Acórdão nº 07/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Dezembro de 2005

Magistrado ResponsávelPIRES ESTEVES
Data da Resolução14 de Dezembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A…, Procurador da República, residente na Rua …, n° …, …., …, Lisboa, interpôs recurso contencioso de anulação do acórdão do Conselho Superior do Ministério Público (doravante: CSMP) de 30/10/2002, que decidiu: 1) em determinar, de novo, submeter o Procurador da República Lic. A…, a junta médica da ADSE, nos termos do disposto no art° 100/99, de 31 de Março; 2) em manter a suspensão do exercício de funções, de harmonia com o decidido no acórdão de 4/10/2001; 3) em considerar que o magistrado, não tendo comparecido ao exame determinado pela junta médica que deveria realizar-se em 8/4/2002, passou a ser sancionável com o regime de faltas injustificadas; 4) em considerar que a carta que dirigiu, em 27/7/2002, ao Procurador-Geral Adjunto Coordenador da Secção Tributária do Tribunal Central Administrativo em que pretende justificar a falta ao exame determinado pela junta médica da ADSE, porque não cumpriu o prazo estabelecido no art° 41° n° 3 do DL. n° 100/99, não pode ser admitida como justificativa da falta; 5) em determinar a instauração de inquérito destinado a averiguar a responsabilidade disciplinar do Licenciado A… nas faltas, designadamente ao exame médico, e no retomar de funções no 5° Juízo do Tribunal tributário de 1ª Instância de Lisboa, por tal acto estar inquinado com vários vícios.

Nas suas alegações o recorrente formula as seguintes conclusões: "a) A decisão recorrida padece de vício de violação de lei, por erro de direito do acto recorrido na parte em que recusa a aplicação ao caso sub judice dos arts. 146° e ss. do Estatuto do Ministério Público e determina a aplicação do regime geral da função pública; b) Com efeito, os arts. 146°, 147° e 148 do Estatuto do Ministério Público estipulam um regime especial de aposentação por incapacidade dos Magistrados, o qual se justifica pelo cariz do cargo em causa, nos termos do qual: (i) a aposentação é desencadeada por iniciativa do serviço, (ii) o Magistrado é notificado para se pronunciar em 30 dias (iii) é possível determinar a suspensão preventiva do Magistrado e (iv) é aplicado aos Magistrados que se reformem a jubilação. Nenhuma previsão refere que, no caso de o Magistrado se pronunciar contrariamente à aposentação, se deixará de aplicar este regime, pelo que haverá lugar à aplicação deste regime especial, pelo que haverá lugar à aplicação deste regime especial quer exista ou não aceitação; c) No caso concreto, o recorrente foi notificado nos termos do art° 146° do Estatuto do Ministério Público para se pronunciar, no prazo de 30 dias, quanto à sua aposentação, tendo num primeiro momento manifestado a sua oposição, para em momento posterior e após reavaliar a situação, ter manifestado a sua concordância; d) O recorrente apenas não aceitou de imediato a aposentação porquanto não se podia conformar com o procedimento e entendimento adoptado pela autoridade recorrida quanto às denúncias de factos criminosos contra si praticados e que não foram objecto de investigação pelas autoridades competentes. Sendo certo que, para qualquer pessoa colocada na situação do recorrente, não seria fácil aceitar que os factos descritos nas referidas denúncias tivessem sido «criados pela mente» do recorrente e resultassem como pretende a autoridade recorrida da diminuição das suas faculdades mentais e psíquicas; e) O prazo de 30 dias, constante do n° 2 do art° 146° do Estatuto do Ministério Público, não é um prazo preclusivo, destinando-se apenas, a delimitar as fases do processo de aposentação; f) Nessa medida, o Magistrado, nos termos deste regime especial, poderá ou aceitar a aposentação, caso em que o processo é simplificado, ou não aceitar, caso em que se recorrerá ao regime geral da função pública, apenas, para efeito de produção de prova da incapacidade, à semelhança do que sucede num processo de aposentação compulsiva por infracção disciplinar; g) Nenhuma outra conclusão parece admissível, porquanto, a aplicar o regime geral como pretende a autoridade recorrida o resultado seria diverso, na medida em que este exige não só a debilidade e entorpecimento das faculdades físicas ou mentais (regime especial) mas também com incapacidade absoluta; h) Em suma, ao criar este regime especial constante do Estatuto do Ministério Público, o legislador pretendeu instituir um verdadeiro regime especial de aposentação mais célere e eficaz ajustado ao desempenho de funções específicas que se pretende prestigiar e o qual apenas fica dependente do regime geral, numa situação de não concordância do Magistrado, e ainda aí, apenas no que diz respeito à prova da incapacidade; i) Sucede que o acórdão objecto do presente recurso, subverte tanto o propósito como a aplicação ao caso concreto deste regime especial de aposentação, ao defender que, uma vez que, não existindo aceitação da aposentação por parte do recorrente, se deverá aplicar o regime geral da função pública (note-se, contudo que já tinha ocorrido aceitação por parte do recorrente, contudo, o CSMP considerou que a mesma se encontrava fora de prazo e, portanto, determinou, a irreversabilidade do recurso ao art° 146° do Estatuto do Ministério Público); j) Tal interpretação resulta claramente inconstitucional, na medida em que, tendo como critério a aceitação ou a não aceitação da proposta de apresentação submete os Magistrados a regime diverso condicionando a sua liberdade de audição e pronúncia. Esta é uma interpretação contrária ao princípio constitucional da igualdade, previsto no art° 13º da C.R.P., que determina a nulidade da decisão recorrida; k) Com efeito, impunha-se ao CSMP a admissão do requerimento de aposentação do ora recorrente, ainda que, após o prazo de 30 dias definida no n° 2 do art° 146° do Estatuto do Ministério Público, atendendo ao facto de o prazo não ser preclusivo bem como à ratio do regime especial em presença; 1) Estamos, ainda, perante um vício de violação de lei por erro de direito na determinação da submissão do recorrente a Junta Médica da ADSE e na parte em que considera a não comparência à consulta de psiquiatria no Hospital ... sujeita ao regime das faltas injustificadas; m) Com efeito, o CSMP perfilhando um critério incompreensível e, no âmbito de dois processos distintos e paralelos, notificou o recorrente para comparecer, em duas Juntas Médicas distintas: (i) uma Junta da ADSE e, (ii) uma Junta Médica da CGA; n) Já era estranho que, perante a concordância do recorrente com a aposentação, tivesse sido determinada a sua comparência numa Junta Médica da CGA, uma vez que tal submissão colidia directamente com o regime especial aplicável, mas mais estranho e incompreensível era a sua submissão a uma Junta Médica da ADSE, quando, se por mera hipótese académica, alguma prova tivesse que ser considerada esta seria da competência da CGA, junto da qual já se havia apresentado; o) Apesar de o recorrente não estar legalmente vinculado à comparência nas duas Juntas Médicas, optou por estar presente, apenas, não comparecendo à consulta de psiquiatria marcada no âmbito da Junta Média da ADSE, embora justificando tal situação; p) O CSMP considerou existir falta injustificada e aplicou o regime previsto no art° 390 do DL. n° 100/99, o qual nem sequer prevê sanção para a falta de submissão a exames médicos, quando linhas abaixo da sua decisão considera que se deverá manter a suspensão do recorrente, nos termos do regime especial do Estatuto do Ministério Público; q) Acresce, ainda, que a incongruência da aplicação do regime de faltas previsto no art° 39° do DL. n° 100/99, torna-se ainda mais forte, quando consideramos que a Junta Médica na qual foi agendada a consulta a que o recorrente pretensamente faltou injustificadamente, foi marcada após e na sequência da apresentação pelo recorrente ao CSMP do requerimento de aposentação. Ora, se esta foi decorrência de um requerimento seu, a única consequência da não comparência seria, quando muito, o arquivamento do processo. Mais uma vez estamos perante entendimentos incompatíveis; r) Finalmente, o acórdão recorrido padece, ainda, do vício de forma por falta de fundamentação e de preterição ilegal do direito de audiência prévia do recorrente; s) Com efeito, a decisão recorrida revela fundamentação obscura e contraditória, numa clara violação ao disposto nos arts. 124° e 125° do Código de Procedimento Administrativo, porquanto não permite ao recorrente aperceber-se do itinerário cognitivo e valorativo que determinou a adopção das medidas recorridas, o que viola claramente o art° 268° n° 3 da C.R.P..

t) Acresce que, tratando-se de uma decisão administrativa, proferida no âmbito de um procedimento administrativo o legislador impôs, nos termos e para os efeitos do disposto no art° 100° do CPA, a prévia audiência do interessante (sic) - no caso, o ora recorrente, a medida em que afecta ou restringe direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos do recorrente, não podendo ser proferida decisão sem que esta tenha tido oportunidade de expor a sua posição; u) Em face do exposto, parece claro estarmos perante um conjunto de situações que se enquadram claramente em situações de violação de lei e vício de forma, pelo que, não poderá deixar de ser declarada a procedência do recurso contencioso de anulação".

Não apresentou alegações a entidade recorrida.

Emitiu douto parecer o Ex.mo Magistrado do Ministério Público, com o seguinte teor: "Afigura-se-me que o acto recorrido não enferma de qualquer vício, mostrando-se bem fundamentado e com adequado enquadramento jurídico, pelo que, assim, o recurso não merece provimento".

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Resultam dos autos os seguintes factos: 1-A… é Procurador da República, fazendo parte do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT