Acórdão nº 045884 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução04 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I - Relatório A…, B…, C…, D…, e E…, vieram interpor recurso, por oposição de acórdãos, do acórdão da 2.ª Subsecção, de 2.3.05, que concedeu provimento ao recurso jurisdicional deduzido da sentença do TAC de Lisboa que julgara procedente acção que intentaram contra o Município de Cascais.

Invocaram como fundamento da oposição os acórdãos deste STA, de 26.9.02, proferido no recurso 484/02 - que decidiu sobre a questão do termo inicial do prazo de prescrição do direito de seguradora que pagou ao seu segurado o valor dos danos causados por entidade pública - e de 24.10.02, proferido no recurso1068/02 - que decidiu sobre o reconhecimento do direito pelo devedor e a sua repercussão na interrupção do prazo prescricional - procurando demonstrar a existência de uma contradição com o acórdão recorrido.

Terminaram essa alegação inicial formulando as seguintes conclusões: 1.ª Oposição: a) No Acórdão de fls. 125 e seguintes dos presentes autos, decidiu-se que o prazo de prescrição da seguradora que pagou os danos sofridos pelo seu segurado começou a correr quando este teve conhecimento do seu direito.

  1. No Acórdão em oposição, e com fundamento nas mesmas normas jurídicas, decidiu-se que o prazo de prescrição da seguradora que pagou os danos sofridos pelo seu segurado só começou a correr com o pagamento que aquela fez a este.

  2. Há uma clara oposição de julgados sobre a mesma questão de direito, que não sofreu qualquer alteração entre a prolação de uma e outra das decisões, que impõe e justifica o presente recurso - art. 763° do C.P.C., na redacção aplicável.

    1. Oposição: d) No Acórdão de fls. 125 e seguintes dos presentes autos, decidiu-se ser necessária uma decisão dos órgãos competentes para representar o devedor perante terceiros para haver reconhecimento, expresso ou tácito, de um direito perante o respectivo credor.

  3. No Acórdão em oposição, e com fundamento nas mesmas normas jurídicas, decidiu-se que uma simples promessa, sem qualquer decisão, feita verbalmente por pessoa que não representa o devedor perante terceiros constituía um reconhecimento, ainda que tácito, de um direito perante o respectivo credor.

  4. Há uma clara oposição de julgados sobre a mesma questão de direito, que não sofreu qualquer alteração entre a prolação de uma e outra das decisões, que impõe e justifica o presente recurso - art.º 763 do CPC A recorrida não se pronunciou.

    O Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o seguinte parecer: Parece-nos que ocorre a invocada oposição entre o acórdão recorrido e o aresto de 2002.09.26 (processo n.º 484/02), pelas razões invocadas pelas recorrentes; porém, já se nos afigura que não há oposição entre o acórdão recorrido e o aresto de 2002.10.24 (processo n.º 1068/92), pois não nos parece que se tenham debruçado sobre situações fácticas idênticas.

    Sem prejuízo do disposto no art.º 766, n.º 3, do CPC foi considerada verificada a oposição de julgados: As recorrentes apresentaram as suas alegações finais onde formularam as seguintes conclusões: 1.ª O Prazo de prescrição de um direito em que uma seguradora fique subrogada por virtude do pagamento dos danos que fez ao seu segurado só começa a correr depois de verificada a sub-rogação, nos termos do art.º 306, n.º 1, do C. Civil.

    1. Uma proposta de resolução de um diferendo entre uma entidade pública e um particular, ainda que feita por órgão dessa entidade pública sem poderes de representação desta perante terceiros, constitui um reconhecimento tácito do direito do particular com a virtualidade de interromper o prazo prescricional e, curso, nos termos do art.º 325, n.º 2, do C. Civil.

    O Magistrado do Ministério Público emitiu o seguinte parecer: "Mantendo, embora, a posição assumida no nosso parecer de fls. 171, no tocante à não oposição entre o acórdão recorrido e o aresto de 2002.10.24, no processo n° 1068/02, afigura-se-nos que o presente recurso merece provimento, por adopção da orientação ínsita no acórdão fundamento de 2002.09.26, no processo n° 484/02.

    Como se escreveu neste acórdão fundamento, citando o aresto do STJ de 2000.04.13, no processo n° 200 (in BMJ n.º 496, p. 246): "A regra do n° 2 do art.º 498° do Código Civil, não assume o carácter de excepção à do n° 1; a ideia que ressalta é a de a regra ínsita nos dois números obedecer à mesma razão de ser, mais a mais que se utiliza a palavra igualmente no n° 2; esta razão de ser comum aos dois números é esta: o prazo de prescrição inicia-se quando o titular do direito o puder exercer; quer isto dizer que o disposto nos dois números do art.º 498° não é mais do que a aplicação da regra geral já antes estabelecida no art.º 306°, n° 1, do mesmo Código, onde se determina que o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; não pode ser de outro modo; a regra é tão elementar que se não concebe que alguém venha defender que o prazo de prescrição de um direito possa começar a correr ainda antes de o direito se subjectivar, de o respectivo titular o poder exercer, inclusive com perigo de o direito prescrever antes de poder ser exercido".

    E, conforme se acrescenta, ainda: "A razão da lei cabe, em termos idênticos, quer ao direito de regresso quer à sub-rogação prevista no artº 441° do Código Comercial; no caso do direito de regresso o prazo de prescrição conta-se a partir do cumprimento, uma vez que antes do cumprimento pelo condevedor não há direito de regresso e necessariamente não pode começar a correr o prazo de prescrição; no caso de sub-rogação o prazo de prescrição começa a correr depois de paga a indemnização pela seguradora uma vez que antes daquele pagamento não há possibilidade de exercer o direito contra o causador do acidente; à mesma conclusão se chega por aplicação do artº 306°, n° 1, do Código Civil: o prazo só começa a correr quando a seguradora estiver em condições de poder exercer o seu direito, que é o mesmo dizer, quando estiver pago.

    " E a finalizar: "Quer por aplicação analógica do artº 492°, n° 2, ao abrigo do artº 10° do CC, analogia que a doutrina também admite, quer por força do disposto no artº 306°, n° 1, do mesmo Código, o início do prazo de prescrição do direito atribuído à seguradora deve ser estabelecido nos termos previstos para o direito de regresso entre os responsáveis, apesar de o caso ser de sub-rogação legal e não de direito de regresso." Perfilhando este entendimento, sou de parecer que deverá ser concedido provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos importa decidir.

    II - Factos Matéria de facto dada como assente no acórdão recorrido: - As AA. celebraram com F…, três acordos denominados contratos de seguro, titulados pelas apólices n.ºs 287042, 287044 e 287623 (docs. de fls. 6 a 20), todos do ramo Incêndio e Elementos da Natureza, pelos quais assumiram a transferência para si de diversos riscos que pudessem ocorrer ao edifício e recheio do … (apólice n.º 287042), do … (apólice n.º 287044) e às demais instalações da sociedade (apólice n.º 287623) -(A); -Tais acordos foram celebrados pelas ora AA. em regime de co-seguro, assumindo a 1.ª A. uma percentagem de 40% das responsabilidades, a 2.ª A. uma percentagem de 30% das responsabilidades e cada uma das 3.ª, 4.ª e 5.ª AA. uma quota-parte de 10% das responsabilidades (quadro de fls. 10) -(B); -Entre os riscos transferidos encontra-se o de danos por águas, nos termos expressamente previstos nas respectivas apólices (C); -Nos diversos acordos estão previstas franquias para este risco de 10% dos prejuízos indemnizáveis, no mínimo de Esc. 100.000$00 (D); -No dia 30. 12. 1994, o colector de águas residuais do sistema de esgotos, pertença do R., e instalado no cruzamento entre a Rua … e a Rua …, em Alcoitão, entupiu (E); -Por documento escrito com cópia a fls. 29, subscrito por um seu representante e datado de 18.5.1995, F…, declarou ter recebido da A… , como indemnização pelo sinistro ocorrido em 30.12.1994, por danos por água, a quantia de Esc. 3.598.292$00, deduzida a franquia, sub-rogando-a em todos os seus direitos, constando do mesmo documento a seguinte distribuição de co-seguro: A… 40% 1.439.317$00; B… 30% 1.079.488$00; C… 10% 359.829$00; D… 10% 359.829$00; E… 10% 359.829$00 -(F); -Por documento escrito com cópia a fls. 30, subscrito por um seu representante e datado de 16.5.1995, F… declarou ter recebido da A..., como indemnização pelo sinistro ocorrido em 30.12.1994, por danos por água, a quantia de Esc. 752.037$00, deduzida a Franquia, e sub-rogando-a em todos os seus direitos, constando do mesmo documento a seguinte distribuição de co-seguro: A… 40% 300.814$00; B… 30% 225.611 $00; C… 10% 75.024$00; D… 10% 75.024$00; E… 10% 75.024$00 -(G); -Por documento escrito com cópia a fls. 31, subscrito por um seu representante e datado de 16.5.1995, F… declarou ter recebido da A…, como indemnização pelo sinistro ocorrido em 30.12.1994, por danos por água, a quantia de Esc. 943.903$00, deduzida a Franquia, e sub-rogando-a em todos os seus direitos, constando do mesmo documento a seguinte distribuição de co-seguro: A… 40% 377. 562$00; B… 30% 283. 171 $00; C… 10% 94.390$00; D… 10% 94.390$00; E… 10% 94.390$00- (H); -Pelo Gabinete Jurídico de SMAS - Cascais foi em 16.1.1997 enviado ao ilustre mandatário das AA. um fax com cópia a fls. 32, com o seguinte texto: Assunto: Entupimento da rede de esgotos de Alcoitão em 94/12/30 e dias seguintes Ex.mo Colega Conforme v/ solicitação, pelo presente e com vista a resolver definitivamente a questão em epígrafe e no âmbito da qual foi submetida por parte de V. Exas. a estes SMAS uma proposta de indemnização no montante de Esc. 5.294.232$00. venho pôr à consideração de Ex.mo Colega aceitação de uma proposta de indemnização no montante de Esc. 4.000.000$00, a qual seria submetida ao Conselho de Administração destes SMAS para decisão final (I); -O Facto referido na alínea E) originou um refluxo das águas residuais para o interior das...

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