Acórdão nº 0785/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelEDMUNDO MOSCOSO
Data da Resolução08 de Novembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: 1 - A..., cabo da GNR, melhor id. a fls. 2, interpôs no TCA recurso contencioso de anulação do despacho do SECRETÁRIO DE ESTADO ADJUNTO DO MINISTRO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, de 15.03.2002 que, negando provimento ao recurso hierárquico necessário por si interposto, manteve o despacho do Comandante General da GNR, de 13.12.2001 que disciplinarmente o punira com pena disciplinar de suspensão, graduada em 90 dias.

Além de argumentar que o acto está ferido de "nulidade insanável" (cfr. artº 9 a 38 da petição de recurso), o recorrente invoca ainda a inconstitucionalidade do artº 31º nº 3 da Lei 29/82, de 11/12 (LDNFA) acabando por referir que, ao aplicar-lhe a "pena de suspensão, por um período de 90 dias, o acto recorrido violou o disposto nos artº 188º nº 3 e 190º da CRP, 7º, 9º nº 2/a), 81º nº 1/a) e b) e nº 2; e 98º nº 1/b) do RDGNR; artº 18º, 29º nº 1 e 3, 37º, 46º e 270º da CRP; artº 15º do EMFAR e artº 31º nº 3 da LDNFA" (cfr. artº 74 da petição de recurso e conclusões formuladas em sede de alegação).

2 - Por decisão do TCA (fls. 97/113), foi concedido provimento ao recurso contencioso e em conformidade anulado o acto impugnado pelo que e inconformado com tal decisão dela veio o Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna interpor recurso jurisdicional que dirigiu a este STA tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes CONCLUSÕES: I - O douto acórdão aceitou que a abstenção "de proceder às autuações que eram devidas" era susceptível de configurar uma situação de responsabilidade disciplinar (cf. fls. 15; vide igualmente fls. 13); II - Mas, do mesmo passo, considerou que o mesmo se não passava relativamente a quem proferiu declarações que manifestavam expresso acordo com a conduta de quem o fazia e indesmentível estímulo a que essa conduta se mantivesse ou ampliasse; III - Ao decidir desse modo, violou o artigo 4º do RD/GNR e as normas do RD/GNR, constantes da acusação, que configuram uma tal atitude como violação de deveres funcionais; IV - O douto acórdão violou igualmente o princípio da separação dos poderes e as normas dos artigos 2º, 3º, 60º e 61º do RD/GNR, ao substituir-se à entidade com competência disciplinar na tutela do prestígio e do bom nome da Corporação, que o mesmo é dizer na avaliação sobre o grau de lesão ao prestígio e à imagem da Corporação decorrente da conduta do visado; V - O controle judicial sobre tal avaliação há-de conter-se nos limites do contencioso administrativo - tal como era definido no artigo 6º do ETAF - e respeitar os parâmetros fixados pelo RD/GNR, aprovado pela Lei nº 145/99, de 1 de Setembro; VI - O douto acórdão violou a lei ao recusar à autoridade administrativa competência para repor e manter a disciplina na Corporação e, bem assim, para alertar os seus elementos sobre a natureza dos poderes-deveres que, em nome da GNR, são chamados a exercer nas suas funções. Em face do exposto, e com o douto suprimento de V. Excias. deve o douto acórdão de 11 de Março de 2004 ser revogado.

3 - Em contra-alegações (fls. 137/139) cujo conteúdo se reproduz) o recorrido sustentando a manutenção do acórdão recorrido, refere no essencial que "ao comentar, na sua qualidade de dirigente da APG, a pedido de um jornalista a questão da "greve às multas" e de que existe "uma insegurança rodoviária", fê-lo por lhe ser "permitido exprimir opiniões em matérias expressamente incluídas nas finalidades estatutárias da Associação", nos termos do nº 2/g da Lei Orgânica nº 3/2001, de 29 de Agosto, e que as frases proferidas, inserindo-se nos direitos previstos naquela alínea não são, injuriosas ou lesivas para a imagem da GNR.

4 - O Mº Pº junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 142/143 cujo conteúdo se dá por inteiramente reproduzido, no sentido de que o recurso jurisdicional não merece provimento.

+ Cumpre decidir: + 5 - MATÉRIA DE FACTO: Resulta dos autos e fundamentalmente do proc. instrutor o seguinte: A - Em processo disciplinar que lhe foi instaurado "com base nas declarações por si proferidas perante as Câmaras da SIC e que foram transmitidas no jornal das 20H00 do dia 22 de Março de 2001 daquela estação televisiva" contra o arguido A..., cabo da Brigada de Trânsito/GNR, do Destacamento de Trânsito de Beja da Brigada de Trânsito/GNR, foi deduzida a seguinte ACUSAÇÃO: 1º - No dia 22.03.01, no telejornal da estação televisiva (SIC), das 20H00, o arguido, a propósito da notícia que acabara de ser divulgada, sobre a alegada "greve às multas por tempo indeterminado", prestou as seguintes declarações: a) - "... nós temos de dizer ao governo, ao Sr. Ministro da Administração Interna de uma vez por todas, que... tem... que nos dar condições de trabalho"; b) - "... essas condições de trabalho são essencialmente um seguro e um subsídio de risco, porque nós... isto é os mortos e ainda há mais aqueles que ficam feridos... porque isso é... todos os meses ficam feridos elementos da Brigada de Trânsito em acidentes de viação"; c) - "... porquanto não há um seguro para as viaturas... nós temos que pagar o arranjo das viaturas... isto é inacreditável»; d) - "... isto não foi a Associação dos Profissionais da Guarda... que decretou isto foi pura e simplesmente de norte a sul do País os profissionais se uniram e desde hoje que não fazem uma única multa; portanto essas multas não se estão a fazer"; e) - " ... existe uma insegurança na segurança rodoviária e portanto nós estamos de acordo, a Associação dos Profissionais da Guarda está inteiramente de acordo com o que os profissionais da Brigada de Trânsito estão a fazer, isto é, não estão a fazer multas de norte a sul do País"; f) - "... isto vai durar até que os profissionais ... as informações que temos de norte a sul do País... vai durar até o Sr. Ministro... nós estamos fartos de ser recebidos pelo Sr. Ministro, pelo Comando Geral, mas vimos sempre de lá sem nada"; g) - " ... portanto nós queremos dados concretos, queremos ... o horário continua igual há um ano que"; h) - "... andamos nisto - não é - todo este conjunto de coisas ... leva à desmotivação dos agentes"; i) - " ... nós somos mortos e de facto as flores que nos põem nos caixões ... nós devolvemos essas flores à procedência".

  1. - Ao proferir, no dia 22.03.01, publicamente, uma afirmação que bem sabia ser falsa relativa à alegada «...união dos profissionais...», no que respeita à abstenção das autuações, manifestou, com esta sua atitude, um propósito de incitar os camaradas àquela iniciativa, o que traduz um inequívoco apelo à greve, pese embora o facto de tais objectivos não terem sido alcançados, porque...

  2. - Ao ter afirmado, num órgão de Comunicação Social, que os militares da GNR têm de «...pagar o arranjo de viaturas... isto é inacreditável», bem sabia que não falava verdade, já que pelo menos há alguns anos a esta parte nenhum militar pagou qualquer arranjo conforme resulta da análise dos mapas de despesas com indemnizações neste âmbito...

  3. - Ao ter afirmado publicamente, que o «horário continua igual... leva à desmotivação dos agentes», também faltou à verdade, já que o número de horas de serviço sofreu, como é do seu conhecimento, significativa redução nos últimos tempos, em cumprimento das Directivas nº 15/00 e 16/00, de 1/06, da 3ª Rep. do CG/GNR, que impõem, respectivamente, um horário de patrulhamento de 6 horas seguidas e um serviço de atendimento, de 8 horas consecutivas, isto é, as patrulhas reduziram de 8 horas para 6 horas e o serviço de atendimento, de 24 horas para 8 horas.

    5 - Com a conduta supra referida, o arguido não só faltou, reiteradamente à verdade, como violou os princípios fundamentais e dever de obediência, consagrados nos artº 6º nº 3 e 7º do EMGNR aprovado pelo DL nº 265/93, de 31/07, por remissão do artº 8º nº 3 do RD/GNR, aprovado pelo DL nº 145/99, de 1/9), já que incitou, através de televisão, meio privilegiado de Comunicação Social, os seus camaradas a absterem-se de cumprir as suas obrigações de missão.

    Violou ainda, cumulativamente, o dever de proficiência (artº 11º nº 2/a) do RD/GNR) por ter incutido, na comunidade, com as suas declarações públicas, a desconfiança na acção desenvolvida pela Instituição de que faz parte ao afirmar que existe uma insegurança na segurança rodoviária e também o dever de correcção - artº 14º nº 2/a), b) e c), por ter adoptado conduta lesiva do prestígio da Instituição que serve ao ter feito declarações públicas que bem sabia serem falsas, sobre assuntos da Guarda e respeitantes a matéria de serviço, através da estação televisiva SIC.

    Os deveres violados constituem infracções disciplinares por força do prescrito no artº 4º nº 1, mas a censurar com uma única pena disciplinar, nos termos da norma constante do artº 42º nº 2, todos do RD/GNR.

    A confirmarem-se os factos imputados ao arguido, que configuram infracção dsciplinar grave, pode ser aplicada, nos termos do artº 20º do...

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