Acórdão nº 02043/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Outubro de 2006
Magistrado Responsável | ANGELINA DOMINGUES |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na 1ª Secção, do Supremo Tribunal Administrativo 1.1. A… (id. a fls 2) intentou, no T.A.C. de Lisboa, acção de responsabilidade civil extra-contratual contra o Estado Português e o B… fundada em actuação ilícita e culposa dos respectivos agentes pedindo a condenação destes no pagamento de uma indemnização no valor de 15.269.839$00, por danos materiais e morais.
1.2. A fls. 944 e segs (v. volume) foi proferida sentença absolvendo o Estado e julgando a acção totalment e procedente em relação ao Réu ….
1.3. Inconformado com esta decisão, interpôs o B… recurso jurisdicional para este Supremo Tribunal, cujas alegações, de fls. 1072 e segs, concluiu do seguinte modo: 1ª - À data dos factos a A. era funcionária do B…; 2ª - A A., o B…, o Centro Nacional de Pensões (através da Junta Médica), consideraram os factos alegados pela A. no âmbito de um acidente de serviço; 3ª - A pretensão da A. está tutelada no Estatuto da Aposentação (Dec. Lei 498/72, de 09.12), procedimento a que a A devia recorrer para fazer valer os seus direitos, o que efectivamente a mesma fez; 4ª - Ao recorrer à responsabilização do B… pela via da responsabilidade tutelada no Dec. Lei n.° 48051, de 21.11.67 fez utilização errada da forma do processo, tendo sido feita errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 1° e 2° do D. L. n.° 48 051, de 21/11/1967, no art°. 501° do Cód. Civil, nos art°s. 38°., al. c), 43°, al. b), 54° e 60° do EA (D.L. n.° 498/72, de 9/12) e no art° 7° n.° 3 do Cód. Civil, o que levou à admissão e à utilização de forma do processo errada, o que consubstancia uma excepção dilatória que obsta ao conhecimento do mérito da causa e determina que os R.R. sejam absolvidos da instância (art.°s 288.°, n.° 1, al. e) e 493.°, n.° 2 do C. P. C.), o que o tribunal recorrido deveria ter feito.
5ª - Assim, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva o B… da instância; 6ª - A A alega (e foi aceite) que no inicio de 1996 eclodiu uma situação de poluição ambiental no B…; 7ª - A A alegou que em consequência da verificação dessa situação, começou a revelar sintomas que culminaram num estado generalizado de doença; 8ª - Imputando ao B… (e ao Estado) uma conduta omissiva relativamente à resolução do problema que apareceu naquela altura e ao acompanhamento e à resolução dos problemas revelados pelos funcionários em consequência desse problema e após essa data; 9ª - Não ficou provado na sentença a referida conduta omissiva imputada ao B… (e ao Estado) - nessa medida a Douta sentença recorrida absolveu o Estado do pedido; 10ª - Relativamente ao B…, o tribunal recorrido, fundamentou a sua decisão em factos e questões não alegados pela A, que não constam dos factos considerados relevantes pelo tribunal para a boa decisão da causa e que não constam dos factos provados reproduzidos na sentença; 11ª - O tribunal recorrido extravasou assim os poderes que tinha e a sentença violou as disposições constantes nos art°s 660º, n° 2, 2ª parte, conjugado com o disposto nos art°s 664°, 2ª parte, 264° e 663°, todos do CPC, pelo que a mesma é nula por força do disposto no art° 668°, n.° 1, al. d), devendo ser substituída por outra que absolva o B… do pedido, com os mesmos fundamentos da absolvição do Estado, seguindo-se o que for de lei até final; Sem conceder e sem prescindir; 12ª - Não ficou provado nos autos a conduta omissiva imputada ao B…, geradora da sua responsabilidade em indemnizar a A; 13ª - Não ficou provado nos autos o estado de saúde alegado pela A (absolutamente desprovida de sistema imunológico, sujeita às mais graves e dolorosas infecções e malformações físicas); 14ª - O tribunal deu como provado que a A se encontra hoje com o sistema imunológico diminuído; 15ª - A comprovação deste estado clínico da A teria que ser feita por meios adequados à natureza do mesmo, ou seja, por meio de prova médica retirada de exames clínicos realizados para o efeito, bem como através de prova pericial a efectuar nos autos; 16ª - A A não apresentou nem constam dos autos, meios de prova (clínicos, periciais) idóneos à verificação do seu estado de saúde e especialmente ao estado clínico considerado na sentença (sistema imunológico diminuído), pelo que a Douta sentença recorrida não podia ter dado este facto como provado, devendo ser revogada nesta parte; 17ª - O mesmo se diga acerca dos factos considerados provados na sentença de que a A se encontra "impossibilitada de exercer a sua profissão" (pag. 13 da sentença, artº 64° do Anexo 1 às presentes alegações) e de que "ficou impedida de se expor à luz solar".
18ª - Deve assim ser revogada a sentença nesta parte, e substituída por outra que não considere provados estes factos.
19ª - Acresce que, o facto considerado provado na sentença: "A 05.02.1998 a Dr.ª C…, passou um relatório onde conclui estarem certos sintomas e lesões relacionadas com o efeito sistémico de toxicidade ambiental (documento n.º 65 da petição inicial)" - art° 51º dos factos provados na sentença (anexo I das presentes alegações) e pág. 12 da sentença.
deve ser substituído por outro onde conste que "A 05.02.1998 a Dr.ª C…, passou um relatório onde conclui que certos sintomas e lesões podem eventualmente estar relacionadas com o efeito sistémico de toxicidade ambiental (documento n.° 65 da petição inicial)"; 20ª - Na sentença apenas ficou provado que a A referia uma série de queixas (de sintomas, de sintomatologia), que recorreu a médicos e instituições revelando-lhes as referidas queixas, que a generalidade dos exames que efectuou apresentou como resultado "normal" (v.g. docs 91 a 95 da p.i.); que das consultas e dos exames que a A fez, resultaram as seguintes verificações objectivas: a) insuficiência venosa crónica dos membros inferiores (doc. 54 junto com a p.i.); b) eczema e air borne (doc. 117 da p.i); e) querato conjuntivite seca (ou sicca) - docs 63 a 65 da p.i.; d) anemia; e) perturbações da visão, com sintomatologia de natureza alérgica.
21ª - Acresce ainda que, A não logrou igualmente provar que se encontrava sujeita às mais graves e dolorosas infecções e malformações físicas (cf. resposta ao quesito 81° - não provado, nesta parte).
22ª - Os factos provados não são de molde a sustentar a condenação do B…; 23ª - Não se encontram assim preenchidos os requisitos para a responsabilização do B… por factos ilícitos: a) Não se provou a ilicitude e a culpa dos comportamentos imputados ao B… (antes pelo contrário); b) Não se provou a existência dos danos alegados pela A; c) Não se provou um nexo de causalidade entre a conduta dos RR e os danos alegados pela A 24ª - Sem prescindir e sem conceder, ainda que à revelia do enquadramento factual trazido aos autos pela A e do enquadramento dos mesmos por esta feito, dos factos relevantes para a decisão da causa e do correcto enquadramento dos mesmos, se queira responsabilizar o B… e indemnizar a A, sempre tal responsabilização terá que ser ajustada à enorme discrepância verificada entre o alegado (gravíssimo) estado de saúde da A e a reduzida expressão do efectivo estado de saúde (de doença? Qual? Pela análise dos autos não se consegue saber ...) da mesma, e a indemnização ser reduzida nos mesmos moldes, não devendo a mesma ser fixada em montante superior a 5.000 euros." Juntou 2 documentos e 2 anexos.
1.4. A Autora contra alegou nos termos constantes de fls. 1166 a 1191, inc, concluindo: "a) não estando reunidos os condicionalismos a que aludem os arts. 706° e 524° do Cod Proc. Civil, devem os documentos juntos com a alegação do recorrente ser desentranhados dos autos, revelando a sua junção, neste momento, inadmissível; b) quer por não se revelar preenchido o ónus de impugnação da matéria de facto determinado pelo art. 690°-A do Cod Proc. Civil, quer por não se verificarem os elementos condicionantes da sua revisão à luz do art. 712° do Cod proc. Civil, a matéria de facto apurada deverá ser dada por fixada nos termos apurados pelo tribunal recorrido; c) sobre o alegado erro na forma de processo, trata-se de questão sobre a qual se formou caso julgado em virtude da pronúncia, não impugnada, em sede de despacho saneador, tendo presentes os arts. 671° e 672° do Cod Proc. Civil, tratando-se de questão cujo enquadramento à luz do art. 199° do Cod. Proc. Civil não detém relevo para a apreciação da causa; d) de qualquer forma, o pedido e a causa de pedir formulados nos presentes autos não têm cabimento ou enquadramento legal no processo especifico a que se refere o Estatuto de Aposentação, tal como bem vincou a decisão recorrida; e) não enferma a sentença recorrida de qualquer nulidade, nomeadamente por excesso de pronúncia, atendo-se aos limites fixados na causa de pedir e analisando as questões ali equacionadas, independente de uma questão de argumentação, a qual não releva para os efeitos do disposto no art. 668°, n° 1, al. d) e 660°, n° 2, ambos do Cod Proc. Civil; f) revelam-se cumulativamente verificados os requisitos accionadores da responsabilidade civil extra-contratual do Estado tal como consignados no art. 2° do Decreto-Lei n°48.051 de 21.11.1967, concretamente o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade; g) revelando os autos, clara e frontalmente, a situação lesiva de que foi objecto a recorrida, por facto culposamente imputável à recorrente, a relação entre ambos, e os graves (decisivamente graves) danos por ela sofridos; h) não violando, em consequência, a decisão recorrida qualquer norma legal e efectuando um cabal enquadramento dos factos provados nos comandos legais aplicáveis ao caso." Juntou 1 documento (fls. 1194) 2. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
2.1.Com interesse para a decisão, a sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: "A autora foi funcionária do B…, tendo iniciado as suas funções em 13.9.1991, com a categoria de Técnica de diagnóstico e Terapêutica, ramo de análises clínicas e saúde pública de 2ª...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO