Acórdão nº 039/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Janeiro de 2006

Data25 Janeiro 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A…, identificado nos autos, intentou no T.A.C. de Lisboa a presente acção declarativa para efectivação de responsabilidade civil extracontratual emergente da prática de acto administrativo ilegal, contra a Câmara Municipal de Lisboa, pedindo a sua condenação no pagamento de quantia de 96.802$00, e juros vencidos e vincendos até ao efectivo pagamento pelos alegados danos sofridos.

Por sentença de 15.07.03 (fls.208 a 219) foi a acção julgada improcedente, por não provada, e absolvida a Ré, Câmara Municipal de Lisboa, do pedido.

Não se conformando com tal decisão, veio o A. A… interpor recurso jurisdicional.

Na sua alegação formulou as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso da decisão que julgou improcedente a acção proposta pelo Recorrente contra a Câmara Municipal de Lisboa decidindo sobre a matéria de facto dada como provada e que aqui se dá por reproduzida; 2. Com efeito, o Tribunal "a quo", tendo considerado que se verificava o comportamento omissivo voluntário, a ilicitude e a imputação do facto ao lesante, Câmara Municipal de Lisboa, entendeu que não se verificava o nexo de causalidade e que, ainda que este se verificasse, inexistia prova suficiente para quantificar o dano.

É nossa convicção, todavia, que o Tribunal decidiu mal, tendo feito incorrecta interpretação da lei e aplicado mal o direito aos factos dados como assentes.

Senão vejamos: 3. DA FALTA DE NEXO DE CAUSALIDADE 3.1 A sentença recorrida reconhece que se encontram verificados todos os elementos constitutivos da relação causa/efeito; entende, todavia, que se verifica, por culpa do lesado, um facto extintivo dessa relação, qual seja, a possibilidade que o lesado teve de socorrer-se do disposto no n° 2 do art. 90 do RAU, ou seja, a possibilidade de, livremente, arrendar o prédio logo após ter requerido a emissão da licença de utilização.

3.2 A construção jurídica subjacente a este entendimento é a de que o recorrente, a ter sofrido dano, somente o terá sofrido porque voluntariamente o quis e aceitou, dado que poderia ter obstado ao mesmo, substituindo a licença por documento comprovativo de a mesma ter sido requerida.

3.3. Não é, todavia, a nosso ver, aceitável a interpretação que na sentença recorrida se faz do disposto no art. 9°, n° 2 do RAU para, POR EXCEPÇÃO, extinguir o nexo de causalidade, isto por razões de vária ordem que, sucintamente, se enunciam:

  1. O legislador, com esta disposição legal, veio estabelecer para o proprietário a faculdade de, verificados determinados requisitos que, como a seguir se verá, se não verificam, recorrer a um mecanismo substantivo da licença que colmate a falta desta por inépcia dos serviços competentes para a atribuir; trata-se de uma faculdade e não de um poder/dever que impenda sobre o senhorio.

    Aliás, tratando-se de contrato sinalagmático, necessário se tomava que, além de um senhorio temerário que quisesse celebrar contrato de arrendamento antes de emitida a licença de utilização para o prédio, havia, também, potenciais inquilinos que quisessem assumir o risco de contratos nessas condições. E Porque se trataria de excepção que extinguiria o nexo de causalidade, competia à Câmara, a quem isso aproveitaria, a invocação e prova desse facto, o que não sucedeu.

  2. Mas, ainda que se entendesse que a norma em análise (n.° 2 do art. 9.° do RAU) consagra um poder/dever não pode nela fundamentar-se a eliminação do nexo de causalidade, porquanto a mesma não tem aplicação a prédios novos, nunca antes licenciados, mas apenas a prédios antes licenciados, mas cuja licença foi passada mediante vistoria efectuada há mais de 8 anos.

    Tal interpretação resulta não só da própria letra do preceito, como de exigências da sua conformidade com o texto constitucional.

    Com efeito, dispõe o n° 2 do art. 9.° que a licença pode ser substituída por documento comprovativo de a mesma ter sido requerida, em conformidade com o direito a utilização do prédio nos termos legais ora, parece-nos evidente que só relativamente a um prédio já antes licenciado existe o direito à respectiva utilização em termos legais, porquanto o direito à utilização do prédio só se constitui com a emissão da licença de utilização.

    Ademais, só esta interpretação se coaduna com os princípios constitucionais relativos ao controlo efectivo do parque imobiliário por parte do Estado e das autarquias locais, designadamente com o disposto no art. 65° da CRP na redacção em vigor ao tempo dos factos.

  3. Mas, ainda que se entendesse que quanto se disse em a) e b) anteriores não seria suficiente para afastar a interpretação que o tribunal a "quo" fez do disposto no n.° 2 do art. 9º do RAU, ainda assim assistiria razão ao recorrente, pois que a referida disposição legal só pode ser aplicada "quando as partes aleguem urgência".

    Ora, a recorrente nunca teve urgência, nem esse facto foi invocado pela recorrida a quem aproveitaria, pois cabia-lhe alegar e provar que a recorrente reunia as condições para poder lançar mão do disposto na referida disposição legal e uma das condições era a urgência em celebrar contratos de arrendamento.

    Ademais...

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