Acórdão nº 01754/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Abril de 2006
Data | 04 Abril 2006 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na 1. Secção do Supremo Tribunal Administrativo: O Ministro de Estado, dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas recorre do Acórdão do Tribunal Central Administrativo que concedeu provimento ao recurso contencioso interposto por A… que anulou o seu despacho, de 25-5-2001, que aplicou ao recorrido a pena disciplinar de multa, no valor total de cinquenta mil escudos.
Nas suas alegações formulou as seguintes conclusões: 1. Ao contrário do entendido no douto acórdão sob recurso, os actos dados como provados constituem violação dos deveres gerais de zelo e correcção previstos nas alíneas b) e f) do n.º 4 e nºs 6 e 10 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar.
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Ao entender o contrário de quanto antecede, o douto acórdão recorrido violou, por erro de interpretação e aplicação do disposto nos referidos nºs 6 e 10 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de Janeiro, pelo que se espera que esse Supremo Tribunal conceda provimento ao presente recurso.
Contra-alegou o recorrido, concluindo do seguinte modo: a. Por referência à "conversa informal" mantida com o jornalista de "…" e à notícia publicada por este jornal, nenhuma responsabilidade disciplinar é possível assacar ao Recorrido, nem nenhuma lhe foi assacada pela Senhora Instrutora ou pela Autoridade Recorrente.
Todavia, b. Foi em razão daqueles dois factos que o Senhor Cônsul-Geral de Portugal em Salvador-Bahia chamou, ao seu gabinete, o Recorrido.
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Não para lhe solicitar explicações sobre o sucedido, mas para o repreender verbalmente, em tom enérgico e exaltado e sem lhe permitir qualquer tipo de reacção ou defesa, por via do corte imediato da palavra.
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Legitimamente indignado com tal tratamento, o Vice-Cônsul, igualmente em tom de voz alto e irritado, protestou que o Chefe do Posto não o deixava falar e, depois de exclamar que "já não vivemos em ditadura", abandonou o gabinete do seu superior hierárquico e, dirigindo-se aos seus colegas que se encontravam na sala de atendimento ao público, disse-lhes que "enquanto o Senhor Cônsul-Geral estivesse em serviço, não lhe passassem mais quaisquer tipos de pedidos de informações, de jornalistas ou outras pessoas".
Ora, e. Nada havia a repreender ao Recorrido que, não tendo protagonizado qualquer conduta infractória, nada havia feito de disciplinarmente censurável.
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Muito menos por via de uma de uma repreensão verbal, sem qualquer suporte legal (ED, 110, 1) e, ainda para mais, proferida em voz alta, enérgica e exaltada, sem curar de saber o realmente sucedido e sem permitir, sequer, qualquer tipo de explicação sobre o assunto.
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O dever de correcção é recíproco e, por isso, funciona nos dois sentidos da cadeia hierárquica.
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A exigência de respeito ínsita naquele dever não significa, de modo algum, subserviência, cega e incondicionada, perante os superiores hierárquicos.
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Nem supressão do direito de defesa.
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Nem, muito menos, do direito de falar.
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Não passa, em suma, por ter de acatar, em humilhante silêncio, reprimendas verbais abusivas, prepotentes e autoritárias, quando nenhum ilícito disciplinar foi cometido.
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É que o Recorrido é, antes do mais, uma pessoa, com a dignidade que lhe é inerente, valor estruturante do Estado de Direito Democrático que a República Portuguesa proclama ser (CRP, l e 2°).
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Em face do exposto e atentas as circunstâncias concretas que determinaram a conduta do Vice-Cônsul, não resultaram violados os deveres gerais de zelo e de correcção (ED, 3°, 6 e 10).
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Seja por referência ao Chefe do Posto, seja por referência aos utentes alegadamente presentes na sala de atendimento ao público do CGPSB, de resto não identificados e, em todo o caso, sem qualquer evidência probatória de que presenciaram e se aperceberam do incidente ocorrido e de que este causou qualquer dano à imagem do Posto Consular.
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Bem andou, pois, o TCA, ao anular o acto punitivo aplicado ao Recorrido, com fundamento em vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
O Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto neste STA emitiu o parecer de fls. 165 a 167, que aqui se dá por inteiramente reproduzido, em que conclui no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
O Acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos: A - Por despacho de S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, de 05 de Fevereiro de 2001, na sequência de participação formulada pelo Sr. Cônsul-Geral de Portugal em Salvador-Bahia, foi instaurado processo disciplinar ao ora recorrente, com a categoria de Vice-Cônsul a exercer funções no Consulado-geral de Portugal em Salvador-Bahia (CGPSB), no Brasil (fls.27).
B - Nomeado Instrutor, foi autuado o processo disciplinar, e concluída a fase instrutória, foi deduzida a seguinte: NOTA DE CULPA Por despacho de Sua Excelência o Ministro dos Negócios Estrangeiros, de cinco de Fevereiro de dois mil, e nos termos dos nºs 1 e 3 do artigo 50.º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de Janeiro (doravante designado apenas por E.D.), foi instaurado processo disciplinar contra A…, Vice-Cônsul do Consulado-Geral de Portugal em Salvador.
Nestes termos, e de harmonia com o disposto nos artigos 57°, n.º 2 e 59.º, n.º 4 do E.D., deduzem-se contra o referido arguido os seguintes ARTIGOS DE ACUSAÇÃO 1 - O arguido pertence ao quadro de pessoal do Consulado-Geral de Portugal em Salvador, desde 01 de Junho de 1977 (cfr. fls. 28).
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