Acórdão nº 0803/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelROSENDO JOSÉ
Data da Resolução03 de Novembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do STA: I - Relatório.

  1. A...

    propôs no TAC de Lisboa acção de condenação contra o ESTADO PORTUGUÊS Para obter indemnização por danos sofridos como agente diplomático com a categoria de embaixador pela forma como decorreu a sua carreira.

    No sanador foi decidida a competência dos Tribunais administrativos para conhecer da matéria, mas o representante do R. Estado recorreu, estando pendente nos autos tal recurso.

    A final a acção foi julgada improcedente e o A. inconformado interpôs recurso da decisão final de improcedência.

    Há que começar por decidir o recurso sobre a competência, como questão prioritária e, se for o caso, conhecer em seguida do recurso da sentença.

  2. Comecemos por referir as conclusões do recurso de M.º P., que são do seguinte teor: 1°.- Face ao estatuído no art. 4° n°1 al.a) da ETAF ficam fora do domínio próprio da Justiça Administrativa as questões relativas à validade de actos praticados no exercício da função política bem como a responsabilidade pelos danos decorrentes desse exercício.

    1. - A causa de pedir na presente acção é o acto omissivo de nomeação do A. , para exercício de funções de Embaixador junto de países estrangeiros.

    2. - O acto de nomeação de Embaixador, é efectuado através de decreto e apresentação de credencial.

    3. - Tal acto de nomeação é da competência do Presidente da República por proposta e iniciativa do Governo.

    4. - O Embaixador é um representante do Estado português, e quem representa o estado nas relações externas é o Presidente da República; 6°- Pelo exposto, dúvidas não podem restar que a nomeação de um Embaixador, para representação nacional no estrangeiro é um acto político.

    5. - Os actos políticos estão fora da actividade administrativa do Estado, razão pela qual não se norteiam pelos princípios gerais que regulam a actividade administrativa do Estado.

    6. - Não cabe aos tribunais administrativos aferir da sua legalidade e como tal apreciar a responsabilidade civil decorrente dos mesmos, mas aos Tribunais com competência cível.

    7. - Verificados estão os pressupostos da excepção da competência em razão da matéria deste Tribunal para o conhecimento da referida acção.

    8. Ao decidir em sentido contrário, o Mm° Juiz violou as disposições conjugadas dos arts. 4° n°1 al.a) da ETAF, e arts 123° e 135° al.a), ambos da Constituição da República Portuguesa, e arts. 493° n°1 e 2 e 494° al.a) do Cod. Proc. Civil.

    Tudo exposto, deverá a presente sentença ser substituída por outra onde se declare a incompetência material deste Tribunal e se absolva o Réu da instância.

    Neste recurso houve contra-alegação em que o A. sustenta o decidido por o âmbito factual que serve de causa de pedir na acção não se limitar à omissão da sua nomeação integrando muitos outros factos que se reconduzem a actos de gestão pública.

  3. No recurso principal a alegação do recorrente apresenta as seguintes conclusões: 1 - A douta sentença recorrida deu como provados os factos que resumidamente se deixam referidos supra nas diversas alíneas do artigo 2 destas alegações, cujo conteúdo se tem aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais e para o qual, com a benevolência dos Srs. Julgadores, se remete.

    2 - Os factos referidos nas alíneas c), d), e), f), g), h) i)e j) do artigo 2 destas alegações ofendem e violam os princípios de imparcialidade e da legalidade, assim como as determinações constantes do artigo 266 da C.R.P. (ao tempo, artigo 267 da mesma Lei Fundamental), nos precisos termos desenvolvidos nos artigos 11 e 12 destas alegações.

    (cf. artigos 11 e 12 destas alegações).

    Na verdade, 3- Já foi decidido judicialmente que o facto do A. ter sido exonerado do cargo de Embaixador, em 24.9.1976, na cidade do Maputo não implicava a sua exoneração do cargo de Embaixador do quadro diplomático do M.N.E. para que havia sido nomeado em termos definitivos.

    Daí que 4- Não possa deixar de considerar-se também ilícito o comportamento da Administração Pública que considerou o A. como desligado do quadro para que havia sido nomeado.

    (cf.artigos 11, 12 e 13 destas alegações).

    Da mesma forma, 5- Ilegal e ilícito foi ainda julgada a exoneração do A., em 1/7/79, do cargo de Embaixador de nomeação definitiva do quadro diplomático, com efeitos retroactivos a 24/9/76, sem a instauração de qualquer processo disciplinar e sem qualquer espécie de defesa.

    (cf. artigos 13 e 14 destas alegações).

    Além do mais, 6- Ilegal e ilícito deve ser considerada a actuação da Administração Pública ao deixar de liquidar, durante mais de cinco anos, os vencimentos mensais a que o A. tinha direito.

    (cf. artigo 15 destas alegações).

    7 -Tendo estado subjacente a todo este comportamento e actividade da Administração Pública motivações e interesses de carácter corporativista, com a finalidade de afastar o A. do quadro diplomático para que havia sido nomeado, postergando-se a prossecução do interesse público, violaram-se o artigo 266 n°. 1 da Constituição e artigo 4 do Dec-Lei 184/89, a tornar antijurídico e, por isso, ilícito tal comportamento.

    (cf. artigos 16, 17, 18, 19 e 20 destas alegações).

    8- Assim o não tendo entendido, a douta sentença recorrida ofendeu, ela própria, o artigo 6 do Dec-Lei 48.051.

    (cf. artigos 18, 19 e 20 destas alegações).

    9- Os factos constantes das alíneas i) j) l) e m) do artigo 2 destas alegações, levados a efeito pela Administração Pública, ofendem e violam os artigos 58 e 59 da Constituição da República, uma vez que durante perto de 26 anos esteve adstrito a Departamentos do M.N.E. sem qualquer definição funcional, na "prateleira", totalmente sujeito a omissão de oportunidades de colocação, sem ocupação efectiva, onde era tratado de forma desconsiderante, chegando a ser-lhe atribuído, como local de trabalho, um espaço destinado a arrumos de material de limpeza.

    (cf. artigos 22, 23, 24 e 25 destas alegações) 10- As referidas normas constitucionais violadas têm carácter perceptivo e aplicam-se directa e imediatamente aos seus destinatários.

    (cf. artigos 26, 27 e 28 destas alegações).

    11 - Assim o não tendo entendido, a douta sentença violou as mencionadas normas constitucionais, por erro de interpretação e aplicação, traduzindo-se o resultado desse processo de interpretação do Tribunal numa verdadeira inconstitucionalidade.

    (cf. artigo 28 e 29 destas alegações).

    12 - Durante esses 26 anos que o A. permaneceu no M.N.E., com o cargo de Embaixador do seu quadro diplomático, nunca foi incluído nas múltiplas movimentações do quadro diplomático e por isso, durante todo aquele tempo, nunca foi colocado nos serviços externos, em cargo ou lugar próprio dos que podem ser exercidos por funcionários da sua categoria, com ofensa do espírito e letra dos diplomas orgânicos do M.N.E., dos Estatutos da Carreira Diplomática de que se ressaltam os artigos 48,43 n°. 2, 45 n°. 1, 54 e 53, todos do Dec-Lei 40-A/98.

    (cf. artigos 30,31 e 32 destas alegações).

    13- Para a persistente e contínua exclusão de colocação do A. nos Serviços Externos nunca foi apresentado qualquer justificação ou fundamentação, nem sobre o A. foram produzidos juízos valorativos negativos a respeito da sua capacidade, do seu mérito, da sua aptidão ou do perfil profissional, juízos esses que aconselhassem a exclusão a que o sujeitaram.

    Tudo com ofensa do artigo 1 do Dec-Lei 256-A/77, de 17 de Junho e do artigo 268 da Constituição.

    (cf. artigos 33,34,35,38 e 37 destas alegações).

    14 - Com o argumento do exercício dum amplo poder discricionário atribuído aos órgãos decidentes do M.N.E., entendeu a douta sentença sob recurso que a exclusão do A. das movimentações diplomáticas, nestas circunstâncias de facto, era perfeitamente lícita e legal.

    (cf. artigo 33,34,35 e 36 destas alegações).

    15 - Tal entendimento e consequente decisão judicial ofende, por erro de interpretação e aplicação, todas as normas legais que se deixam invocadas supra nas conclusões 12 e 13.

    (cf. artigo 37).

    De tudo resulta que 16- Todos os actos e factos provados neste processo e levados a efeito pela Administração Pública em relação ao A., violam as normas legais deixadas expressas e os direitos do A. ao exercício do cargo para que havia sido nomeado e os correspondentes interesses pessoais daí resultantes.

    17- Tudo a impor a conclusão da existência de uma actividade administrativa contínua ofensiva de preceitos constitucionais e infra-constitucionais geradores de ilicitude relevante para fins indemnizatórios.

    18 - Assim o não entendendo, a douta sentença ofendeu, ainda por erro de interpretação e aplicação, o artigo 6 do Dec-Lei 48.051.

    Contra alegou e concluiu o R. nos seguintes termos: A - O objecto do presente recurso encontra-se delimitado pela questão de saber se, face à matéria de facto provada, existe facto ilícito de órgão ou agente do R. Estado.

    B - O pedido formulado na petição inicial define o objecto da acção.

    C - Atento o pedido formulado, na situação dos autos, o requisito ilicitude tem os seguintes contornos: comportamento voluntário de órgão ou agente do R., Estado, que, nos termos da causa de pedir, reveste a forma de omissão, existindo a obrigação de praticar os actos omitidos, por tal o impor norma que proteja o direito ou interesse que o ora recorrente pretende fazer valer.

    D - A falta ou culpa do serviço não integra a causa de pedir. Matéria que não foi alegada como fundamento do pedido.

    E - O A. não logrou provar que algum órgão ou agente do R., Estado, tenha omitido a prática de acto, legalmente devido.

    E - Dos factos elencados sob as als. c), d), e), f), g), i), do art. 2°, da douta petição de recurso, bem como dos factos relativos ao afastamento do A., do quadro do Ministério dos Negócios Estrangeiros, não decorre a pretensão (pedido) que o mesmo deduz em juízo. Tais factos não integram a causa de pedir. Logo, relativamente a tais factos, atento o pedido formulado, não existe, quanto a eles, nesta sede, necessidade de avaliar a sua eventual ilicitude.

    F - O A. já não pode fazer valer...

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