Acórdão nº 0843/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução29 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A..., SA, com melhor identificação nos autos, veio recorrer, ao abrigo do disposto no art.º 150 do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCA), de 11.5.06, que concedeu provimento ao recurso jurisdicional deduzido por B..., SA, da sentença do TAF de Loulé (que julgara "procedente a causa de pedir trazida pela A... ... na impugnação de acto administrativo relativo à formação de contrato que esta intentou contra a ora recorrente e outros, e, "em virtude de as partes não terem conseguido transaccionar entre si" se determinou que a ré indemnizasse a autora "no valor da Acção de E 15.000,00 (quinze mil euros), por forma a que a interessada seja ressarcida de eventuais prejuízos que tenha sofrido") e declarou "nulo todo o processado a partir do despacho de fls. 401, o qual deverá ser substituído por outro que se pronuncie sobre a procedência dos fundamentos da impugnação, depois de dar por verificada a impossibilidade absoluta de apreciar o pedido de impugnação".

Terminou a sua alegação formulando as seguintes conclusões: 1a) Uma coisa é o estabelecido no artº 45° n° 1 do CPTA, inserido no Título II, que versa sobre as acções administrativas comuns, outra coisa bem diferente é o estabelecido no artº 102° n° 5 do mesmo CPTA, inserido no Título IV, que versa sobre processos urgentes, nomeadamente impugnações urgentes do contencioso pré-contratual.

2a) Enquanto nas acções comuns a "situação de impossibilidade absoluta" terá forçosamente de conduzir a uma sentença em que o tribunal julga improcedente o pedido, nas acções urgentes, a mesma "situação de impossibilidade absoluta" conduz a que o tribunal não profere a sentença (n° 5 do artº 102° do CPTA).

3a) Nas acções comuns não está em causa, directamente, o interesse público, ao passo que nas acções de contencioso pré-contratual tal interesse público está directamente ameaçado, pela acção de alguém que não quer que o contrato administrativo seja outorgado.

4a) Daí que o legislador tenha optado, atendendo a razões de celeridade processual e de defesa do interesse público, por legislar no sentido de considerar que o contrato administrativo entretanto outorgado não deve ser "atacado", mas ao mesmo tempo estipula que o "autor" terá direito a uma indemnização, que, no entender da Recorrente, tem carácter sancionatório e a sua fixação terá de obedecer aos trâmites estabelecidos no n° 1 (parte final) a 4 do artº 45°, por remissão do artº 102° n° 5, ambos do CPTA.

5a) A indemnização tem carácter sancionatório e a sua fixação deve ser precedida de diligências instrutórias, como o exige o artº 45° n° 3 do CPTA.

6a) Não se mostra necessária, sequer obrigatória a pronúncia sobre a procedência dos fundamentos da impugnação, depois de verificada a impossibilidade absoluta de apreciar o pedido de impugnação, pois o autor terá sempre direito a ver fixada uma indemnização, se o não for por acordo, correspondendo tal conclusão à interpretação literal do artº 102° n° 5 e 45° n° 3 do CPTA.

7a) O douto despacho de fls. 401 não padece de vício, mas, por inexistência de diligências instrutórias prévias à fixação da indemnização, todo o processado a partir do Requerimento da autora de fls. 407 deve ser declarado nulo.

TERMOS EM QUE DEVE SER RECEBIDO O PRESENTE RECURSO DE REVISTA, PROFERINDO-SE ACÓRDÃO: A) QUE ANULE O DOUTO ACÓRDÃO EM CRISE, NA PARTE EM QUE DETERMINA QUE O DESPACHO DE FLS 401 DEVE SER SUBSTITUÍDO POR OUTRO QUE SE PRONUNCIE SOBRE A PROCEDÊNCIA DOS FUNDAMENTOS DA IMPUGNAÇÃO, DEPOIS DE VERIFICADA A IMPOSSIBILIDADE ABSOLUTA DE APRECIAR O PEDIDO DE IMPUGNAÇÃO, POR SE ENTENDER QUE EXISTE UMA INCORRECTA APRECIAÇÃO DOS ARTºS 102° N° 5 E 45° N° 3 DO CPTA; B) QUE MANTENHA O DOUTO DESPACHO DE FLS 401; C) QUE REITERE A NULIDADE DE TODO O PROCESSADO A PARTIR DO REQUERIMENTO DA AUTORA DE FLS 407, PARA CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO LEGAL IMPOSTA PELO N° 3 DO ARTº 45° DO CPTA, NO TOCANTE ÀS DILIGENCIAS INSTRUTORIAS PRÉVIAS À FIXAÇÃO DA INDEMNIZAÇÃO.

A recorrida concluiu, assim, as suas contra-alegações: A- O recurso excepcional de revista não deve ser admitido, sede de apreciação preliminar sumária, uma vez que no caso concreto não estão preenchidos os pressupostos para a sua admissão previstos nos nºs 1 e 2 do Artº 150°, do CPTA.

B- O Acórdão não viola qualquer norma substantiva ou processual.

C- o caso concreto não consubstancia uma questão fundamental de relevância jurídica ou social e a admissão do recurso não é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

D- O Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul é claro, exaustivo, está devidamente fundamentada e deu adequada interpretação e enquadramento jurídico aos artºs 102° e 45°, do CPTA.

E- A obrigação de indemnizar é indissociável e está intimamente conexa com a procedência dos fundamentos da impugnação.

F- A indemnização não tem um carácter sancionatório e apenas poderá ser determinada se, previamente, for formulado o correspondente pedido devidamente fundamentado e que determine a procedência dos fundamentos da acção interposta e, assim, permita que se opere a modificação objectiva da instância.

G- O acórdão recorrido deve manter-se integralmente.

Nestes termos, e nos mais de direito, deve o presente recurso ser rejeitado em sede de apreciação preliminar sumário ou, se assim se não entender, deve o mesmo ser julgado improcedente e não provado e, consequentemente, confirmar-se o acórdão recorrido.

A Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o seguinte parecer: "Notificado o Ministério Público nos termos e para os efeitos do n° 1 do artº 146° do CPA, no processo indicado em epígrafe, vimos emitir parecer. Conforme refere o acórdão de admissão do presente recurso de revista, verificou-se na pendência do processo uma situação de impossibilidade absoluta, já que após a adjudicação, no âmbito do concurso público em causa, o contrato respectivo foi celebrado e executado, pelo que assistirá à autora o direito a uma indemnização, nos termos do n° 5 do artº 102° do CPTA. E tal como pondera o mesmo aresto, as questões que se suscitam no recurso e que importa resolver são as seguintes: -Não havendo acordo na fixação da indemnização, como se verificou, o Tribunal terá que apreciar a validade dos fundamentos da acção de impugnação ou bastará uma mera decisão formal de extinção da instância por impossibilidade superveniente? -A decisão sobre o mérito do pedido da impugnação terá que ser prévia ao convite feito pelo Tribunal às partes para acordarem e à decisão sobre o pedido de indemnização? -Não é ao Tribunal que cabe fixar oficiosamente a indemnização? -Antes deve o autor deduzir o pedido de indemnização bem como articular factos e indicar razões de direito que a justifiquem? -E terá que provar os prejuízos? -Deve a indemnização revestir a natureza de sanção ou abranger os prejuízos resultantes do acto inválido? Vejamos. Conforme escrevem Freitas do Amaral e Mário Aroso de Almeida, a propósito do artº 45° do CPTA, onde se prevê a modificação do objecto do processo, por razões de impossibilidade ou grave prejuízo para o interesse público, (in Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, 2a ed., p. 99), "a previsão tem em mente, em primeira linha, as situações de antecipação, para o domínio dos processos principais, da já tradicional previsão da verificação de eventuais causas legítimas de inexecução que possam obstar ao cumprimento dos deveres que, em princípio, decorreriam da anulação dos actos administrativos".

Portanto, o legislador, com o estabelecimento desta faculdade, o que pretendeu foi encontrar uma solução, em sede de fase declarativa do processo, para os casos em que logo aí se conclui pela existência de uma situação que obsta à execução de uma eventual decisão de procedência, permitindo que o pedido originário seja substituído pela fixação de uma indemnização. Mas sendo assim, esta modificação da...

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