Acórdão nº 0194/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelFERNANDA XAVIER
Data da Resolução07 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A A..., aberta por óbito de B..., representada pelos seus únicos e universais herdeiros ..., ... e ...

, identificadas nos autos, interpôs recurso, para este Supremo Tribunal Administrativo, de duas decisões proferidas, pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, nos presentes autos de acção de responsabilidade civil extra-contratual, sob a forma de processo ordinário, que a ora recorrente, instaurou contra o MUNICÍPIO DE S. PEDRO DO SUL, pedindo a condenação deste a pagar-lhe as quantias de 7.560.000$00, por danos patrimoniais e de 300.000$00, por danos morais, sofridos com o incêndio alegadamente provocado pelo manuseamento de explosivos, por parte de um funcionário do Réu, que trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização deste e no seu interesse, quando procedia à abertura de um estradão de Olheiros dos Lobos para Malhadinha, em Landeira, freguesia de Santa Cruz da Trapa, concelho de São Pedro do Sul, quantias aquelas acrescidas de juros de mora desde a citação até integral pagamento.

O primeiro recurso, vem interposto do despacho proferido em acta de julgamento a fls.411 e que indeferiu o requerimento apresentado pela Autora, ora recorrente, no sentido de que o Tribunal inquirisse duas novas testemunhas, ao abrigo do artº645º do CPC.

O segundo recurso, vem interposto da sentença proferida a fls. 457 e segs., que julgou improcedente a presente acção e absolveu o Réu do pedido.

Nas alegações do primeiro recurso, a Autora formula as seguintes CONCLUSÕES: 1º. As testemunhas, cuja inquirição foi requerida em audiência de julgamento, tinham conhecimento directo dos factos constantes da B.I., pois serviram de convicção ao Tribunal Judicial da comarca de São Pedro do Sul para dar como provado, no processo crime, os mesmos factos.

  1. O pedido da sua inquirição apenas surgiu por o Tribunal oficiosamente ter decidido inquirir o arguido sobre aqueles factos e este ter contado uma versão diferente daquela que consta do dito acórdão junto aos autos e onde ele também tinha prestado depoimento.

  2. Em abono da descoberta da verdade, em obediência ao princípio da igualdade na obtenção das provas e atentas as disposições invocadas no requerimento da recorrente, devia o tribunal oficiosamente inquirir as testemunhas que serviram de convicção ao Tribunal de São Pedro do Sul para dar como provados os factos constantes da B.I. e que eram essenciais, pois estabeleciam o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

  3. O Tribunal ao não aceitar inquirir aquelas testemunhas oficiosamente e que tinham conhecimento directo dos factos violou o princípio da imparcialidade das decisões judiciais, o princípio da igualdade das partes e a norma do artº645º do CPC.

    *Contra-alegou o Réu concluindo pela improcedência deste recurso.

    *Nas alegações do segundo recurso, a Autora formula as seguintes CONCLUSÕES: 1ª. No julgamento da matéria de facto constantes dos quesitos 3 a 6 e 31 e 34 da B.I., o Tribunal não podia formar a sua convicção no depoimento da testemunha ..., na medida em que não presenciou qualquer daqueles factos e o que referiu foi o que outras pessoas lhe contaram depois de terem sido praticados.

    2ª. E no que se refere aos factos constantes dos quesitos 31 e 34 da B.I. só por perícia podiam ser dados como provados e não por depoimento de testemunhas dado que exigiam especiais conhecimentos técnicos e científicos, que as testemunhas sobre os quais depuseram não tinham.

    3ª. E relativamente ao depoimento das testemunhas ..., ... e ..., aquele o que utilizou os explosivos e estes que chegaram minutos depois da explosão ao local, resulta que o incêndio deflagrou imediatamente a seguir à explosão com início a 7/8 metros do local daquela.

    4ª. E tendo em conta a temperatura e a humidade que se fazia sentir no momento em que se deu a explosão e, ainda tratando-se de época de Verão e ao facto da explosão se dar por efeito de utilização de rastilho, o qual, para dar início ao processo de deflagração, tem de ser ligado com chama, quer por fósforo, quer por isqueiro, processo este a decorrer no interior da floresta, é de presumir, segundo um bom pai de família, que tal acção é idónea a provocar incêndio.

    5ª. A esta conclusão chegou o Tribunal Colectivo que julgou os mesmos factos nos autos de processo comum/colectivo nº46/97 onde deu como provado que foi em consequência directa e imediata da explosão que o incêndio se deu.

    6ª. O acórdão do Tribunal de São Pedro do Sul, que deu como provados os factos constantes dos quesitos 3º a 6º da B.I. não podia ser abalado por depoimento de testemunhas na medida em que, transitado em julgado, faz prova plena dos factos que atesta, dado que não tendo sido o arguido absolvido do crime por não os ter praticado, mas por não ter actuado com negligência, não é aplicável o artº674º-B do CPC.

    7ª. O Tribunal recorrido ao não fazer qualquer referência no julgamento da matéria de facto, àquele acórdão, inquina de nulidade a decisão sobre a matéria de facto e consequente sentença que naquela se fundou, nulidade que se invoca.

    8ª. E viola os artº 341º, 371º e 393º, todos do Código Civil e, ainda, o artº515º e artº654º, nº2 ambos do CPC.

    9ª. Viola, ainda, o artº388º do C.C. ao fundar a sua convicção na resposta aos quesitos 31 e 34 no depoimento de testemunhas, quando tais factos, dado os especiais conhecimentos técnicos e científicos, só por perícia podiam ser dados como provados.

    10ª. Como viola os artº 349º e 351º ambos do CC, pois o Tribunal devia presumir que é utilizado lume, quer através de isqueiro, fósforo ou outro mecanismo mecânico que produza chama, para dar início à deflagração do rastilho ( acender) e a ponta do rastilho onde se acende até à boca do furo tem de mais de cinco metros para que o funcionário tenha tempo de se abrigar.

    11ª. E que, tendo em conta o vento a soprar, era de presumir que possa ter empurrado o dito rastilho a arder para o interior da floresta.

    12ª. E ainda devia o Tribunal presumir que as pedras que resultam da explosão são lançadas em estado de incandescência o que, tendo em conta a temperatura de 26 a 28 graus, ar seco, humidade de 30 a 33 graus e vento a soprar, podia atear fogo.

    15ª. O Tribunal viola, ainda, o artº514º do CPC, pois é facto notório, não necessitando de prova nem de alegação, que o acender do rastilho é com isqueiro ou fósforo, que o rastilho tem de ter uma extensão suficiente, que permita aquele que o acende se possa afastar do perigo da explosão e que as pedras que provêm da explosão são incandescentes.

    16ª. Razão pela qual, dando-se como provados os factos constantes dos quesitos 3 a 6 da B.I. e nos termos das conclusões anteriores, está verificado um dos pressupostos da obrigação de indemnização, isto é, o nexo de causalidade.

    Dos Danos 17ª. No julgamento da matéria de facto dos quesitos 12, 13, e 14 da B.I, o Tribunal não teve em conta o acordo das partes, a resposta dos peritos dada aos quesitos 1º e 2º que lhes apresentou a Autora e ao qual responderam que o valor da madeira foi de 20.993,00€ e o documento de fls.89 e 90 dos autos apresentado pelo Réu donde consta o valor dos pinheiros de 5.000 contos.

    18ª. E o Tribunal ao valorar o documento de fls.89 a 90 dos autos para resposta aos quesitos 15,16 e 17 e não para a resposta aos quesitos 12, 13 e 14 entra em contradição, sem a explicar.

    19ª. Viola, assim, os artº 513º e 515º do CPC.

    20ª. A actividade de utilização de explosivos é uma actividade de risco prevista pelo legislador no artº35º do Regulamento de Explosivos aprovado pelo DL 376/84, de 30.11, razão pela qual, para concluir que a actividade levada a cabo pelo Réu é perigosa, não há lugar há aplicação do artº8º do DL 48051 de 21 de Novembro de 1967.

    21ª. Tendo o incêndio destruído um palheiro no valor de 400 contos, tubos no valor de 3.960$00, tábuas aparelhadas no valor de 4.320$00 e pinhal no valor de 5.000 contos, verificam-se danos susceptíveis de serem reparados.

  4. Na responsabilidade pelo risco não é aplicável o artº9º do DL 48051 no que se refere aos danos especiais e anormais, já que esta norma apenas é aplicável à...

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