Acórdão nº 0509/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Março de 2006

Magistrado ResponsávelJ SIMÕES DE OLIVEIRA
Data da Resolução14 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, 2ª Subsecção:- I - A..., notificada do acórdão de fls. 259, pelo qual foi negado provimento ao recurso contencioso que interpôs, veio arguir-lhe nulidades por falta de fundamentação e omissão de pronúncia.

Alega, em primeiro lugar, que existe falta de fundamentação, pois o tribunal proferiu decisão "sem invocar qualquer argumentação de facto ou de direito que a sustente", e isto porque, ao conhecer da matéria vertida nas conclusões 1ª e 2ª da sua alegação, se limitou a afirmar que os factos a que a primeira se refere, e que a recorrente pretendia aditar à relação dos factos provados, "não resultam provados, nem alguns deles interessam à decisão do recurso jurisdicional" e, relativamente à segunda, que "também se não consideram provados, sendo por tal inidóneos para levar à almejada alteração da matéria de facto assente".

O acórdão enfermaria além disso de omissão de pronúncia, porquanto não conheceu das questões que tinha de apreciar, e que se continham nas conclusões 13ª e 14ª (vícios de violação de lei e preterição de formalidades essenciais), 15ª (violação de lei por erro nos pressupostos de direito), 16ª, 17ª e 18ª (vício de forma por falta de fundamentação) e 19ª e 20ª (violação de lei por erro nos pressupostos de facto).

Notificada, a entidade recorrida nada veio dizer.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência da arguição da nulidade por falta de fundamentação, bem como da nulidade por omissão de pronúncia relativa às matérias das conclusões 15ª a 20ª das alegações da recorrente, mas da procedência de igual arguição com respeito às conclusões 13ª e 14ª.

Vejamos: Constitui orientação jurisprudencial perfeitamente estabilizada a de que só a absoluta falta de fundamentação é susceptível de integrar a nulidade prevista na al. b) do art. 668º do C.P.C.. Uma fundamentação tida por incompleta, deficiente ou inadequada para sustentar a pronúncia emitida não implica para a sentença o vício da nulidade. A título de exemplo, podem citar-se os Acs. de 28.11.2000, proc.º n.° 46.396, 27.6.2001, proc.º n.° 37.410, 2.7.2002, proc.º n.° 46.439, e 11.5.05, proc.º nº 1618/03.

Ora, o acórdão em apreço contém o discurso justificativo da decisão que profere, no sentido de negar provimento ao recurso, mediante a adequada fundamentação, na interpretação da lei e dos princípios jurídicos aplicáveis. Aqui mais desenvolvida, ali de forma mais sucinta, reviu-se a sentença recorrida e foram-se apreciando os vícios que renovadamente se imputaram ao acto impugnado.

Improcede, deste modo, a arguição de nulidade por falta de fundamentação.

Falece igualmente razão à reclamante no que toca à nulidade por omissão de pronúncia (matérias correspondentes às conclusões 15ª a 20ª das suas alegações).

Quanto ao cumprimento, pelo acto administrativo impugnado, do dever de fundamentação - conclusões 16ª, 17ª e 18ª - o acórdão emitiu uma pronúncia cabal, considerando tal motivação suficiente, embora inadequada do ponto de vista de jure (cf. fls. 275 e 276).

Por outro lado, a fls. 272 a 276 o acórdão enfrenta a questão da norma habilitante para a prática do acto, e do correlativo erro nos pressupostos que lhe vinha assacado pela recorrente (ditas conclusões 15ª, 19ª e 20ª), chegando à conclusão de que a Administração, embora tendo invocado preceito inaplicável, via a sua decisão legitimada por outra norma, pelo que, estando-se no domínio de poderes vinculados, havia que desconsiderar esse erro e validar o acto, por efectivamente possuir suporte legal objectivo.

Carece, assim, de consistência a alegação de que o acórdão deixou de se pronunciar sobre tais questões.

Haverá, porém, que concordar com a recorrente e o Ministério Público quando denunciam a falta de expressa pronúncia sobre as questões versadas nas conclusões 13ª e 14ª, em que se escrevia: "13ª. Sob pena de criação de um vazio legal no que toca à execução de ordens de embargo, de demolição ou de reposição do terreno quando provenientes de outras entidades administrativas com competência para tal que não as câmaras municipais, deve entender-se que a revogação operada pelo cit. art. 129º apenas foi parcial, mantendo-se o Dec.-Lei nº 92/95 em vigor no tocante à execução das aludidas ordens que não se encontrem abrangidas nas previsões dos arts. 102º e segs. do Dec-Lei nº 555/99.

  1. Deste modo, deve entender-se que, em consonância com o estabelecido no art. 157º, nº 1, do CPA, as ordens de demolição de obras emanadas ao abrigo do preceituado na Lei nº 107/2001 estão sujeitas aos formalismos previstos no Dec-Lei nº 92/95, de 9 de Maio, pelo que a sua omissão, como sucedeu no caso sub judice, constitui violação de lei e preterição de formalidades essenciais que determina a anulabilidade do acto recdo".

    Realmente, o acórdão cometeu o lapso de não ter feito nenhuma abordagem, ainda que sucinta, da questão (do vício) tratada nessa sede das alegações da recorrente, pelo que enferma da apontada nulidade - que importa agora suprir.

    Nestes termos, acordam em julgar parcialmente procedente a arguição de nulidades, declarando nulo o acórdão, nos apontados termos.

    Sem custas.

    Suprindo a declarada nulidade, reforma-se o texto do acórdão, nele se incluindo a pronúncia específica que se deixou omitida: A...

    recorre da sentença do T.A.F. de Lisboa que negou provimento ao recurso contencioso do despacho do VICE-PRESIDENTE DO IPPAR (INSTITUTO PORTUGUÊS DO PATRIMÓNIO ARQUITECTÓNICO), de 26.8.02, que ordenou a demolição do gradeamento e respectivos pilaretes executados nos limites da propriedade denominada ....

    Nas suas alegações a recorrente formulou as seguintes conclusões: "1ª. Para além dos factos dados como provados na sentença recda., resultam ainda dos autos encontrarem-se provados documentalmente ou por admissão por acordo factos narrados na Parte II antecedente, que aqui se dão por reproduzidos, e que, por isso, deviam ter sido tomados em conta na decisão recda. e devem agora ser tomados em consideração por esse Venerando Tribunal, porque relevantes para a boa decisão da causa.

  2. Os nºs 1 e 3 dos Factos Provados da sentença recda. devem ser rectificados, conforme propugnado no nº 2.2 antecedente, que aqui se dá por reproduzido.

  3. O acto recorrido objecto dos presentes autos é o despacho do Senhor Vice-Presidente do IPPAR de 26 de Agosto de 2002, constante do ofício nº 9694 da mesma data, e reproduzido no nº 4 dos Factos Provados (cfr. fls. 8 e 9), tendo sido esse acto, e apenas esse, a ser notificado à ora recte. mediante o referido ofício.

  4. Como a ora recte. alegou no seu reqto. de 25 de Novembro de 2002, e deve ser dado como provado, a recte. só teve conhecimento do doc. junto a fls. 60 e 61, e, designadamente, da existência do despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Cultura de 26 de Agosto de 2002 a autorizar a demolição da vedação em causa, com a notificação da resposta da entidade recda. ao presente recurso.

  5. Deste modo, é manifesto que, não tendo nunca o doc. de fls. 60 e 61 sido notificado oficialmente à ora recte., não produz o mesmo quaisquer efeitos perante a recte., tal como se dispõe no art. 132º do CPA, nem tão pouco aquele doc. integra o acto recorrido, sequer como sua fundamentação (cfr. art. 125º, nº 1, do CPA, a contrario).

  6. Acresce que a ora recte. nunca foi notificada de qualquer ratificação, reforma ou revogação do despacho recdo., nem sequer no decurso do presente recurso, designadamente nos termos e dentro do prazo previstos no art. 47º da LPTA.

  7. A sentença recda., ao julgar inexistir o invocado vício de incompetência do acto recdo. por entender que o mesmo «está perfeitamente legitimado, quer pelo antecedente Despacho do Presidente do IPPAR, quer pelo Despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Cultura», viola o preceituado nos supra-citados arts. 125º, nº 1 e 132º do CPA, na medida em que, erroneamente, considera os actos que integram o doc. de fls. 60 e 61 oponíveis à ora recte. ou integrados no acto recdo..

  8. Não sendo os actos que integram o doc. de fls. 60 e 61 oponíveis à ora recte., e não lhes sendo feita qualquer referência no acto recdo., torna-se manifesto que, em face do preceituado na al. d) do art. 11º do Dec.-Lei nº 120/97, de 16 de Maio, a ordem de demolição sub judice provem de órgão incompetente, pelo que o acto recdo. deve ser anulado.

  9. O acto recdo., da autoria exclusiva do Senhor Vice-Presidente do IPPAR, encontra-se também ferido do vício de incompetência uma vez que, nos termos do disposto nos nºs 2 e 3 do art. 10º do Dec-Lei nº 120/97, de 16 de Maio, «as competências da direcção (do IPPAR) são exercidas pelo presidente», só podendo ser exercidas pelos vice-presidentes em caso de falta ou impedimento do presidente ou em caso de delegação de poderes deste último nalgum daqueles, sendo certo que nenhuma destas circunstâncias se verificava no caso, já que, no dia da prática do acto o Presidente do IPPAR se encontrava no exercício das suas funções (cfr. fls. 60 e 61) e o próprio autor do acto afirma ter agido «dentro das competências que me estão conferidas enquanto representante da direcção do IPPAR».

  10. Se se entender que o acto recdo. não...

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