Acórdão nº 01036/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelEDMUNDO MOSCOSO
Data da Resolução19 de Dezembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO - 2ª Subsecção: 1 - A..., intentou no TAC de Lisboa contra o ESTADO PORTUGUÊS (Direcção Geral de Portos) e contra o MUNICÍPIO DE ALBUFEIRA a presente acção de responsabilidade civil extracontratual pedindo a condenação solidária dos RR. a pagar-lhe a quantia de 103.763.729$00 (onde se inclui o montante 100.000.000$00 a título de danos não patrimoniais) acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência do acidente de que foi vítima quando, juntamente com o seu namorado desciam as escadas de acesso à Praia do Peneco, Albufeira, altura em que as escadas e muro de suporte se abateram soterrando a A. e provocando-lhe múltiplas lesões e ferimentos, bem como a morte do seu namorado.

1.1 - Em audiência de julgamento a A. requereu a ampliação do pedido inicialmente formulado, pedindo ainda a condenação dos RR. em quantia que a indemnize pelas despesas suportadas com as suas deslocações a Portugal, com a deslocação de testemunhas trazidas ao julgamento e com o pagamento de honorários aos seus advogados, quantias essas a apurar em execução de sentença.

+ 2 - No despacho saneador o juiz do TAC julgou, além do mais, improcedente a excepção que o R. Estado invocara na contestação - prescrição do direito da A. - e em conformidade declarou "não prescrito o direito à indemnização" peticionada pela A.

2.1 - Não se conformando com o decidido no despacho saneador "na parte em que julgou improcedente a excepção de prescrição", interpôs o R. Estado recurso jurisdicional (fls. 318) que dirigiu a este STA (admitido por despacho de fls. 427) tendo, na respectiva alegação (fls. 442/456 cujo conteúdo se reproduz), formulado as seguintes CONCLUSÕES: I - O prazo de prescrição do direito à indemnização por responsabilidade civil extracontratual conexa com a criminal, é, no caso sub-judice, de três anos, por aplicação da regra geral do artº 498º/1 do CPC, o que está assente e não é controvertido.

II - De acordo com o disposto no artº 306º/1 do CC o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; III - O direito pode ser exercido, a partir do conhecimento da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual (e não da determinação do respectivo quantum), logo que não existam obstáculos ou impedimentos a tal exercício: IV - Não obstante o princípio da adesão obrigatória consagrado no artº 71º do CPP que impõe a dedução do pedido cível fundado na prática de um crime no processo penal respectivo, nem sempre a pendência de processo crime constitui impedimento à propositura da acção cível em separado e ao exercício judicial do direito à indemnização, Na verdade, V - Tal princípio comporta as numerosas excepções previstas no artº 72º/1 do CPP onde o princípio da adesão obrigatória cede perante o princípio da opção segundo o qual o lesado, ao formular pedido de indemnização fundado na prática de um crime, pode escolher livremente entre a jurisdição competente - civil ou administrativa - e a jurisdição penal sem ter necessidade de aguardar um certo estádio ou efeito da acção penal; VI - Os casos contemplados nas diversas alíneas do nº 1 do artº 72º do CPP correspondem a situações de inexistência de factos impeditivos da propositura da acção cível em separado, perante a jurisdição competente; VII - Bastando, portanto, que se verifique alguma dessas situações para que o lesado tenha a possibilidade de deduzir o pedido cível em separado, sem ter que aguardar o desfecho do processo penal, nenhum obstáculo ou impedimento se lhe deparando então ao exercício do direito; VIII - A partir do momento em que o pode fazer está ele em condições, sem entrave de qualquer sorte, de exercer o direito, pelo que se inicia então o decurso do prazo da prescrição de conformidade com o disposto no artº 306º/1 do CC, pouco importando a classificação do direito.

IX - Assim, no caso vertente, quer porque o procedimento criminal dependia de queixa (al. c) do nº 1 do artº 72º), quer porque o pedido é deduzido contra os responsáveis meramente civis (al. f)), quer porque o valor do pedido permitia a intervenção do tribunal colectivo devendo o processo penal correr perante tribunal singular (al. g)), nenhum obstáculo se deparava ao exercício pela A. - a partir do conhecimento dos pressupostos da responsabilidade civil, no caso coincidente com o facto lesivo, - sendo aquele o facto determinante do termo inicial do o prazo de prescrição, pelo que, X - Tendo o acidente ocorrido a 24.08.89, consumou-se a 24.08.92, antes portanto da citação do R na presente acção, que se verificou a 01.07.97, o prazo de prescrição; XI - Em todo o caso, na pior das hipóteses para o R., o prazo de prescrição consumou-se a 25.4.93, uma vez que tendo-se iniciado a 25.8.89 o processo crime a que o acidente deu origem sem que nos 8 meses subsequentes tivesse sido deduzida a acusação, a A. podia, nesta hipótese, por força da al a) do nº 1 do artº 72º do CPP, propor a acção cível em separado a partir de 25.4.90; XII - Ao decidir que não se encontra prescrito o direito que a A. pretende fazer valer na presente acção o despacho recorrido faz errada interpretação e viola as disposições conjugadas dos artº 498º/1 e 306º/1 do C.C., 72º/1 da LPTA e 72º/1 als. a), c), f) e g) do CPP.

XIII - Deve por isso, ser revogado e substituído por outro que declare prescrito o direito que a A. pretende fazer valer na acção e procedente a excepção peremptória da prescrição deduzida na contestação, absolvendo o R. do pedido.

2.2 - Contra-alegando a A. deduziu as seguintes CONCLUSÕES: a) - O direito à responsabilidade civil extra-contratual dos entes públicos e dos titulares dos seus órgãos e agentes por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, prescreve nos termos do artº 498º nº 1 do CC, no prazo de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do seu direito; b) - O artº 306º/1 do CC, dispõe que "o prazo de prescrição começa a correr quando o direito poder ser exercido (...)".

c) - O artº 71º do CPP, obriga a "que o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime" seja "deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei".

d) - O artº 72º/1 do CPP estabelece os casos em que o pedido de indemnização civil pode ser deduzido em separado do processo penal respectivo, procurando tutelar o interesse legítimo do lesado numa pronta reparação dos danos; e) - Verificada qualquer uma das situações previstas nas várias alíneas do artº 72º/1 do CPP, o lesado tem o direito de optar por aguardar o desfecho do processo crime, reclamando neste a indemnização a que se julga com direito ou por deduzir junto dos tribunais cíveis este mesmo pedido de indemnização; f) - Por esta razão, enquanto estiver pendente o processo penal não começa a correr o prazo de prescrição do direito à indemnização; g) - No caso presente, tendo o acidente ocorrido em 24.08.89, e tendo o processo de inquérito instaurado em virtude da ocorrência do mesmo sido arquivado em 15.9.94, apenas nesta data se iniciou a contagem do prazo de prescrição de três anos.

h) - Tendo a acção subjacente ao presente recurso dado entrada no Tribunal recorrido em 12.6.97 e tendo o recorrido sido citado para contestar em 01.07.97 a A. exerceu o seu direito antes do decurso dos três anos que determinariam a respectiva prescrição.

Assim, deve o recurso ser julgado improcedente.

+ 3 - Por sentença de 15.10.2004 (fls. 989/1.017) foi a acção julgada "parcialmente procedente" e em consequência: I - Foram os RR. Estado Português e Município de Albufeira solidariamente condenados a pagarem à A, a título de indemnização: a) - Por danos patrimoniais 18.773,40 €; b) - Por danos patrimoniais futuros 149,639,37 €; c) - Por danos morais 149,639,37 € II - A estas quantias acrescem juros de mora à taxa legal relativamente à indemnização por danos patrimoniais, desde a citação até integral pagamento e quanto à indemnização por danos patrimoniais futuros e danos morais, desde a data da sentença, até integral e efectivo pagamento.

III - Mais foram os RR. condenados a pagarem à A. a quantia que se apurar em execução de sentença: a) - Por despesas de deslocação a Portugal da A. e três testemunhas, e respectiva estadia; b) - Por despesas com honorários a advogado, tendo como limite a quantia equivalente a 90,00 unidades de referência, tendo esta o valor de ¼ UC (€ 22,25): IV - Quanto ao mais peticionado foram os RR. absolvidos do pedido.

V - Custas por A. e RR. na proporção do decaimento..." 3.1 - Não se conformando com tal decisão dela veio o R. Estado a interpor recurso jurisdicional tendo, na respectiva alegação (fls. 1.025/1.051), formulado as seguintes CONCLUSÕES: I - Mantém para o R. todo o interesse o recurso que interpôs contra o despacho saneador na parte em que julgou improcedente a excepção de prescrição, recebido a fls 427, e oportunamente alegado, recurso cuja apreciação, nos termos e para efeitos do disposto no art° 748, n° 1 do C.P. Civil, se requer.

II - 1 - O facto que na sentença proferida nos presentes autos foi tido como determinante na produção do acidente, o acontecimento naturalístico que foi considerado como evento gerador dos danos, que foi examinado e a propósito do qual foram apreciados e examinados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito foi, como a sentença evidencia, a derrocada da falésia.

2 - No entanto, na sua contestação (art°s 22° e 52°) o R. Estado, entre outros aspectos, defendeu que o acidente de que a A. foi vitima não se deveu a qualquer desprendimento da falésia mas à queda do muro devido à construção deficiente do mesmo e à ruptura do cano de abastecimento de água ao bar sito no primeiro patamar das escadas de acesso à Praia do...

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