Acórdão nº 01403/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução04 de Julho de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A…, já identificado nos autos, intentou, neste Supremo Tribunal, recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas nº 13.562-B/2002 de 31.5.02, publicado no DR., II Série, suplemento ao nº 135, de 14.6.02, pelo qual foi declarada a utilidade pública urgente da expropriação por utilidade pública das parcelas de terreno nºs 514 e 514 S, com a área de 19.878 m2 que fazem parte do prédio de que é proprietário, denominado Quinta do …, freguesia de … e concelho de Guimarães.

Por acórdão de 28 de Julho de 2004, a Secção concedeu provimento ao recurso, anulando o acto impugnado.

1.1. Inconformada, a interessada particular "B…" interpõe recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões: a) A questão central em discussão nos autos reside num eventual conflito entre a localização do traçado de uma estrada nacional e as disposições regulamentares de um PDM; b) O acórdão recorrido contraria a jurisprudência constante do STA - designadamente, a dos acórdãos de 6.12.2001, Proc nº 44016, de 12.12.2002, Proc. 46.819, e de 29.04.2003, Proc. 47.545 - a qual, quando confrontada com a alegada incompatibilidade de traçados de vias nacionais com disposições de planos directores municipais, não vislumbrou a violação destes; c) Tal como o STA tem vindo a resolver a questão, o potencial conflito entre a localização dos traçados das vias nacionais - quer por via do acto que aprova a localização, quer por via do acto expropriativo - e as disposições de um PDM, resolve-se em primeira instância pelo apelo à supremacia hierárquica, quer das normas legislativas nacionais que aprovam o Plano Nacional Rodoviário, quer das que os determinam as competências dos organismos da Administração Central no que se refere ao planeamento e localização das estradas nacionais; d) Entendimento diferente deste, tal como é implicitamente assumido pelo acórdão recorrido, acarretaria consequências nefastas para a correcta prossecução do interesse público subjacente ao desenvolvimento e à implantação da rede rodoviária nacional, porquanto se a classificação dos espaços e respectivos usos adoptados pelos vários planos directores municipais condicionassem a localização dos traçados das vias nacionais, a Administração Central estaria irremediavelmente manietada quanto à escolha das soluções concretas a perfilhar; e) Não colhe o argumento de que o próprio art. 8º do DL 222/98 impõe a articulação dos traçados com os instrumentos de planeamento e de ordenamento do território, de âmbito regional e municipal, dado que o acórdão recorrido esquece-se que os "traçados" a que esse art. 8º alude são os relativos apenas a circulares e variantes dentro dos centros urbanos e já não aos traçados da rede nacional de estradas; f) Deste modo, no caso concreto, deverá concluir-se que, ainda que o disposto nos nºs 2 e 3 do art. 53º do Regulamento do PDM de Guimarães fosse incompatível com a localização do traçado para o local em causa, sempre essas normas seriam inaplicáveis por prevalência do Plano Nacional Rodoviário e das normas nacionais determinantes das competências dos organismos da Administração Central no que se refere ao planeamento e localização das estradas nacionais, como sucede com a estrada nacional em causa nos presentes autos; g) O acórdão recorrido enferma de outro erro de julgamento ao considerar que aplicação das regras ínsitas nos nºs 2 e 3 do Regulamento do PDM de Guimarães impõe preservação física do prédio em causa; h) Nos termos constitucionais, só o legislador pode circunscrever no ordenamento jurídico as categorias de bens que devam ser objecto de protecção legal específica enquanto parte do património cultural português, até porque, no caso de bens privados, estão em causa restrições ao direito de propriedade, matéria de reserva de lei nos termos da Constituição; i) Sob pena, não só de ilegalidade mas também, principalmente, de inconstitucionalidade formal e orgânica, não pode uma qualquer norma regulamentar "emprestar" o regime legal de protecção de bens culturais a um categoria de bens - bens a proteger - que a própria Lei 13/85 não previu no seu âmbito de aplicação; j) Sendo a norma do nº 2 do art. 52º do Regulamento do PDM de Guimarães ilegal e inconstitucional - por violação dos arts. 18º, nº 2 e 165º, nº 1, alíneas b) e g), da Constituição - deveria o acórdão recorrido ter recusado a sua aplicação e concluído pela inexistência de qualquer norma que impeça a destruição física do imóvel em causa por força de um acto expropriativo; k) Não o tendo feito, incorreu o acórdão recorrido em erro de julgamento ao considerar o acto recorrido violador das prescrições dos arts. 52º e 53º do Regulamento do PDM de Guimarães; l) Aplicando por analogia à interpretação dos regulamentos as regras da interpretação das leis, dir-se-á que, por força da regra do nº 2 do art. 9º do Código Civil, no pode ser considerado pelo intérprete o pensamento normativo que não tenha na letra do regulamento um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso; m) A interpretação que o acórdão recorrido faz da norma do nº 2 do art. 52º do Regulamento do PDM de Guimarães - considerar-se que se deu início ao respectivo procedimento de classificação - extravasa por completo o teor literal da mesma; n) No afã de salvar a norma ao crivo do juízo de ilegalidade e de inconstitucionalidade a que a mesma está irremediavelmente sujeita, o acórdão recorrido acaba por interpretar a norma com um sentido que jamais se vislumbra para quem lê o nº 2 do art. 52º do Regulamento do PDM de Guimarães; o) Em todo o caso, ainda que tal interpretação estivesse correcta, o simples desencadear de um procedimento de classificação era insuficiente para que o imóvel ficasse abrangido pelo regime de protecção dos bens culturais porquanto, de acordo com o art. 18º, nº 1, da Lei, só se consideravam em vias de classificação os bens em relação aos quais houvesse despacho do IPPC a determinar a abertura do respectivo processo de instrução, o que não sucede in casu; p) Deste modo, à luz do disposto na Lei 13/85, o início do procedimento de classificação que se possa hipoteticamente vislumbrar no nº 2 do art. 52º do Regulamento do PDM de Guimarães não tem a virtualidade de qualificar os imóveis abrangidos por essa...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT