresentou-se a alegar como se dela tivesse recorrido.

    Ora, a apresentação de alegações só pode ser feita por quem tiver, atempadamente, interposto recurso e este tiver sido admitido.

    Sendo assim, e sendo que a Autoridade Recorrida não recorreu da sentença, a mesma não tinha o direito de alegar.

    Razão pela qual se não tomará conhecimento das suas alegações." E, conhecendo-se do recurso interposto pelo Recorrido Particular, negou-se-lhe provimento e confirmou-se a sentença do TAC de Coimbra que tinha declarado nulo o despacho que licenciara a questionada operação de loteamento.

    Notificado deste julgamento o Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo da CM de Ovar apresentou o requerimento de fls. 175/177 manifestando a sua surpresa pelo facto do referido Acórdão ter afirmado que ele não tinha interposto recurso pois que, efectivamente, tinha apresentado requerimento de interposição de recurso no Tribunal recorrido como o provava o documento que juntou.

    Remetidos os autos ao TAC de Coimbra para que esclarecesse essa situação foi prestada informação onde se afirmou não ter sido encontrado o mencionado requerimento de interposição de recurso, mas isso não impediu o Sr. Juiz daquele Tribunal de o receber pois considerou que o reclamante demonstrara, através de fotocópia daquele requerimento com data de entrada no Tribunal, que efectivamente tinha interposto recurso.

    E na sequência desse despacho de recebimento aquele Recorrente apresentou novas alegações.

    O exposto evidencia ter sido cometida uma nulidade - a não junção aos autos no tempo devido do requerimento de interposição de recurso por parte do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo da CM de Ovar - e que a mesma é susceptível de influenciar o exame e decisão da causa.

    Daí que, por força do disposto nos art.ºs 201.º e 202.º do CPC, cumpra declarar nulo o processado influenciado por essa irregularidade o qual se resume ao Acórdão de fls. 162 a 169.

    Termos em que se declara nulo o Acórdão de fls. 162 a 169.

    E, porque assim, cumpre, de novo, proferir decisão conhecendo-se desta vez de ambos os recursos.

  2. O recurso do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo da CM de Ovar concluiu assim as suas alegações: 1. Nunca ninguém sustentou que "as regras do jogo variam consoante a dimensão do terreno", não se apercebendo (ou tal sequer foi dito ou mesmo indiciado) a razão pela qual só aplicação lote a lote das regras urbanísticas constantes do art. 38° do PDM respeita os objectivos do planeamento ou o princípio da igualdade.

  3. Bem sabemos que adiantar uma explicação qualquer não é idêntico a não adiantar razão nenhuma ou a adiantar uma razão contraditória com o decidido, porém, a verdade é que, em nulidade de sentença, deve equivaler à falta absoluta de fundamentação aquela que, ostensiva e manifestamente, não explica minimamente o sentido da sentença - art. 668.°, n.º 1, al. b) do CPC.

  4. Não se trata de uma fundamentação resumida, deficiente, incompleta, não convincente, menos certa, implícita, ou mesma errada ela não tem, pura e simplesmente, nexo ou qualquer aptidão explicativa da decisão da presente questão.

  5. Importa considerar e deixar bem claro que o que está em questão, como se disse, e parece ter sido bem entendido pela sentença, é que se está a discutir o sentido e conteúdo de uma norma de um instrumento urbanístico de planeamento urbano - o PDM de Ovar - enquanto o Juiz recorrido entende que não faria sentido, em razão dos objectivos do plano e do principio da igualdade, aplicar as regras e parâmetros urbanísticos constantes do PDM a toda a área ou propriedade que seja objecto de loteamento, a autarquia entende que os parâmetros constantes do quadro a que se refere o art. 38.º do PDM só fazem sentido se àquela área se referirem.

  6. É evidente que nem o tribunal, nem, muito menos, o Ministério Público, contrariam as razões - rectius argumentos - que a autarquia mobilizou e mobiliza também nesta sede como revelando o erro de julgamento, em defesa da manutenção do acto na ordem jurídica, 6. Nomeadamente: a) A interpretar o referido quadro como o faz o magistrado, se os valores das quadrículas referentes ao espaço urbano c fossem mínimos e aplicáveis lote a lote, teríamos que se verificava um paradoxo.

    - Na verdade, nesse quadro anexo a largura mínima dos lotes será de 12 m e a profundidade mínima seria de 18 metros; assim, se tivéssemos um rectângulo perfeito, concluiríamos que nesse lote (de 12 m. por 18 m.) nada se poderia edificar, posto que a superfície mínima, de acordo com o mesmo quadro, é de 500m2 - 18 x 12 = 216 m2.

    - Ou seja: A interpretação do PDM que faz o público recorrente revela, contra legem, que a própria letra da lei regulamentar teria consagrado uma solução desacertada e paradoxal, porquanto proveria a possibilidade de existência de um lote sem as dimensões mínimas que adiante supostamente exigiria - cfr. art.º 9.°, n.º 3 do CC.

    1. Interessa ademais referir que se está face à aplicação de conceitos técnicos, em que a interpretação e aplicação que a autarquia faz das disposições em causa (quadro anexo ao art. 38.° do PDM) é uma interpretação que, no mínimo, teremos de entender ser razoável - a atestar essa razoabilidade (em passagem do test of reasonableness) está o facto de as disposições normativas de que se trata terem assim sempre sido entendidas e aplicadas pelos serviços, sem resultados absurdos ou com algum inconveniente prático conhecido.

      - Nesta conformidade, deveremos entender que a aplicação desses conceitos tal como foi levada a efeito no caso concreto, implica estarmos na denominada zona do halo da discricionariedade técnica, onde se deve dar prevalência (ou o beneficio da dúvida) à interpretação e aplicação levadas a efeito pela administração no caso concreto, não podendo os tribunais, sob pena de administrarem, impor o seu juízo e avaliação técnica de interpretação e aplicação desses conceitos à administração - cujos actos, recorde-se bem, beneficiam da presunção da legalidade.

    2. ...

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