Acórdão nº 042203 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Dezembro de 2005

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução06 de Dezembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A..., identificada nos autos, recorreu para o Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo da decisão proferida na 3ª Subsecção que negou provimento ao recurso por si interposto da deliberação do PLENÁRIO DO CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, que em processo disciplinar lhe aplicou a pena de "12 meses de inactividade", formulando as seguintes conclusões: 1. A aqui recorrente interpôs recurso directo de anulação do Acórdão de 20 de Fevereiro de 1997, proferido pelo Plenário do Ex.mo Conselho Superior do Ministério Público, no âmbito do processo disciplinar e que lhe aplicou a sanção de 12 meses de inactividade; 2. Entendeu o Tribunal "a quo" negar provimento ao referido recurso; 3. Não se conforma, contudo, a recorrente com tal Acórdão, razão pela qual vem interposto o presente recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Administrativo; 4. E, desde logo, tem de se considerar que a pena aplicada à aqui recorrente por acórdão proferido em 20 de Fevereiro de 1997, pelo Plenário do Conselho Superior do Ministério Público se acha prescrita; 5. O que terá de se concluir à face do que sucede em processo criminal, quer, ainda, pela própria natureza e finalidade do instituto da prescrição; 6. Efectivamente, atendendo a que desde a data em foi aplicada a sanção disciplinar à recorrente até à presente data decorreram mais de sete anos e, por outro lado, decorreram cerca de 16 anos sobre a (eventual) verificação dos factos, a aplicação da pena se mostra manifestamente injusta e desconforme com os princípios previstos no art. 266º, n.º 2 da CRP; 7. E não se diga que a prescrição da pena disciplinar não pode ocorrer só porque se impugnou contenciosamente a decisão que puniu a recorrente; 8. Na verdade se se entendesse que o citado art. 190º do Estatuto do Ministério Público veda a verificação da prescrição do procedimento disciplinar, sempre se cairia na inconstitucionalidade material de tal norma por afrontamento com o art. 20º, n.º 4 da CRP e com o art. 6º da CEDH, uma vez que o processo nem será justo, nem equitativo nem as soluções a alcançar seriam obtidas em tempo útil; 9. Pelo que deverá ser declarada prescrita a pena disciplinar aplicada à recorrente, com todas as legais consequências; 10. Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que contrariamente ao entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, a deliberação proferida pelo Conselho Superior do Ministério Público se mostra ilegal; 11. Efectivamente, considerou o Acórdão aqui recorrido ser irrelevante a invocação das conclusões alcançadas no processo criminal instaurado contra a aqui recorrente com fundamento nos mesmíssimos factos que levaram à instauração do presente processo disciplinar; 12. Sucede que, as conclusões tiradas no processo disciplinar sobre a análise dos mesmos factos vão, inexplicavelmente, num sentido diametralmente oposto, o que, seja sob um ponto de vista naturalístico, seja sob uma perspectiva processual é impossível verificar-se; 13. E não se pode, como faz o Acórdão recorrido, fundamental tal insanável contradição na autonomia de que gozam os respectivos compôs de aplicação processual - o criminal e o disciplinar - porque, factos são factos e se não se prova a sua ocorrência num processo não se pode, no outro dizer o inverso; 14. Aliás, no sentido aqui defendido entendeu o Acórdão do STA de 18/2/99, processo 037476, publicado em http://www.dgsi.pt; 15. pelo que, e no caso concreto, as conclusões alcançadas pela decisão proferida no inquérito criminal instaurado contra a aqui recorrente (e que veio a ser arquivado) teriam necessariamente que vincular a decisão disciplinar no que respeita à existência material dos factos; 16. O que não ocorreu, como se disse.

17. Por outro lado, no processo disciplinar não relevou a prova produzida pela recorrente, tendo, inclusive, sido violados o princípio do contraditório e o princípio da igualdade de armas, na instrução do referido processo; 18. Acresce que, do exame e dos seus fundamentos facilmente se conclui pela desadequação entre os fundamentos e a decisão bem como a sua injustiça; 19. E o Acórdão impugnado não deu qualquer relevo ao tempo decorrido sobre a (eventual) verificação dos factos, ou seja, 9 anos, e por outro lado não valorizou o facto de nesse lapso de tempo ter a recorrente uma actividade irrepreensível, aspecto, aliás, evidenciado nos fundamentos do voto de vencido; 20. E não relevou, igualmente, o facto de ter sido notada e classificada pelos seus superiores em moldes altamente elogiosos e laudatórios, tanto nas notações anteriores quer nas posteriores aos acontecimentos; 21. Do exposto é manifesta e ostensiva a ilegalidade do Acórdão proferido pelo Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, por se achar eivado dos vícios de erro sobre os pressupostos de facto e direito, e por outro lado ter violado os princípios da justiça e proporcionalidade e imparcialidade previstos no art. 266º, n.º 2 da CRP; 22. E ao concluir pela não verificação dos referidos vícios, mostra-se igualmente o Acórdão ora recorrido ilegal; 23. Devendo, pois, ser revogado o Acórdão recorrido e consequentemente ser anulada a deliberação proferida pelo Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, por ilegal, com todas as legais consequências.

A autoridade recorrida não contra alegou.

O Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos é o processo submetido ao pleno da Secção para julgamento.

  1. Fundamentação 2.1. Matéria de facto O Acórdão recorrido deu como assente a seguinte matéria de facto:

  1. Por Acórdão de 15.11.95, da Secção Disciplinar do Conselho Superior do Ministério Público foi a recorrente punida disciplinarmente com pena de inactividade por 14 meses.

b) Ao abrigo do disposto no art. 26º, nº 5 da Lei nº 47/86, de 15 de Outubro, do Acórdão referenciado em a) reclamou a ora recorrente para o Plenário do Conselho Superior do Ministério Público que, por Acórdão de 20 de Fevereiro de 1997, atendendo em parte a reclamação apresentada, aplicou à ora recorrente pena disciplinar graduada em "12 meses de inactividade" - doc. de fls. 44 a 72 (cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido).

c) Dão-se por reproduzidos os depoimentos constantes do processo administrativo.

2.2. Matéria de direito As questões levantadas pela recorrente são as seguintes: (i) prescrição da pena ou do procedimento disciplinar - conclusões 1ª a 9ª; (ii) erro de julgamento por ter considerado irrelevante a invocação no processo disciplinar das conclusões alcançadas no processo criminal instaurado contra a recorrente pelos mesmos factos - conclusões 10ª a 16ª; erro de julgamento por não ter tomado em consideração a prova produzida pela recorrente, assim violando o principio da igualdade de armas e do contraditório - conclusão 17ª; (iv) erro de julgamento emergente da desadequação e injustiça da sanção aplicada, mantida pelo Acórdão - conclusões 18ª a 20ª.

Vejamos cada uma delas, pela ordem da respectiva colocação.

i) Prescrição da pena (ou do procedimento) disciplinar Defende a recorrente a prescrição do procedimento disciplinar, ou da pena que lhe foi aplicada, em 20 de Fevereiro de 1997. Argumenta, em síntese: "… atendendo a que desde a data em que foi aplicada a sanção disciplinar à recorrente até à presente data decorreram mais de sete anos e, por outro lado, decorreram cerca de 16 anos sobre a (eventual) verificação dos factos, a aplicação da pena se mostra manifestamente injusta e desconforme os princípios previstos no art. 266º, n.º 2 da C.R.P". Nem se diga, continua a recorrente, que o art. 190º do Estatuto do Ministério Público veda a verificação da prescrição do procedimento disciplinar, uma vez que se assim for tal artigo é inconstitucional, por afrontamento do art. 20º, 4 da CRP e do art. 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, uma vez que o processo nem "será justo, nem equitativo nem as soluções seriam obtidas em tempo útil".

Apesar de se tratar de questão nova, o certo é que a sua procedência implicando o desaparecimento da pena aplicada da ordem jurídica, tem reflexos na subsistência da utilidade da lide, pelo que se impõe o seu conhecimento. ( Trata-se de uma questão incidental e portanto a competência do Pleno decorre do disposto no art. 96º, 1 do C.P.Civil, mas com um âmbito limitado à eventual superveniência da prescrição no decurso do recurso contencioso.

) Conhecimento, todavia, que não se estende à eventual prescrição do procedimento disciplinar enquanto vício do acto impugnado. Na verdade, caso a prescrição tivesse ocorrido no decurso do procedimento disciplinar repercutir-se-ia sobre a validade do acto punitivo, e, sendo geradora de mera anulabilidade, incumbia ao recorrente a sua alegação tempestiva (cfr. art. 57º do Estatuto Disciplinar e Acórdão do STA de 18-12-2003) - o que não foi feito. Conhecimento, portanto, limitado à relevância do decurso do tempo na pendência do recurso contencioso, para efeitos de prescrição.

A recorrente invoca a prescrição da "pena aplicada" nas conclusões 4ª a 7ª. Na conclusão 8ª, refere-se também à prescrição do "procedimento disciplinar", ao arguir a inconstitucionalidade do art. 190º do Estatuto do Ministério Público, pelo que abordaremos as duas hipóteses: prescrição da pena e do procedimento disciplinar.

A questão é formulada nos termos seguintes: tendo os factos ocorrido há cerca de 16 anos, entende a recorrente que terá ocorrido a prescrição (da pena ou do procedimento disciplinar) uma vez que, nestas condições a "aplicação da pena se mostra manifestamente injusta e desconforme os princípios previstos no art. 266º, 2 da C.R.P." Não explicita melhor os termos da questão, designadamente em que momento iniciou o prazo da prescrição, que prazo entende aplicável e ao abrigo de que disposição legal e concretamente em que data ocorreu a prescrição, em que...

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