Acórdão nº 016/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução29 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal dos Conflitos: I Relatório A…, B…, …, …, … e C…, com melhor identificação nos autos, interpuseram recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (posteriormente reencaminhado para este Tribunal), do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, que, confirmando a decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras, concluiu pela incompetência desse Tribunal, em razão da matéria, para conhecer da acção declarativa ordinária de condenação proposta contra o ICOR, Instituto para a Construção Rodoviária, pelo facto de ter ocupado - no âmbito do processo de construção de uma variante municipal denominada "Variante de Felgueiras" - parte de um prédio que lhes pertencia, no qual também foram provocados danos.

Os recorrentes terminaram a sua alegação formulando as seguintes conclusões: "1- Vêm os ora Agravantes, interpor recurso do mui douto Acórdão promanado pelo Tribunal a quo.

2- O presente recurso versa, apenas e somente, sobre a apreciação da competência material do Tribunal de 1.ª Instância, apreciada que foi oficiosamente "Excepção de Incompetência Absoluta", 3- Com efeito, o Tribunal a quo entendeu que, no caso sub judice era materialmente incompetente para o conhecimento da causa o Tribunal Judicial de 1.ª Instância, transferindo-se no seu entendimento essa competência para o Tribunal Administrativo, porquanto a presente acção teria como objecto tão somente a responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos resultante da verificação de actos danosos da propriedade de terceiros na prática de um acto de gestão pública por parte da Agravada e como realização de uma função pública de pessoa colectiva.

4- Ora tal decisão, salvo o devido respeito e melhor opinião, é injusta e não conforme ao direito tendo em atenção toda a factualidade existente, porquanto, e sem qualquer espécie de rebuço, é da responsabilidade da Agravada a "ocupação ilegal" de uma certa parte do imóvel que se constitui como propriedade dos Agravantes efectuada fora do âmbito de qualquer processo expropriatório e de uma forma não temporária, não se tendo consubstanciado pela Agravada o pagamento de quaisquer valores aos Agravantes que pudessem configurar uma JUSTA INDEMNIZAÇÃO e CONTEMPORÂNEA como dona da obra o manter, preservar e diligenciar pelo bom estado de todas as construções e edificações circundantes ao empreendimento por si efectuado.

5- Sendo que quanto à situação descrita em supra os Recorrentes em algum momento e por alguma forma prestaram o seu consentimento à Agravada para que esta consumasse a sua conduta ilícita, verificando-se deste modo um esbulho da sua propriedade plena e exclusiva perpetrado pela Recorrida na ocorrência em mérito com graves prejuízos para a esfera jurídico-patrimonial dos Agravantes que ascendem ao montante de 144.978,10 EUR.

6- Além do mais, a habitação implantada na propriedade dos Agravantes sofreu diversos e elevadíssimos danos materiais como consequência necessária e directa das obras levadas a cabo pela Agravada.

7- Todos estes actos praticados pela Agravada foram de molde a originar o desprovimento quanto às pessoas dos Agravantes da parcela de terreno em equação com correspectiva depreciação da parte sobrante do imóvel, derivada da construção por parte da Agravada de um muro de betão com vários metros, o que impossibilita a vista que o imóvel anteriormente possuía, e além disso, retirando-lhe grande parte do aproveitamento da luz Solar, existindo actualmente uma perda brutal da qualidade ambiental e uma desvalorização considerável em termos de utilidade económica, patrimonial e capacidade do prédio com reflexos no seu valor de mercado.

8- Não respeitando assim a Agravada o dever de no exercício da sua função pública não poder ofender do direito de propriedade de terceiros.

9- Não se consumindo na verificação da ilegalidade da conduta o requisito da ilicitude no domínio da responsabilidade de entes públicos, podendo ainda compreender a inobservância de regras técnicas ou cânones de prudência comum.

10- A Agravada apesar de se constituir como uma pessoa colectiva do direito público não significa que não esteja sujeita ao regime do direito privado respondendo civilmente perante ofensas de direitos de terceiros (reivindicação de propriedade e indemnizatórios). designadamente por actos de gestão privada na realização dos fins de interesse público a elas cometidos.

11- Assim de acordo com o disposto no artigo 34º., n.º 1. alínea f) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais estão excluídos da jurisdição administrativa os recursos e acções que tenham por objecto questões de direito privado ainda que qualquer das partes seja pessoa colectiva de direito público sendo por isso da competência dos Tribunais Judiciais a competência residual de tais acções.

12- Do disposto no artigo 212°., n°. 3 da nossa Lei Fundamental porque compete aos Tribunais Administrativos o julgamento de acções que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas resultou esvaziado muito do seu conteúdo o conceito tradicional de acto de gestão pública.

13- Portanto no direito hodierno é muito mais importante conhecer o conceito de relação jurídica administrativa só relevando para a justiça publicista as relações jurídicas administrativas públicas, as reguladas por normas de direito administrativo aquelas em que um dos sujeitos pelo menos actue na veste de ius imperii no sentido de realização do interesse público legalmente definido.

14- Porém nem todos os actos da ora Agravante são de gestão pública, como nem todos os actos que integram a gestão pública haverão de representar todos o exercício imediato do ius imperii ou reflectirão directamente o poder de soberania do próprio Estado e das demais pessoa colectivas.

15- Ora os actos praticados pela Agravante...

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