Acórdão nº 045899 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução29 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A... , melhor identificado nos autos, interpôs recurso contencioso do despacho do Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território (SEALOT), de 21-10-99, que declarou a utilidade pública da expropriação do imóvel denominado "... ", sito em Charneca do Lumiar, município de Lisboa, imputando ao acto vícios de violação de lei (arts. 13º e 14º do PDM de Lisboa, dos princípios constitucionais da igualdade, justiça e proporcionalidade, da segurança jurídica e da protecção da confiança, de incompetência) e de forma (falta de fundamentação, falta de audiência prévia).

Por acórdão da 1ª Secção deste Supremo Tribunal, proferido a fls. 226 a 236, dos autos, foram julgados improcedentes todos os vícios cominados ao acto impugnado e por consequência, negado provimento ao recurso contencioso.

Inconformado com tal decisão, dela veio o recorrente interpor o presente recurso, tendo apresentado alegação (fls. 251 a 300, dos autos, na qual formulou as seguintes conclusões: 1ª O despacho impugnado declarou a utilidade pública da expropriação de "oito parcelas de terreno", não referindo o palacete do séc. XVIII do ora recorrente (v.

DR, 2ª Série, de 1999.11.27, p.p. 17944), pelo que não identifica de forma e clara, precisa, completa e inteligível o respectivo objecto e destinatários, não permitindo a determinação inequívoca do seu objecto, sentido, alcance e efeitos jurídicos, sendo assim nulo (v. arts. 17° do CE 99 e 15° do CE 91; cfr. arts. 123°/1 e 2 e 133°/2/c) do CPA) - cfr.

texto nºs 1 a 4; 2ª A publicação de uma planta que não permite a delimitação legível dos bens a expropriar, nomeadamente dos edifícios existentes no imóvel, equivale à falta de publicação, determinando a invalidade e ineficácia do acto declarativo da utilidade pública da expropriação (v. arts. 17° do CE 99 e 15° do CE 91; cfr. arts. 123°/1 e 2 e 133°/2/c) do CPA) - cfr.

texto nºs 2 a 4; 3ª Os arts. 15° do CE 91 e 17° do CE 99 impõem que o bem expropriado e os titulares dos respectivos direitos, nomeadamente os residentes no imóvel, sejam identificados no acto declarativo da utilidade pública da expropriação, não permitindo que se remeta para informações constantes do procedimento administrativo que, no caso sub judice, também não identificam o prédio expropriado e os titulares dos respectivos direitos - cf.

texto nº 4; 4º O meio processual previsto no art. 31° da LPTA integra uma simples faculdade dos particulares e não qualquer ónus, pelo que o seu eventual não accionamento nunca poderia sanar ilegalidades do acto sub judice, sob pena de violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva e da garantia do acesso aos Tribunais, consagrados nos arts. 200º e 268° da CRP - cfr. texto nºs 5 e 6.; 5ª Do despacho sub judice e do presente processo "não resulta que para a realização do fim em vista com o PER seja imprescindível expropriar a ..." (v. Ac. STA, de 2000.04.05, proferido no processo apenso de suspensão de eficácia do acto recorrido) - cfr. texto nºs 7 a 9; 6ª 0 despacho sub judice ofendeu abertamente o conteúdo essencial dos direitos fundamentais de propriedade privada e de habitação do ora recorrente e demais residentes no imóvel (v. arts. 62° e 65° da CRP), bem como o princípio da justiça (v. art. 266° da CRP), pois determinou o seu sacrifício para habitação de terceiros, sem qualquer fundamentação, como se decidiu no douto Ac. STA de 2000.04.05 (cfr. art. 5° do CPA) - cfr. texto nºs 8 e 9; 7ª O despacho que declarou a utilidade pública da expropriação violou frontalmente o disposto no art. 78°/2/c) da CRP, pois determinou a expropriação e subsequente demolição dos edifícios e coberto arbóreo da ..., que se encontram em excelente estado de conservação e que constituem exemplos significativos do património histórico e cultural do município de Lisboa, conforme se reconheceu no PDM de Lisboa (v. nº 13.17 do ANEXO I ao PDM de Lisboa, DR, I Série B, de 1994.09.29, pág. 5946) - cfr. texto nº 10; 8ª O despacho em análise violou frontalmente os princípios da justiça, proporcionalidade, legalidade e boa fé, constitucionalmente consagrados (v. art. 266° da CRP; cfr. arts. 2°, 3°, 6° e 6° A do CPA), pois a expropriação não era necessária, dado que é possível a efectivação dos fins que alegadamente se pretende prosseguir noutros terrenos da zona, conforme está provado no presente processo (v. nº 16 dos factos provados no douto acórdão recorrido a fls. 231; cfr. arts. 2°, 9°/b), 18° e 266° da CRP; cfr. art. 6° e 6° A do CPA) - cfr. texto nºs 11 e 12; 9ª 0 Plano de Urbanização do Alto do Lumiar tem uma área de intervenção de 3.000.000 m2 (v. www.altadelisboa.com/Pressroom/pressrelease-98-01.html), com vários terrenos livres onde era possível construir habitações sociais, não existindo qualquer justificação para a expropriação e subsequente demolição de um edifício do século XVIII de Interesse histórico e cultural, com cerca de 800 m2, onde reside o ora recorrente e outros agregados familiares - cfr . texto nºs 11 e 12; 10ª Os arts. 1° do CE 91 e do CE 99, interpretados no sentido de ser admitida a expropriação de habitações e de imóveis de interesse histórico e cultural para a construção de edifícios de habitação social, são inconstitucionais por violação dos arts. 2°, 9°/b) e e), 13°,18°,62°, 65°,67°,78° e 266° da CRP - cfr. texto nºs 12 e 13; 11ª 0 acto sub judice violou diversas disposições do regulamento do PDM de Lisboa, pois não se verificam in casu quaisquer circunstâncias que permitam a expropriação e demolição do conjunto edificado que constitui a ... (cfr. art. 266° da CRP e art. 3° do CPA) - cfr. texto nºs 14 e 15; 12ª A ... está integrada no inventário municipal do património constante do PDM de Lisboa, para garantir a salvaguarda daquele imóvel e dos interesses arquitectónicos, históricos e culturais que justificam a sua preservação (v. nºs 1/6 e II A do Preâmbulo do PDM de Lisboa), pelo que o acto sub judice, violou, além do mais, o disposto nos arts. 13°, 14° e 118° do regulamento do PDM de Lisboa (v. nº 13.17 do Anexo I ao PDM de Lisboa, DR, I Série B, de 1994.09.29, págs. 5916 e segs.) - cfr . texto nº 15; 13ª 0 Plano de Urbanização do Alto do Lumiar (PUAL), ratificado pela RCM 126/98, de 27 de Outubro, publicado no Diário da República. I Série B, de 1998.10.27, não prevê a demolição do edifício em causa, impondo mesmo a sua preservação (v. arts. 39° e 47° do respectivo regulamento), pelo que, contrariamente ao decidido no douto acórdão recorrido, no caso sub judice nunca seria aplicável o disposto no art. 14°/2/a) do regulamento do PDM de Lisboa - cfr. texto nº 15; 14ª As normas do Plano de Urbanização do Alto do Lumiar (PUAL) nunca poderiam fundamentar o despacho em análise, pois, além de imporem a preservação do imóvel do ora recorrente, tinham que respeitar as regras de gestão e ocupação do solo constantes do PDM de Lisboa (v. art. 118° do Regulamento do PDM de Lisboa), sob pena de violação do princípio da hierarquia (v. arts. 112° e 204° da CRP; cfr. arts. 101° e 102° do DL 380/99, de 22 de Setembro e art. 4°/3 do ETAF) - cfr. texto nºs 16 a 18; 15ª 0 despacho sub judice, ao determinar a expropriação com carácter urgente da ..., negou e restringiu os direitos e interesses legítimos do ora recorrente e demais residentes no imóvel, pelo que tinha necessariamente de ser fundamentado de facto e de direito, ex vi do art. 268°/3 da CRP, dos arts. 124° e 125° do CPA, do art. 13°/2 do CE 91 e do art. 15°/2 do CE 99 - cfr. texto nº 19; 16ª 0 despacho em análise enferma de manifesta falta de fundamentação de facto e de direito, pois não contém quaisquer razões concretas e específicas de facto e de direito da expropriação dos direitos de propriedade e habitação do ora recorrente e dos demais residentes no imóvel e da demolição de um edifício de interesse histórico e cultural em excelentes condições, para construção de habitações sociais - cfr. texto nº 20; 17ª 0 despacho em causa também não indicou quaisquer fundamentos de facto e de direito da atribuição de carácter urgente à expropriação, conforme se decidiu no douto acórdão proferido, em 2000.04.05, no processo apenso de suspensão de eficácia (v. arts. 13°/1 do CE 91 e 15°/2 do CE 99) - cfr. texto nºs 21 e 22; 18ª A informação para que remete o despacho sub judice também não contém quaisquer fundamentos de facto e de direito da urgência da expropriação, não tendo sequer considerado ou ponderado o facto do imóvel ser habitado pelo recorrente e outros e ter interesse histórico e cultural (v. Doc. 4 em anexo, constante do processo instrutor apenso, que se anexa para facilidade de análise e confronto; cfr. Ac. STA de 2000.04.05 e parecer do Ilustre representante do Ministério Público a fls. 215) - cfr. texto nºs 22 a 26; 19ª O despacho sub judice não foi antecedido de audição do ora recorrente, pelo que foram frontalmente violados os arts. 8°, 55°, 100° e 105° do CPA, bem como o princípio da participação dos particulares na actividade administrativa, constitucionalmente consagrado (v. art. 267°/5 da CRP), pelo que é nulo (v. art. 133°/2/d) do CPA) - cfr. texto nºs 27 a 30; 20ª O aliás douto acórdão recorrido enferma assim de erros de julgamento, tendo violado, além do mais, os arts. , , 13°, 18°,20°, 62°, 65°, 67°, 78°, 266°, 267° e 268° da CRP, 1°, 13°, 15° e 17° do CE 91, 1°, 12°, 13°, 15°, 17° e 19° do CE 99, 13°, 14° e 118° do regulamento do PDM de Lisboa, 39° do regulamento do PUAL, 101° e 102° do DL 380/99, 3°, 123° e segs., 8°, 55°, 100°, 105°, 124° e 133° do CPA.

NESTES TERMOS, Deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o douto acórdão recorrido, com as legais consequências.

SÓ ASSIM SE DECIDINDO SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA.

A entidade recorrida apresentou contra-alegação, a fls. 356 a 578, dos autos, com as seguintes conclusões: I. O acto administrativo, agora posto em crise, observa todos os requisitos de forma e conteúdo...

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